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3D Out Run - Análise

Cabelos ao vento.

Eurogamer.pt - Recomendado crachá

Out Run, o clássico jogo de corridas inventado e desenhado por Yu Suzuki (criador de inúmeras arcades marcantes, revolucionárias e icónicas da Sega e também de Shenmue, um dos jogos com maior orçamento, cerca de 70 milhões de dólares), fará 30 anos daqui por um ano meio. Num ser humano esse tempo corresponde a quase um terço de vida. Numa indústria pontuada pela rápida evolução da tecnologia esse tempo equivale a eternidades, tornando obsoleto um produto que poucos anos antes era o grande assomo de originalidade e avanço tecnológico. Hoje, e diante das mais recentes produções de videojogos orientadas para a competição automóvel, o clássico das arcadas que a M2 desenvolveu exclusivamente para a 3DS é um jogo completamente datado. Mas há qualquer coisa de especial que nos faz regressar aos clássicos, especialmente quando se trata de um jogo que se tornou num dos expoentes máximos dos videojogos arcade nos anos oitenta. Poucos jogos simbolizam tão bem uma época e Out Run é um deles.

No princípio dos anos oitenta não eram comuns os jogos de condução e corridas. A Fórmula 1, enquanto desporto automóvel por excelência continuava a gerar emoções e paixões. Entre as várias tentativas que nessa altura procuraram recrear a modalidade destaca-se a cabine arcade Pole Position, da Namco, com o circuito nipónico de Fuji em destaque, sem no entanto ostentar qualquer marca oficial, piloto ou prova. Com o crescimento da Sega a partir do negócio das arcadas, o então presidente da companhia dirigiu-se a alguns dos produtores de jogos, inclusive ao jovem Yu Suzuki, sobre a possibilidade de um jogo de corridas. Para um jovem que acabara de desenvolver Hang-On, Out Run perfilava-se como outra excelente oportunidade para dar ainda mais frescura a um género à beira da ideia que acendesse o rastilho.

A versão arcade de Out Run corre a 30 fps. O estúdio M2 da Sega subiu para 60 fotogramas por segundo.

O lançamento da cabine "deluxe" (sujeita a movimentos de acordo com a orientação dada pelo volante sacudia-se nos embates) em 1986 foi um êxito arrebatador, emulando com bastante realismo a sensação de condução, velocidade, bem diferentes dos jogos de corridas que até então se faziam, pondo ênfase no prazer de condução ao longo de estradas públicas e cenários lindíssimos, como os primeiros quilómetros de asfalto ladeado de palmeiras, areia e mar. Se a isso somarmos um belo Ferrari Testarrossa, descapotável e com uma mulher loura ao lado, é difícil descobrir melhor cruzamento de cultura pop/arcade desses anos 80.

Out Run foi completamente revolucionário. O grafismo deixava qualquer jogador de Spectrum com os queixos caídos e pela primeira vez havia uma sensação de velocidade e avanço sobre o asfalto mal engrenávamos a mudança superior, após os 180 km/h, como se fosse carro a progredir sobre o asfalto, passando pelas irregularidades e não como um carro sobre um asfalto rolador. Vencer o relógio, fintando o trânsito (no mesmo sentido) a velocidades loucas, com os cabelos ao vento, sob músicas cirurgicamente seleccionadas a partir do rádio (uma novidade deliciosa à época) tornou-se decisivo para o sucesso do jogo.

Agora, passados quase trinta anos, os dois homens fortes da equipa M2 (Yosuke Okunari, Sega Japan e Naoki Horii, presidente da M2) pegaram no código de jogo criado pelo veterano Yu Suzuki e garantiram mais um "arcade-perfect" desta linha de clássicos 3D, completamente materializado para a portátil da Nintendo, mantendo o mesmo grafismo luxuriante, os efeitos da cabine, sons reais da recreativa e uma animação espantosamente fluida, ancorada nuns indefectíveis 60 fotogramas por segundo.

O jogo inclui as 4 diferentes cabines do jogo. A mais emblemática é a deluxe.

Nós temos vindo desde há mais de um ano a salientar os magníficos trabalhos de restauro e preservação de imensos jogos Sega, que tanto se notabilizaram como jogos para consolas como dentro das recreativas. O trabalho desta equipa é algo que só se compreende com a devoção que todo o grupo evidencia por aquilo que faz, como um trabalho típico de um artesão. O resultado não é menos que fantástico e agora que caminhamos para o final da segunda vaga de produções 3D Sega classics só espero que aquele estúdio não fique por aqui, e possam voltar em breve trazendo mais conversões perfeitas das arcadas como o decisivo contributo para os "fighting games" em 3D: Virtua Fighter.

