Call of Duty: Black Ops 4 - Análise - Um jogo com três caras
À procura de uma nova identidade.
Call of Duty: Black Ops 4 é um jogo que se encontra numa posição diferente dos seus antecessores. Durante anos, desde o sucesso de Modern Warfare, que a série da Activision dominou os jogos de tiros. Todos os jogos queriam ser Call of Duty, não no sentido literal, mas no sentido de ter uma fatia do seu sucesso e de conseguir uma base instalada de jogadores tão grande. Actualmente, existe um peixe ainda maior do que Call of Duty. O seu nome é Fortnite. Desde de Setembro de 2017, quando foi lançado o modo gratuito Battle Royale, que Fortnite tem registado um crescimento sem igual na indústria. Agora, embora Call of Duty continue a ser uma série de peso nos videojogos, todos querem ser Fortnite.
Até Call of Duty quer ser Fortnite e Black Ops 4 é uma prova dessa ambição da Activision. Call of Duty deixou de ser líder e passou a ser um seguidor, aderindo à moda dos Battle Royale (diga-se de passagem que o próprio Fortnite, apesar de ser "o líder" neste momento, não foi o criador do género). Com o sucesso astronómico de Fortnite, a Activision não pode simplesmente dar-se ao luxo de ignorar a popularidade dos Battle Royale. A sua resposta é o Blackout, o modo Battle Royale de Call of Duty. Criado pela Treyarch, o estúdio que muitos consideram ser o mais talentoso na série Call of Duty, Blackout é um modo para 88 jogadores num mapa de grandes proporções que combina vários locais icónicos da série.
O modo Blackout é apenas uma das "três caras" que Black Ops 4 apresenta. O jogo também tem vários outros modos tradicionais de multiplayer e uma aposta reforçada no modo zombies, que pela primeira vez tem três mapas disponíveis logo de base. Não há, contudo, a habitual campanha / modo história. Os conteúdos foram reforçados com a adição do modo Blackout e os mapas extra para o modo Zombies servem precisamente para atenuar o efeito da ausência da campanha. Há aqueles mantêm uma posição a pés juntos que um Call of Duty tem que ter campanha, mas não me parece uma perspectiva correcta. Prefiro que os produtores apostem noutros conteúdos do que numa campanha forçada, aborrecida e facilmente esquecível (que foi o que aconteceu em Black Ops 3).
"Prefiro que os produtores apostem noutros conteúdos do que numa campanha forçada, aborrecida e facilmente esquecível"
Dito isto, sinto uma falta de identidade e contexto em Black Ops 4. Existem missões contra bots que apresentam os especialistas com que jogamos no multijogador, mas são apressadas e pouco elaboradas. Não estou contra remoção da campanha, mas falta alguma coisa que ligue os diferentes conteúdos. O modo zombies, os modos multijogador e o modo Blackout são experiências radicalmente diferentes. Parece até que a série Call of Duty está em busca de uma nova identidade e ainda não a conseguiu encontrar. É impossível de prever como será o Call of Duty do próximo ano, mas o modo Blackout aparenta ser o pilar central para o futuro, pelo menos enquanto os Battle Royale continuarem na moda.
Blackout, modo Battle Royale para quem não gosta de Fortnite
Fortnite até pode ser o jogo mais popular do momento, mas contínuo sem achar-lhe piada. O foco na construção, que é precisamente o ponto apelativo para muitos, é aquilo que me afasta. O Blackout, o modo Battle Royale de Black Ops 4, é alternativa ideal para quem procura uma alternativa entre a diversão arcade e o realismo. Não é um caso de perfeição à primeira tentativa, mas em comparação aos outros Battle Royale, Blackout é surpreendentemente sólido, divertido e desafiante. Mas se não gostas de Battle Royale, não esperes ser convertido. A Treyarch fez um bom trabalho em adaptar o género a Call of Duty, mas não fez nada de novo, limitando-se a implementar basicamente os mesmos elementos que encontramos em Fortnite e PUBG.
Tal como os outros Battle Royale, a partida começa no céu. Vários helicópteros sobrevoam o mapa numa linha recta estabelecida aleatoriamente e tens um período limitado de tempo para saltar de para-quedas. A escolha do local para aterrar pode ditar como vai correr o resto da partida. Se aterrares no meio do nada, não vais encontrar armas para te defenderes. Por outro lado, se aterrares num local concorrido, corres o risco de morrer nos primeiros minutos devido à presença de vários outros jogadores. Jogar sozinho, a dois ou em grupos de quatro também modifica a tua estratégia. Ter quatro pares de olhos a olhar em redor é bem melhor do que ter apenas um.
