Ainda faz algum sentido a guerra de consolas?
Os consumidores só ganham com várias fabricantes e oferta diversificada.
O ano caminha para o final. A pouco mais de cinco semanas do Natal algumas editoras lançam os últimos cartuchos, uma tentativa derradeira de apelar aos indecisos e mais abastados quando a maioria já decide com as suas carteiras e estabelece prioridades sobre o que jogar nos próximos tempos. Estamos já numa fase de abrandamento, depois de escoados os maiores lançamentos do ano. Nutro um particular entusiasmo pelo "retrogaming", mas a indústria prossegue imparável, apontada ao futuro, o futuro que é agora como escreveu a SNK, prometendo e perspectivando-se experiências mais ambiciosas para os próximos anos.
A prova de que esta indústria prossegue em bom ritmo está na quantidade de lançamentos e mede-se no volume de vendas. É verdade que nem sempre há boas notícias, nalguns meses as vendas cifram-se abaixo do esperado e tentações como as micro transacções por exemplo, parecem invadir de forma galopante o conceito de um jogo como o conhecemos, sacando mais dinheiro ao jogador por forma a facilitar e tornar mais acessível a evolução. No entanto, queremos sempre encontrar melhor, ter mais opções, conhecer novas séries, novas experiências com um grau maior de imersão, melhores histórias e esquemas de jogabilidade mais interessantes.
2017 foi um ano fortíssimo e dificilmente se apagará das nossas memórias com a velocidade com que chegou. Desde logo foi um ano marcado pela introdução de três consolas ou duas plataformas se optarmos por uma acepção mais tradicional que exclua a Mini SNES dado que não é uma consola capaz de correr jogos lançados actualmente, mas um sistema fechado que emula software produzido há décadas. No entanto trata-se de mais uma adição à disposição dos entusiastas do mundo retro, sempre interessante e com o fascínio de um design que não tem hoje repetição embora possa influenciar.
Mas o destaque vai naturalmente para o lançamento da Nintendo Switch, por parte da Nintendo, e o lançamento da Xbox One X, a expensas da Microsoft. A Nintendo mais uma vez a demonstrar total compromisso pela sua visão e caminho, demonstrando que, no seu entendimento, o futuro dos videojogos passa pela componente portátil, ainda que nesta fase, de forma híbrida, ao permitir a conexão da consola ao televisor. Já a Microsoft acaba de lançar a Xbox One X, por si classificada como a consola mais potente do mercado. Na verdade, não é fácil construir um PC semelhante por 500 euros. Claro que os seus proprietários ficarão melhor servidos se juntarem à compra um televisor capaz de proporcionar uma resolução de 4K, o que torna mais dispendioso o conjunto, mas é um formato para o qual caminhamos a passos largos.
Temos assim duas ofertas muito distintas, a pensar justamente em diferentes públicos e audiências, tentando convencer uns e outros com os seus argumentos. Pessoalmente vejo isto como fantástico, a possibilidade de poder optar perante uma tão grande e variada oferta. E nem entramos ainda no capítulo do software. Ora, diante de um quadro tão generoso de produtos, é um tanto espantoso constatar que muitos consumidores permaneçam atados à velha discussão da "guerra das consolas", um tema motivado por alguma imprensa, por ocasião dos anos noventa e na passagem do milénio, que olhava para as fabricantes de consolas como "equipas" de um qualquer campeonato, no qual a formação que apoiavam devia aniquilar as rivais.
O que está em causa não é uma guerra de fabricantes, mas a manutenção e viabilidade da indústria, uma forma de assegurar o seu futuro através e propostas e ideias, por vezes com claras diferenças, como agora está patente, mas todas no mesmo âmbito. É interessante verificar como o modelo de três fabricantes de consolas ainda se mantém depois da viragem do milénio, 17 anos depois, usando uma estrutura que ainda é mais ou menos similar à empregue na década de noventa, que conduziu três fabricantes (a mudança operada foi a saída da Sega e entrada da Microsoft).
É por isso que assistimos à regular troca de galhardetes entre os representantes e chefes das marcas, a felicitar o lançamento de um novo jogo, de uma nova consola ou de uma nova propriedade intelectual. Eles sabem que estão no mesmo barco e que só juntos podem ganhar no futuro. O dia em que este modelo caminhar para o monopólio será o primeiro passo para a condenação da indústria, para o atrofiamento dos processos criativos e dos estúdios. Basta ver como a Sega ao deixar o fabrico de consolas encerrou muitas das suas divisões, deixando pelo caminho muitas e icónicas IP's, para desgosto dos fãs. Claro que no actual quadro há margem para melhorar. Esta não é uma indústria perfeita, embora seja representativa dos interesses dos consumidores e das suas preferências, porque repito, são eles que votam e decidem.
Mas fazer dessa votação uma guerra como se ao final só uma marca pudesse ganhar, é tão despropositado como seria inútil monopolizar o mercado. A bem da sua manutenção e segurança para o futuro, todos ganham a partir do momento que são oferecidos diferentes conteúdos e possibilidades de interacção. Duvido, apesar dos problemas, que haja outra época melhor para jogar do que esta, com tantas possibilidades de interacção, ligação e aproveitamento. Deveria ser rejubilante saber que determinada editora arrisca do seu capital para lançar um novo jogo ou novo ip, por oposição à manifestação clubística de que o meu exclusivo é melhor do que o teu, ou que a minha consola é superior à tua e acabará por ser engolida. Qualquer que seja o vosso sistema, desfrutem dos jogos e das qualidades inerentes a cada um. Só temos a ganhar com uma oferta ampla e diversificada.