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Dark Souls III: o novo protegido de Hidetaka Miyazaki

De volta ao cargo de director, num dos jogos mais aguardados de 2016.

Praticamente já não há segredos bem guardados para a E3, ou melhor, raríssimo é o anúncio bombástico revelado durante a E3. Quando poucas semanas antes de partir para Los Angeles recebemos um e-mail da Namco Bandai a convidar-nos para uma apresentação à porta fechada na E3 para Dark Souls III, pedindo reserva sobre o mesmo, percebi que seria apenas uma questão de horas ou poucos dias, até a novidade resvalar para as internets e passar a domínio público, antes do seu tempo e do impacto que teria ao ser divulgado no momento preciso do evento.

Não tardou por isso, até que de um momento para o outro e ainda bem antes do evento, todos soubessem que Dark Souls III já está em desenvolvimento pela From Software, a produtora dos dois primeiros títulos e ainda de Demon's Souls e Bloodborne. Tivesse sido o anúncio bem guardado e o trailer exibido na conferência da Microsoft, no Gallen Center, o novo jogo de Miyazaki ganharia outra ressonância. Curiosamente, o trailer foi difundido unicamente na conferência da Microsoft, permanecendo à margem da conferência da Sony. O jogo ainda não tem data de lançamento mas é esperado em 2016 para a Xbox One, PlayStation 4 e PC.

É o primeiro Dark Souls criado de raiz para a nova geração e vem assinalar o regresso de Hidetaka Miyazaki ao cargo de director, depois da função de supervisor exercida no segundo jogo, ele que também é presidente da From Software. Isto traduz mais interesse nesta edição, embora seja mais uma com um número ao lado do título. Muito honestamente, não vejo como pode isso ser um problema, se a cada nova edição é complementada por um arranjo de qualidade, nomeadamente esta entrada na nova geração. Dark Souls é uma franquia hoje muito popular, embora nos dias de Demon's Souls e até do primeiro Dark Souls fosse um jogo quase de nicho, de um público fiel mas muito exclusivo.

O combate é o elemento central na demonstração exibida na E3 pela From Software e pelo director do jogo, Hidetaka Miyazaki.

Bloodborne mostrou-nos uma From Software a produzir um jogo mais focado na acção e nas combinações de ataque ofensivas, visando uma maior audiência. Um jogo marcante para a PS4, provavelmente um dos melhores para a consola até ao momento, mas com uma composição e matriz algo diferentes da série Souls. Souls sempre foi mais táctico, com uma projecção da espada e do escudo a um patamar central, essenciais na definição dos combates, alicerçando a partir daí uma experiência difícil e cerebral mas capaz de transmitir uma sensação de gratificação pelos obstáculos superados e missão cumprida num mundo hostil, pleno de contagiantes perigos.

Mais do que isso, só mesmo constatar como Hidetaka Miyazaki se sente tão confortável e visivelmente feliz ao transmitir para uma pequena plateia, instalada diante de um grande televisor, as grandes novidades e linhas gerais por que se cose o seu novo jogo: Dark Souls III. A primeira vez que vi esta personalidade singular da indústria dos videojogos foi em Novembro passado, em Londres, nessa ocasião por respeito a Bloodborne. Desta vez, lá estava ele, novamente, a conduzir-nos sobre o que se passa no ecrã, sempre em japonês (embora ele saiba inglês e perceba algumas palavras, percebi isso quando no final lhe colocamos algumas questões e ele acenava com a cabeça), com aquele olhar maravilhoso e saltitante, de quem está sempre a ver tão tudo e para além do que supomos, visivelmente satisfeito pelos moldes que a sua produção toma.

O regresso de Miyazaki à função de director há muito que era aguardado pelos fãs. Sentindo a sua falta em Dark Souls II, a passagem em exclusivo para a nova geração ditou o seu regresso como uma oportunidade para desenvolver vários aspectos do jogo, designadamente o sentido de escala do mundo e imersão, o mundo apocalíptico onde o jogador é o herói por definição e a evolução da complexa jogabilidade como marca da série. Este sentido e transformações implicam uma nova atenção e Miyazaki é quase por herança a pessoa certa para levar a bom termo um projecto que mais ninguém desenvolve com tamanha devoção.

Mundo à beira do dia do juízo final.