As armas que encontrares, bem como os acessórios, curativos, escudo e perks vão ditar as tuas probabilidades de sucesso. Enquanto no modo multijogador começas com uma arma já artilhada e com os acessórios que escolheste previamente, no modo Blackout começas sem absolutamente nada. É efectivamente como um modo de sobrevivência em que tens de competir com dezenas de outros jogadores. O que a Treyarch conseguiu fazer com sucesso é preservar a sensação de que estamos a jogar um Call of Duty. O Blackout é diferente de tudo aquilo que já vimos na série, mas mantém a sensação familiaridade com uma jogabilidade bem afinada que é o resultado de anos de evolução.
É por isso que Blackout, apesar desta ser a primeira tentativa da Treyarch no género Battle Royale, transmite uma sensação de robustez desde cedo. Para todos os efeitos, a jogabilidade de Call of Duty tem provas dadas e já estava pronta. A única coisa diferente é que já não podes fazer duplos saltos recorrendo às paredes e não há regeneração automática de saúde, seja no modo Blackout ou no multijogador tradicional. De resto, é o Call of Duty que já conheces da Treyarch, com excepção de um ajuste ao Time-To-Kill, sendo que agora já não consegues matar tão rápido um adversário (a diferença é mínima, mas faz-se sentir de qualquer forma.
"Blackout, apesar desta ser a primeira tentativa da Treyarch no género Battle Royale, transmite uma sensação de robustez desde cedo"
O que há de efectivamente novo é o mapa de Blackout, o maior de sempre na série e que junta os locais dos mais celebrados. Podemos dizer que é uma "colagem" de coisas já feitas anteriormente, mas mesmo assim, é uma "colagem" bem feita. O mapa é grande, mas não excessivamente. Em algumas partidas, já começas a conhecer melhor algumas zonas. É um mapa de assimilação rápida, embora algumas casas e os seus interiores sejam bastante repetitivos. Nota-se, na repetição de alguns assets e na qualidade visual geral do Blackout, que não houve tempo para fazer melhor. Pelo menos, mantém-se a fluidez dos 60 fps, mas há de facto uma degradação gráfica do modo Blackout em comparação aos outros modos.
O Blackout é um modo de diversão rápida e que te deixa com vontade de voltar uma e outra vez, mas como disse antes, não é perfeito. A armadura de nível 3, embora não seja assim tão comum, é exageradamente poderosa. Call of Duty é conhecido pelo seu time-to-kill rápido, mas com uma armadura destas, um jogador torna-se num pequeno tanque. Estas armaduras podem ser encontradas nas drop packages que caem dos aviões, portanto, existe algum risco envolvido em obtê-las, mas não contorna o facto de que tornam o modo desequilibrado. A armadura não te torna invencível, mas permite que aguentes um número muito maior de balas antes de morrer.
Tirando isto, a interface está francamente mal pensada. Por exemplo, uma das coisas que encontras a vasculhar os locais são os perks. Os perks em Blackout são basicamente itens consumíveis. Podes utilizar um perk acedendo ao menu rápido com o d-pad, mas para saberes o que cada perk faz (ainda são alguns) precisas de abrir o inventário e de ficar exposto. O mesmo acontece para as granadas. Se quiseres trocar de granada, tens que visitar o inventário. É uma pequena irritação, mas num jogo de acção como este, e que ainda por cima te obriga a prestares muita atenção ao que está a acontecer à tua volta, não faz sentido ter que parar para visitar o inventário e fazer uma gestão.
Zombies a triplicar!
A segunda cara de Black Ops 4 é o modo zombies. A Treyarch foi a pioneira deste modo em World At World e apresenta neste novo jogo três mapas imediatamente icónicos e um valor de repetição enorme! O esquema é o mesmo de sempre: cada mapa tem vários easters eggs que precisas de completar para chegar ao fim, no entanto, isto é incrivelmente difícil e precisas de uma equipa de quatro pessoas experimentar para realizar esta tarefa. Todavia, podes simplesmente matar zombies e ver até que ronda consegues sobreviver. Isto é o que a maioria das pessoas faz nas playlists com matchmaking. No seu núcleo, o modo continua fiel às suas origens, mas há algumas novidades que vale a pena salientar.
