Deveria prestar mais atenção aos Troféus?
O peso das platinas nos videojogos.
Desde 1982 que alguns raros videojogos apresentaram a iniciativa individual de atribuir desafios e consequentes recompensas aos jogadores, mas somente em 2005, com a chegada da Xbox 360, é que o conceito de Conquistas de Jogador se começou a estabelecer. Uma lista de diferentes objectivos com pontuações específicas que demonstram o empenho ou habilidade de um jogador nesse determinado jogo, foi um conceito tão simples mas avassalador que varreu esta indústria. A iniciativa da Microsoft para a sua segunda consola, criou uma enorme competitividade entre as comunidades de uma forma que nenhuma tabela de pontuações jamais poderia ambicionar. A dada altura, no pico da febre inicial, vários jogadores analisavam os seus jogos de acordo com as Conquistas de jogador, dependendo da sua facilidade e do tempo necessário para as obter a todas. Para muitos tornou-se numa obsessão que os motivava a corresponder a todos os desafios propostos pela equipa de produção, que podiam prolongar o jogo muito além do seu final propriamente dito. Para outros tantos, tornou-se numa mera curiosidade que nunca chegou a ganhar tracção.
Dois anos mais tarde, em 2007, a Valve adicionou esta funcionalidade aos jogos que vende no seu serviço, o Steam, enquanto em 2008, a Sony decidiu agraciar a PlayStation 3 com a sua versão do conceito: os Troféus. Em 2011, a PlayStation Vita chegou ao mercado já compatível com essa funcionalidade e até mesmo os sistemas mobile incluem as suas versões deste elemento nos seus jogos. Até ao momento, só mesmo a Nintendo tem passado ao lado do conceito, seja com a sua Nintendo 3DS ou com a sua mais recente Nintendo Wii U. Entre praticamente todas as plataformas de videojogos, e entre as três fabricantes dedicadas, a gigante de Kyoto é a única que ainda passa ao lado da ideia de aliciar os seus jogadores com objectivos opcionais premiados com pontuações num sistema global extra-jogo.
Desde 2005 que os Troféus/Conquistas se tornaram num autêntico fervor e apesar de ver inúmeras pessoas a festejar os 1000GS ou o Troféu de Platina, ao longo de praticamente 10 anos, com inúmeros videojogos, raramente consegui interagir com um jogo unicamente com o propósito de obter troféus/conquistas.
Tradicionalmente, jogo como se não houvessem estes desafios, jogo como em gerações anteriores à sua chegada, em que os objectivos eram terminar o jogo e aproveitar ao máximo o que tinha para oferecer. Seja concluir masmorras opcionais num JRPG ou então chegar ao final com todos os lutadores num fighting game, aquela ideia, de peso individual, que é tirar o máximo proveito de um jogo. Especialmente tendo em conta o preço deles. Aquela ideia de estar a jogar contrariado qualquer modo de jogo opcional ou a repetir horas a fio uma tarefa aborrecida apenas para receber a tal notificação, é algo que me passa completamente ao lado. Corri o risco em algumas raras ocasiões de o fazer e senti-me sempre a perder gosto pelo jogo e a sentir alguma frustração.
O mais problemático parece ser que os Troféus/Conquistas se tornaram numa maneira de medir a dedicação de uma pessoa ao título que está a jogar. Em alguns casos até podem estar directamente relacionados, algo como receber um feito por cada capítulo terminado até ao final do jogo, mas em outros casos tal não é assim tão directo. Alguns jogos podem até abusar de tal factor e artificialmente prolongar a sua longevidade para que o jogador passe mais tempo à sua volta, mesmo que esteja a executar tarefas que o aborrecem e que de outra forma jamais as iria executar.
A curiosidade inicial em jogos como Project Gotham Racing 3 ou Dead or Alive 4, subiu de tom e na altura de Halo 3 e Gears of War consegui alcançar o meu expoente máximo. Jogando repetidamente várias secções desses jogos para melhorar a prestação e conseguir enfrentá-las em dificuldades superiores. No entanto, rapidamente esgotei a minha dedicação a estes Troféus/Conquistas. A simplicidade inicial e até alguma inocência na forma como os estúdios escolhiam as acções que desbloqueavam estes feitos, rapidamente deu lugar a uma postura que quase poderia ser descrita como cruel esperteza para forçar o jogador a investir mais tempo, mesmo que não o desejasse.