Servindo-se de uma demonstração em tempo real, jogada por um produtor ao fundo de uma sala mal iluminada e quase como cicerone ao nosso canto direito, começou por descrever elementos essenciais do seu jogo, à medida que a personagem penetrava no magnífico cenário pós apocalíptico designado Lodeleth.

Miyazaki começa por descrever o sentido de escala do jogo. O mapa é maior do que nunca. No topo de um castelo, vemos um outro, mais distante. Sem barreiras ou ecrãs de loading podemos chegar até ele seguindo por diferentes percursos, nomeadamente telhados, sendo que as áreas estão agora muito mais conexas. O mundo continua a privilegiar a fantasia medieval. E apesar do cenário apocalíptico e da chegada do dia do juízo final, encontramos momentos de indiscutível beleza, como a luz do sol em certos momentos - luz dinâmica -, destacando-se os visuais únicos. O trailer exibido durante a conferência da Microsoft é espelho disso.

"O regresso de Miyazaki à função de director há muito que era aguardado pelos fãs."

Ao mesmo tempo, verifica-se uma grande evolução em mecânicas de combate. A preocupação central nesta sequela passou por desenvolver o conceito básico, os elementos básicos como o sentido de finalização, a gratificação pelos obstáculos superados e desafios superados e ainda os sistemas únicos de combate. Tudo foi alvo de melhorias e nesta E3, um dos objectivos é precisamente revelar todas as possibilidades de movimento e ataques proporcionados pela espada: habilidades únicas, novos elementos de acção, diversidade de movimentos, expansão do modelo de role play e construção de personagens.

O segmento jogável da demonstração apresenta-nos um grande castelo que logo nos dá uma ideia da escala do jogo. Instalados no topo e com outro palácio ao fundo, todos os edifícios ao redor são passíveis de exploração. Depois de descer por umas escadas e entrar numa secção com pouca luz, o bonfire é utilizado como campo base. Alguns acidentes e mortes acontecem quando somos surpreendidos por inimigos bem colocados e em Souls III isso não desapareceu. Os visuais únicos persistem por exemplo quando activamos uma tocha e o vento arrasta a chama, libertando faúlhas e pequenas partículas que se propagam na escuridão. Ao mesmo tempo escutam-se suspiros, num ambiente aterrador, denunciando ameaças nas proximidades. Face a Dark Souls II o jogo opera um salto incrível.

Algumas áreas podem encontrar equivalências em Bloodborne mas o design é outro, focado na fantasia medieval.

Cá fora, sobram restos de um dragão, uma possível criatura colossal, com uma pata quase do tamanho do nosso herói, em resultado do que terá sido uma luta feroz e mortal. O design está impecável e tudo está criado ao ponto de criar dificuldades ao jogador e desafios adicionais mal o mesmo desagua numa nova área. Num nível inferior existe uma pequena sepultura. As sepulturas encontram-se quase sempre em locais isolados e podem ser activadas. Do ponto de vista da complexidade arquitectónica o jogo opera um avanço quase drástico, aproximando-se do que vimos em Bloodborne, embora com um design diferente mas também afastado das prévias entradas na série Souls.

Em pouco tempo, o herói vê-se cercado por vários inimigos, provenientes de espaços ocultos ao nosso redor. À surpresa dos seus ataques respondemos com um ataque especial capaz quebrar o escudo dos inimigos e abrir espaço para um letal ataque. Com a espada comprida o herói imobiliza-se, recua o braço direito (para carregar o ataque) e desfere uma estocada rápida e impactante, capaz de deixar o inimigo atordoado e aberto a um outro ataque, desta vez letal. Convém no entanto usar este movimento apenas contra um adversário, de outra forma o risco de receber um ataque inimigo é maior enquanto se desenvolve o processo de ataque. Isto desenvolve-se com alguma rapidez embora sem aquela velocidade de Bloodborne. Em Dark Souls, os combates são mais estratégicos e também continuam a depender muito da utilização do escudo para surtirem efeito, usado numa primeira fase como defesa.

Avançado um pouco mais na demonstração, vemos o herói chegar a um ponto bloqueado por um imenso dragão capaz de cuspir labaredas de fogo, incinerando qualquer criatura que se atreva a intrometer no seu caminho. Existe um percurso alternativo, mas esse acesso encontra-se vigiado por vários inimigos. A única hipótese passa por atraí-los para uma armadilha (o lume do dragão) em vez do combate contra todos (são vários e seria um risco enfrentá-los ao mesmo tempo). Eficaz. Nem tudo se resolve pelo recurso ao combate.

