Bravely Default: Where the Fairy Flies - Análise
Nas asas da fantasia.
Bravely Default: Where the Fairy Flies é o mais recente jogo de role play nipónico da Square Enix a chegar à Europa e à Nintendo 3DS, numa perfeita conjugação de dois grandes universos. De um lado a Nintendo 3DS que se posiciona como a portátil com mais valioso, diversificado e abundante conteúdo e, por outro, uma Square Enix que à custa deste título nos dá a perfeita convicção de estar de volta ao melhor das suas produções, com um novo enredo bem conseguido e um sistema de batalha mais desenvolvido. Ainda que Fire Emblem: Awakening se posicione como expoente do género role play táctico, Bravely Default mantém os tradicionais combates por turnos, ao mesmo tempo que revela um aproveitamento muito grande das funcionalidades da 3DS, num esforço que faz deste título um dos jogos mais originais do género nos últimos tempos.
Não deixa de ser curioso verificar que boa parte dos melhores jrp's que joguei nos últimos anos e sobretudo nas plataformas da geração passada, quase todos eles foram criados exclusivamente para as consolas da Nintendo. A única grande excepção foi Ni No Kuni, para a PS3, ainda que também exista uma versão para a Nintendo DS. Porém, desde os Dragon Quest para a Nintendo DS, passando por Xenoblade Chronicles de Tetsuya Takahashi e Last Story do lendário Sakaguchi, o grande bloco de jrp's mais ressonante e eivado de inovações foi editado para as consolas da Nintendo. Xenoblade Chronicles é uma pérola e foi, de todos, o título que foi mais longe para o género role play, à custa de uma série de inovações que o posicionaram como uma referência e um título obrigatório de uma qualquer lista de imprescindíveis Wii.
Bravely Default: Where the Fairy Flies, embora não brilhe com a mesma intensidade do jogo de Takahashi, revela amplos trunfos, facilmente se descobrindo, ao fim de poucas horas de jogo e numa curva de aprendizagem facilitada pela colocação de sub-quests relacionadas com a jogabilidade e as principais novidades, que depressa nos sentimos ligados ao melhor que a Square Enix criou até hoje. E não estou só a pensar neste jogo como sequela espiritual do Final Fantasy: The 4 Heroes of Light. Sim, ao fim de algumas horas também estarão a comandar uma equipa de quatro companheiros que conjugam esforços e lutam pelo regresso da paz a Luxendarc. Mas há aqui uma explosão de traços e sinais tipicamente Square Enix, que conjugados com as novidades em termos de sistema de combate, progressão, aprendizagem e reprodução de um novo mundo e enredo, transportam este jogo para um antro de nostalgia e surpresa, onde veteranos e fãs podem saciar a sua paixão por um género que não tem sido muito constante na última década.
Felizmente, Bravely Default é uma aposta segura e obrigatória por todos os amantes de jogos de role play. O seu próprio nome transporta novidade e inovação; dois novos elementos que podem ser utilizados em combate e que modificam completamente a estratégia e a gestão dos elementos da equipa durante o combate. Aliás, um dos pontos mais positivos do jogo e tão tipicamente Square Enix é precisamente a natureza central dos combates, o que nos dá uma garantia de tradição, modernidade e inovação, na conjugação de todos os elementos. E preparem-se. Terão que suar para vencer o jogo na dificuldade padrão.
Bravely Default é um jogo visualmente estupendo e aqui com pena para os recentes titulares de uma 2DS, que vão perder a profundidade desenvolvida para certos cenários. O efeito estereoscópico é realmente um factor distintivo e que por vezes até nos lembra os cenários concebidos para os jogos da série Professor Layton, mas com a diferença de que em Bravely Default podemos percorrer livremente o cenário e avançar de um ponto ao outro, com direito a "zoom out", num efeito belíssimo a que nada escapou, nem mesmo o movimento das nuvens. Os desenhos das personagens revelam-se familiares para quem já trilhou outras derivações, mas a escala do mundo e dos espaços é tão grande, minuciosa e tratada com cuidado, que não encontra mais paralelo. Há apenas uma diferença: enquanto que as cidades, fortalezas e outros espaços do mapa mundo beneficiam desta impecável apresentação, já as masmorras torres e labirintos onde decorrem o combate são apresentadas numa perspectiva 3D e arte mais tradicionais, talvez de modo a facilitar a transição para os combates.
Sendo que Bravely Default foi lançado no Japão em 2012, com outro subtítulo (For the Sequel), a edição que agora nos chega, é o resultado de um conjunto de melhorias e acrescentos que trazem mais opções para o jogador. Uma delas é a possibilidade de efectuar três pontos de gravação, o que é sempre uma boa opção para quem pretende ter um save mais atrasado de modo a poder modificar algo que corra menos bem à frente. Por outro lado, é mais fácil acompanhar as mudanças narrativas que acontecem na última parte do jogo.
Entre outras opções, como a possibilidade de acelerar o processo de combate, reduzir o número de inimigos nos encontros aleatórios, diria que uma das mais relevantes é a hipótese de jogarmos com vozes em japonês. A localização para o inglês está boa, mas para um género que é tão forte em termos de cultura nipónica, poder ouvir os diálogos em japonês é uma opção de valor e que devia estar presente noutros jogos, como Winning Eleven, por exemplo. Podem também escolher um de três graus de dificuldade. Para concluir nesta parte, fica aqui o exemplo de uma boa localização. Com tanto espaço entre o lançamento japonês e europeu, os produtores deitaram mãos à obra e melhoraram o seu jogo, em vez de arranjarem uma localização simples. Isto não só devia acontecer em Bravely Default e pontualmente noutros casos, mas constituir uma regra.
Em termos narrativos, o argumento começa pelo que há de mais tradicional. Um mundo em verdadeiro sobressalto, uma personagem feminina em apuros e um herói, qual sobrevivente de uma catástrofe de proporções épicas (um terramoto) que engoliu a sua aldeia, que opera em seu auxílio. Luxendarc é um mundo vasto, constituído por diferentes regiões e cujo equilíbrio está garantido à custa da presença de quatro cristais que absorvem os quatro elementos da vida: vento, água, terra e fogo. Não obstante o traço tipicamente cliché na abertura da narrativa, a história progride para capítulos empolgantes e contextos narrativos que provam a versatilidade da Square Enix em pegar num tema mais tradicional, típico nos jogos de role play, sem deixar de o jogador adormecido nesse enredo. Aliás, é interessante a divisão que os guionistas operaram entre os que defendem os cristais (o movimento religioso Crystalism) e os que se opõem a esse movimento (os anticrystalism), numa espécie de conflito religioso.