É uma linha que se pode tornar confusa: até que ponto estamos a jogar porque gostamos do jogo e queremos passar mais tempo ou se estamos a jogar porque nos faltam ali 70 pontos ou algo assim e até já nos queríamos livrar dele. Ainda assim, vi alguns jogos que conseguem mesmo aliciar o jogador que de bom grado ficam mais tempo com o disco na consola. Frequentemente fui incentivado a enveredar por caminhos diferentes ou a assumir outras posturas ao verificar a lista de desafios e senti que engrandecia a experiência. Esse é provavelmente o lado que mais me agrada neste elemento, a oferta de diferentes alternativas que até poderiam nem estar a ser equacionadas.
Existem jogos com uma lista de Conquistas/Troféus excelente, que empolgam o jogador a ir mais longe, que criam uma maior sintonia com o jogo através destes desafios que assim que concluídos são premiados. Até se tornam numa parte importante da experiência. Outros são simplesmente horríveis e até retiram prazer do videojogo. Existem alguns casos assim.
Com o passar do tempo, deixaram de ser uma coisa sensacional que todos gostavam de verificar para passar a ser uma banalidade, uma espécie de formalidade que já se dá por garantida. É obrigatório em todos os jogos na actualidade e uma engenhosa forma de verificar a postura da equipa de programação na hora de estabelecer mais uma ponte de ligação entre jogador e jogo. Apesar de existirem vários desafios confusos e até enganadores, a verdade é que outros tantos são deliciosos e divertidos.
Posso, por exemplo, referir que nesta geração apenas consegui o pleno num videojogo e que outros, mesmo passando largas horas com eles, a minha percentagem apenas chega a 20-30%. Simplesmente focava-me no que me dava gosto, no completar da vertente principal do jogo e nem me importava em afastar-me do que me alegrava para passar tempo extra em algo que me deixa frustrado. Ouvir alguém dizer que iria comprar um jogo apenas porque a lista de conquistas era fácil sempre me fez confusão, até porque podemos passar imenso tempo com um jogo e nem desbloquear nada. Ainda assim, na altura da Xbox 360 tal tornou-se comum entre as comunidades que pediam ajuda aos amigos. Lembro-me de entrar em salas combinadas para servir de "boneco" para alguém conseguir uma Conquista.
Enquanto jogador, prefiro focar-me na vertente principal e descobrir se esses incentivos se encaixam com a minha perspectiva do jogo. Se estiver a jogar e gostar de fazer algo, se tal me garantir um feito no jogo, poderei continuar e até investir algum tempo extra caso contrário não irei desviar-me do que gosto. Recordo quando terminei inFAMOUS: Second Son, por exemplo, que passei tempo extra a passear pela cidade e a desfrutar da qualidade gráfica mas não consegui completar toda a lista de desafios. Alguns simplesmente me forçavam a tarefas para as quais não tinha paciência.
No entanto, não consigo deixar de ficar impressionado com a dedicação dos jogadores quando vejo que fizeram o pleno num determinado jogo, provando a sua dedicação. Claro que depois fico a pensar se será gosto pelo jogo ou mera paciência. É uma boa forma de manter o jogador ocupado por mais tempo, pelo menos no seu conceito base, e se não for deturpado por "maléficas intenções", será um factor até benéfico para o título. No futuro, dificilmente me vejo a jogar um jogo só pelos Troféus/Conquistas ou a ser forçado a jogar um modo/executar ou repetir uma tarefa que não gosto apenas para receber aquela notificação.
Talvez por isso seja tão libertador jogar nas plataformas da Nintendo, onde não sentimos a ameaça de sermos julgados pela percentagem daquela lista. O desafio está no jogo em si e não somos obrigados a repetir tarefas aborrecidas só porque sim. Claro que não podemos generalizar e, como já referido, existem jogos que até reforçam positivamente o seu valor com a lista de Troféus/Conquistas. Talvez não seja meramente uma questão de jogar por prazer e deixar a experiência correr por ela vs. competitividade com muita paciência para chegar aos 100%. Talvez seja mesmo a gratificação de chegar mais além nos jogos e corresponder aos desafios dos programadores, respeitando mais o título que desenvolveram.
A questão que deixo agora é se desfrutam da postura da velha-guarda de deixar ver como corre a experiência e usufruir do jogo tal como ele é, indo mais além se tal se encaixar na diversão que retiram do mesmo ou se são adeptos dos feitos de jogador? Sentem essa chama que grita pelo vosso espírito competitivo e apenas acreditam que o jogo é plenamente respeitado quando acenam a todos os desafios dos programadores?