Como qualquer jogo oriundo das arcadas, o conceito deste Out Run é muito simples e a dificuldade é progressiva, embora com alguma prática e ao fim de algum tempo qualquer jogador experiente possa completar o extenso mapa que abrange uma pluralidade de diferentes estradas e territórios, na dificuldade normal e chegar ao fim dentro do tempo limite. Seleccionada a música clássica (ou um dos três novos temas seleccionados para o jogo) e posto o pé (dedo) no acelerador, só depois de engrenarmos a mudança superior levamos o carro aos limites. Perto dos 300 km/h, os veículos que ultrapassamos representam obstáculos com os quais facilmente podemos colidir. Há uma boa variedade de carros e até pesados camiões. Afrouxar a velocidade ou mesmo travar quando as condições para passar forem demasiado estreitas é imperativo.

A negociação com as curvas é outro factor constante, com algumas muito rápidas a anteceder curvas que fecham rapidamente, empurrando o carro para fora do percurso. Um embate contra os tão famosos placards de publicidade é suficiente para causar o capotamento do veículo, enquanto piloto e acompanhante ficam espalhados pela estrada , visivelmente desanimados pelo sucedido. Alguns embates mais leves podem levar o carro a entrar em pião, perdendo imediatamente a velocidade. Estas perdas de tempo são preocupantes, especialmente os embates, desbaratando preciosos segundos. Um erro é suficiente para não chegar ao fim de uma das várias metas.

Podem personalizar alguns aspectos como escolher outra cor para o carro e até melhorar a performance do carro, desde que concluam o jogo. Bom incentivo.

Até ao próximo checkpoint o jogador dispõe de um tempo limite. Não existem bónus de tempo. Só uma condução rápida e eficaz permite chegar à bifurcação dentro do tempo previsto e se forem suficientemente rápidos ainda acumulam segundos para o próximo "checkpoint". Na bifurcação têm que escolher para a esquerda ou para a direita. Para a esquerda optam por um percurso mais simples, com algumas escapatórias. Para a direita a dificuldade é maior. Os muros ladeiam os limites do asfalto e o fluxo de trânsito à nossa frente é maior.

Out Run possui belos cenários e diferentes condições de luminosidade. Tanto podem encontrar um sol alto e radiante como um pôr-do-sol enternecedor. Apesar do grafismo 2D, a sensação de velocidade ocasiona muito bem a sensação de profundidade, como se estivessem num espaço a três dimensões, algo bem reforçado pelos efeitos 3D da consola, especialmente na New 3DS. A animação é muito fluida, sem a mínima nota de abrandamento ou bug. Todos os efeitos e pormenores como fumos e movimento do cabelo do condutor e passageira estão lá. Grafismo muito colorido, limpo e com um design absolutamente intemporal.

Depois há toda uma parte de dedicação da M2, como os créditos finais especialmente criados pela equipa, a justificar uma visualização. Mais importante e com efeito na jogabilidade, por forma a tornar realista a aproximação às máquinas arcade, a preservação de ângulos de jogo que deixam experimentar uma perspectiva a bordo da cabine "deluxe", a "standard", a "cockpit" e versões "upright". Os diferentes modelos de cabine encontram-se muito bem desenhados e acrescentam mais autenticidade ao produto, o tal labor e cuidado que acaba por diferenciar realmente esta versão das demais. Concluindo o jogo garantem acesso a diferentes itens que afectam a performance do carro (num deles poderão até conduzir fora da estrada sem perda de velocidade), mas tudo isto é opcional, podendo ser ligado ou desligado.

Sintoniza. Há três novos temas, todos compostos pela Chibi-Tech.

O único ponto menos feliz nesta experiência é a ausência do logo Ferrari na grelha traseira do carro. A Sega deteve durante muitos anos uma licença oficial da fabricante de Maranello para garantir o carro oficial (Testarrossa) no jogo, anos antes até de lançar a arcada. Mas essa licença expirou recentemente e como era uma despesa avultada para os cofres pouco recheados desta Sega, que hoje procura restabelecer a sua posição no mercado dos videojogos, teve de ser abandonada, levando a que outros jogos da série Out Run fossem retirados dos mercados digitais. Felizmente isso não afectou esta produção que sobrevive com um carro em quase tudo semelhante, sendo o logo na grelha traseira a diferença mais óbvia.

Ver no Youtube

Só que isso em nada belisca a magnífica conversão perfeita da arcada Out Run. Esta versão 3D do clássico de Yu Suzuki exibe todos os atributos do original. É dos trabalhos que mais perto ficam dos velhos tempos marcados pela Sega AM2 e outros departamentos de produção arcade, uma ponte para o passado distante de uma companhia que cresceu com o negócio das arcadas e que perdeu preponderância com o seu abrandamento. Felizmente sobram estas versões que permitem às novas gerações conhecer jogos expoentes de uma era perdida. Talvez nem tudo esteja de facto perdido. A M2 quer convencer-nos disso e por 5 euros (não levam caro) ficam com um pedaço da engenharia e imaginação de Yu Suzuki no vosso bolso.

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