Com o novo modo Zombies foram introduzidas classes. Existem seis no total, mas no início só tens acesso a quatro (as restantes tens que desbloquear ao subir de nível no modo zombies). Cada classe tem acesso a uma arma mágica, mas que só pode ser usada quando enches uma barra que enche gradualmente à medidas que matas zombies. Além disto, a opção de personalizar uma classe permite que escolhas as poções (podes escolher quatro; cada uma associada a uma das direcções d-pad) e os perks que vais obter das estátuas de deuses que encontras espalhadas pelo mapa. Estes perks das estátuas não são permanentes e tens que voltar a comprá-los depois do seu efeito terminar.
O modo zombie tem três mapas, divididos em duas linhas de história. O mapa Voyage of Despair, que decorre no Titanic, e Blood of the Dead, inserido na prisão de Alcatraz, fazem parte da Aether Story. O mapa IX, que é uma arena de gladiadores, faz parte da Chaos Story. O modo zombies é bastante complexo, muito mais difícil de perceber do que o Blackout. Cada mapa é muito diferente do outros e precisas de decorar onde estão as melhores armas e as máquinas Pack-a-Punch para que possas melhorar o teu armamento. Também precisas de conhecer muito bem os diferentes perks e quais os melhores momentos para usá-los. Se nunca jogaste, pode parecer um simples modo de disparar para zombies, mas é muito mais complexo do que isso. Os Easter Eggs são puzzles complexos e com vários passos. Não é nada fácil desbloqueá-los.
O multijogador tradicional é lamentável
Guardei a pior parte de Black Ops 4 para o fim. Neste momento, os modos multijogador tradicionais oferecem uma experiência inconsistente e frustrante. Há tiros que não são registados, somos frequentemente atirados para partidas a meio, os mapas têm problemas de spawn e podemos morrer mal aparecemos, e o jogo parece fazer de propósito para colocar adversários a aparecer atrás de ti. Tenho jogado praticamente todos os dias desde o lançamento de Black Ops 4 e, no final, a sensação é sempre a mesma: frustração e perda da vontade de jogar.
Os tiros não registados parecem advir da qualidade dos servidores que sustentam o jogo. A Treyarch já prometeu melhorias nas próximas semanas, mas os servidores continuam actualmente com uma taxa de actualização de 20 Hz. Num jogo que opera a 60 fotogramas por segundo, não é ideal. A taxa de actualização opera a um terço da framerate do jogo, o que provoca precisamente problemas de detecção de balas. Não há nada mais frustrante do que disparar primeiro para um inimigo, as balas não registarem e depois ainda morremos. Num jogo tão estabelecido como Call of Duty, é inadmissível e incompreensível (aqui está um exemplo do que estou a falar).
Fora estes problemas, a Treyarch desenhou os diferentes especialistas (existem 10 no total) para encorajar a um maior trabalho de equipa entre os jogadores. Tanto é que tens limitações no número de especialistas repetidos por equipa. Há modos em que só pode haver dois especialista repetidos, enquanto outros mais estratégicos só permitem um especialista de cada tipo por equipa. Nenhum especialista parece poderoso demais em relação aos outros, mas claro que há uns mais ofensivos e outros mais defensivos e estratégicos. Num jogo como estes, os ofensivos vão chamar a atenção, mas os restantes especialista, como Recon, Seraph e Crash são importantes para a sinergia de uma equipa.
"os modos multijogador tradicionais oferecem uma experiência inconsistente e frustrante"
No que toca a progressão, não há novidades. Sobes de nível, desbloqueias novas armas, sobes o nível dessas armas e desbloqueias mais acessórios para tornar essas armais mais poderosas. É a experiência de progressão típica de Call of Duty e já começa a mostrar sinais de desgaste, principalmente agora com o modo Blackout. O multijogador tradicional, antes o pilar central de Call of Duty e o seu ponto mais forte, é neste pacote a parte mais fraca. Gosto da direcção mais estratégica e de trabalho de equipa que a Treyarch implementou, mas não chega para afastar a sensação de que já fizemos isto em anos anteriores.
Uma cara feia, duas bonitas
Para recapitular, Black Ops 4 parece estar à procura de uma nova identidade. O estado negativo do multijogador tradicional e a grande aposta no modo Blackout é um sinal disso. A existência do modo zombies, que surge aqui extremamente reforçado com três mapas excelentes e novidades significativas, ajuda a solidificar o pacote e a acrescentar doses necessárias de conteúdos e diversão para justificar um novo jogo. O modo Blackout é bom, mas por si só não seria suficiente para carregar a série às costas. O facto de que num minuto podes estar a jogar Blackout, e no outro transitas para uma experiência completamente diferente como o modo zombies, pode parecer bizarra, mas apenas vais encontrar tal coisa em Black Ops 4.