Porque os segundos são melhores?
O design nas séries de videojogos.
"Assassin's Creed II" (2009), "Uncharted 2" (2009), "Mass Effect 2" (2010), "Borderlands 2" (2012) ou "Metro: Last Light" (2013) são apenas alguns dos múltiplos exemplos de jogos que surpreenderam pela positiva, indo além dos seus antecessores, tanto em termos qualitativos (avaliação da crítica) como quantitativos (números de vendas). Ou seja, no mundo dos videojogos, e ao contrário do cinema, a norma é os segundos jogos das séries serem melhores que os primeiros. Isto quer dizer, e ao contrário de muito discurso sobre os aspectos negativos das séries, que a insistência dos estúdios na criação de séries faz sentido. Mas porque é que no cinema, os segundos e terceiros filmes sabem a mais do mesmo, a repetição, e nos videojogos estes conseguem ir além, sendo até melhores?
A principal resposta para isto encontra-se no processo criativo, que está na base dos videojogos, e a que damos o nome de Design. Os videojogos são criados segundo princípios artísticos, seguindo processos expressivos, tal como o cinema, mas para além desses, recorrem também ao processo de design. Ora o processo criativo baseado no design segue uma lógica de desenvolvimento iterativa, em que o desenvolvimento obedece a um processo em que se criam versões do jogo, que são por sua vez testadas, servindo os resultados dos testes na criação de novas versões do jogo, que por sua vez são novamente testadas. Este vai e vem entre versões e testes, é o que chamamos de processo iterativo, e que só pára quando a equipa está satisfeita e decide avançar para produção do artefacto final.
A grande questão é que um artefacto nunca está terminado, por cada nova iteração de testes, são encontradas novas questões ou novas necessidades que precisam de ser melhoradas ou refeitas e a decisão de se avançar para o produto final, acaba sendo quase sempre uma decisão com origem na produção. Assim o que decide que um produto está pronto para o mercado, é aquilo que podemos chamar de guilhotinas de produção, e que assentam essencialmente em duas abordagens: a necessidade de cumprir "deadlines"; ou o esgotamento de financiamento. Quando aplicadas, o processo iterativo é terminado, o produto é fechado, e enviado para produção e depois comercialização.
Seguindo este processo, e aplicando-o agora a uma escala macro, podemos pensar os vários jogos de uma série, como uma sucessão de versões, e as suas vendas e críticas, como os seus testes. Ou seja, quando uma empresa coloca um novo jogo no mercado, ele é avaliado em extensão e profundidade pela comunidade, que se pronuncia sobre o que gostou mais, o que gostou menos, assim como sobre o que funcionou e o que não funcionou, ou ainda sobre aquilo que poderia ter sido feito para evitar os problemas encontrados, ou aquilo que poderia ser feito para melhorar.
"O segundo videojogo, além de trazer uma nova história, é ele próprio todo uma nova versão melhorada do jogo anterior."
Deste modo quando os criadores de um segundo jogo de uma série avançam para o processo de criação, estes não se limitam a criar uma nova história ou a encontrar um novo ambiente ficcional para o artefacto. O segundo videojogo, além de trazer uma nova história, é ele próprio todo uma nova versão melhorada do jogo anterior. Se os jogadores se queixaram da repetição das tarefas, elas são diversificadas, se se queixaram que a narrativa era demasiado curta, arranjam uma maior, se o sistema de combate é inflexível, arranjam forma de o flexibilizar, se o jogo é demasiado punitivo arranjam forma de o tornar mais gratificante, ou de variar a dificuldade, etc. etc. A realidade é que os testes feitos em laboratório não são comparáveis ao teste real de um produto no mercado. E nesse sentido um segundo jogo tem sempre a ganhar imenso com tudo aquilo que se aprendeu com o lançamento do primeiro.
Isto não quer dizer que todos os segundos jogos são melhores que os primeiros, porque como dissemos o processo de design é iterativo, e ele é assim porque nem sempre a resposta encontrada pelos designers para um problema, identificado em testes, ou neste caso no primeiro jogo, é a melhor. Nesse sentido são precisos por vezes vários ciclos de testes até que se encontre a resposta concreta a dar a um determinado problema.
Do outro lado da moeda, pode também dar-se o caso do design do primeiro jogo ser tão bom, que de tão perfeito torna-se impossível realizar alterações que o melhorem. Podendo acontecer duas coisas diferentes: ser feito um segundo jogo em que tudo se mantém igual, mudando-se apenas a história (ex. "Bioshock 2", 2010); ou arrisca-se introduzindo inovações ao primeiro (ex. "Deus Ex: Invisible War", 2003). No primeiro caso, o jogador acaba sentindo que o jogo é mais do mesmo, correndo o risco de se tornar um fiasco caso a história não se revele suficientemente interessante, como acontece com os segundos filmes. No segundo caso, as inovações num jogo já demasiado equilibrado e coerente, têm maior tendência para acabar por descer o nível atingido no primeiro.