Brasil torna-se numa potência emergente no sector dos videojogos
Expansão digital e capacidade de criação.
O setor dos videojogos no Brasil tem apresentado um crescimento impressionante nas últimas décadas, apesar dos enormes obstáculos colocados por limitações tecnológicas e barreiras financeiras. Um artigo recente do Gamesindustry.biz, escrito por Marie Dealessandri, explora essa evolução, destacando o papel vital que o país desempenha no mercado latino-americano de videojogos e os caminhos que a indústria local tomou para se afirmar.
Na década de 1980, a indústria brasileira de videojogos deu os primeiros passos de forma tímida. Porém, na década seguinte, a política do governo de bloquear a importação de tecnologia, com o objetivo de incentivar a produção nacional, limitou severamente o acesso às consolas e computadores. Foi neste contexto que surgiram os “Famiclones”, consolas que imitavam a popular Famicom (NES), permitindo a disseminação dos videojogos no país. Uma exceção digna de nota foi a parceria entre a Sega e a empresa brasileira Tectoy, que permitiu o fabrico de consolas como a Master System e a Mega Drive, aumentando o interesse pelos videojogos.
Com a chegada dos anos 2000, o lançamento do Steam e os avanços na distribuição digital abriram novas oportunidades para as produtoras brasileiras, que passaram a ter maior acesso a ferramentas como o Unity. Essa produção coincidiu com o crescimento do mercado de smartphones nos anos 2010, impulsionado por políticas que permitiram que os dispositivos móveis fossem fabricados no Brasil. Como explica Rodrigo Terra, presidente da Abragames, a queda nos preços dos smartphones ajudou a expandir a base de jogadores, o que, por sua vez, estimulou o surgimento de mais de 100 estúdios de produção no país.
A Abragames, fundada em 2004, teve um papel fundamental nesse processo. Segundo Terra, quando a associação foi criada, o Brasil tinha cerca de 30 empresas de jogos. Em 2018, esse número saltou para 400 e hoje ultrapassa os mil estúdios. Esse crescimento foi facilitado pela popularização dos jogos para dispositivos móveis, uma plataforma acessível para a maioria dos brasileiros, e pelo aumento do número de produtoras independentes, embora o país ainda careça de grandes títulos AAA.
Porém, o alto custo das consolas no Brasil, que é o dobro do preço nos Estados Unidos, fez com que o mercado de PCs se destacasse. Terra observa que muitos consumidores brasileiros preferem investir num bom computador, que oferece versatilidade para trabalho e jogos, a optar por consolas caras. Isso faz do Brasil um dos maiores mercados de jogos para PC da América Latina.
O panorama educativo também melhorou. As universidades estão a oferecer cursos especializados na produção de jogos, enquanto empresas como a Kokku formam jovens de áreas desfavorecidas para que possam entrar na indústria. Esses esforços, aliados a uma infraestrutura energética robusta e internet acessível em grande parte do país, fazem do Brasil um ambiente cada vez mais favorável à criação de jogos.
No entanto, a indústria brasileira está a enfrentar um fenómeno de “fuga de talentos”, com talentos qualificados a serem atraídos por empresas estrangeiras. Embora alguns profissionais tenham regressado ao Brasil durante a pandemia, muitos continuam a trabalhar remotamente para estúdios internacionais. Eros Silva, da Apex Brasil, destaca que as empresas brasileiras precisam encontrar formas de competir por esses talentos e atrair investimentos, algo que ainda é limitado pela relutância de muitos estúdios em aceitar capital estrangeiro.
Em 2024, espera-se que a introdução de um novo enquadramento jurídico específico para a indústria dos videojogos no Brasil traga novas oportunidades de crescimento. A regulamentação poderia facilitar o acesso a investimentos e ajudar a criar empresas mais robustas, capazes de lançar títulos mais ambiciosos. Como sugere Terra, a produção de IPs brasileiras reconhecidas internacionalmente é apenas uma questão de tempo.
O caminho a seguir, como analisado no artigo do Gamesindustry.biz, parece promissor, mas depende de uma mudança cultural dentro da própria indústria, que precisa equilibrar visão artística com viabilidade comercial.