Outra função ligada à espada é o lançamento. Consiste num ataque realizado sobre qualquer um dos inimigos, embora seja útil para os maiores e os mais difíceis, pois inflige bastante dano. A animação está muito bem conseguida e o que vemos é o herói abeirar-se do inimigo, penetrando na sua defesa (ultrapassando o escudo), para de seguida o projectar e espetar a espada nas costas no momento em que o inimigo está em queda desamparada. Este ataque opera-se com velocidade, mas a sua execução está longe de ser simples e ainda depende de algumas variantes, como a reacção do inimigo e tempo de execução. Basta um pequeno erro para que tudo corra mal. Mas é brilhante quando executado na perfeição.

Os efeitos de luz estão muito bem conseguidos e a frame rate pareceu-nos bastante consistente.

Outra grande evolução respeita ao posicionamento e movimento dos inimigos. Eles estão mais rápidos e mesmo a alguma distância conseguem atacar com alguma possibilidade de êxito, pelo que a movimentação da nossa personagem é crucial. A qualquer momento os adversários usam o escudo para um "back stab", dando origem a uma espécie de dança prévia aos embates.

De volta à demonstração, numa parte que nos revela várias possibilidades de avanço. Através dos telhados dos edifícios a exploração é enorme, com várias possibilidades verticais e horizontais. O herói entra numa nova área. Chama-se Wall of Lodeleth. Miyazaki salienta o sistema de controlo da personagem: mais refinado. Começa por descrever algumas das principais armas. Com a terceira arma, o arco, pode atirar setas com fogo. Mas uma possibilidade interessante passa por usar uma das setas sem arco, espetando-a manualmente nas costas do oponente. Com alguns risos, o director do jogo recorda aqui Legolas de Lord of the Rings. A utilização do arco curto e longo gera mais algumas opções.

Em seguida, espadas duplas. O herói gira sobre si mesmo, efectuando um "spin" letal, capaz de acabar com o próximo inimigo. É quase uma dança em movimento, com boas animações. Com alguma eficácia é possível derrotar vários inimigos usando este golpe. Mais à frente o cenário fica mais agreste. Dois inimigos cobertos de protecções, escudos enormes e lanças, tornam mais complicada a missão. Miyazaki explica-nos que esta é uma componente táctica e que o jogador deve partir para estes confrontos pensando nas soluções possíveis. A oportunidade passa por separar os dois e nunca os enfrentar conjuntamente. Observar o padrão de movimentos de cada um e contra-atacar. Os dois são derrotados após alguma persistência nos ataques.

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Por fim dá-se a entrada na câmara do boss. A porta atrás que abrimos fecha-se num ruído aterrador e gotas do tecto pingam no chão sem parcimónia: eis Dancer of Cracy Ballet. O design deste boss é único e mais uma vez Miyazaki surpreende com estas criaturas colossais e movimentos de ataque. Este boss usa uma espada enorme, quase três vezes o nosso tamanho, capaz de pegar fogo ao cenário, causando o perfeito caos naquela câmara. A única vantagem é que ao começo os seus golpes são lentos e algo previsíveis, mas isto só acontece porque ainda lhe infligimos pouco dano. Assim que retiramos saúde à criatura, ela passa a descrever movimentos quase como um bailado, ceifando tudo à sua volta com mais velocidade. Os bosses de Dark Souls III receberam novo design. Perante as transformações no padrão de ataque do boss, o herói acabou por morrer, nada de surpreendente nesta parte.

Finda a demo, percebemos que esta parte mostrou-nos sobretudo a escala do mundo de Dark Souls III e o combate, melhorado e dotado de mais movimentos, mantendo no entanto aquele equilíbrio característico dos primeiros jogos. Por enquanto, não foram divulgados dados sobre magias e funcionalidades online. Com o regresso da direcção que marcou o original (um dos mais elogiados pelos fãs), Dark Souls III é desde já um dos jogos mais antecipados de 2016. Hidetaka Miyazaki está imparável, mesmo acumulando o cargo de director nos jogos com as suas funções directivas como responsável máximo da From Software. Está em alta e só queremos ficar a saber ainda mais sobre o seu próximo protegido. Um dos meus favoritos desta E3.

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