Endless Ocean 2 Adventures of the Deep
Protejam o mar!
Como escreveu Vergílio Ferreira, “da minha língua vejo o mar”. Temos uma magnífica propensão para isso. Talvez a profundidade inscrita no subtítulo desta sequela da Arika seja posta ao serviço de uma ambivalência tendente a favorecer uma maior objectividade e consistência do jogo que encontra também na vastidão das águas marítimas cristalinas e de menor profundidade um pretexto para reproduzir com firmeza e admirável observação a vida marinha.
A tendência deste jogo favorece, pela execução no design, progressão e banda sonora, toda uma visão do mar absolutamente paradisíaca; local de segredos, aberto para o relaxe e para a descoberta, cheio de mitos e, por isso, sempre abordado numa perspectiva moldada ao conhecimento e tranquilidade, ainda que por vezes tenham de defrontar algumas espécies mordazes como tubarões, mesmo que para isso recorram ao inédito Pulsar, uma ferramenta que permite curar alguns peixes doentes e tranquilizar outros sedentos de carne, sobretudo humana. De fora ficou todo o desafio que o mar escuro, frio e revolto provoca aos pescadores que se servem das águas escuras e fundas para dele retirarem a subsistência. Endless Ocean 2 enquadra-se perfeitamente naquele estilo de programas que rodam Sábado de manhã, abrindo os confins dos oceanos de uma forma exaustiva. Também como prelúdio para umas férias na Polinésia francesa é um óptimo começo.
A atenção dedicada por parte da Arika à reprodução da vida marinha é incontestável. À medida que exploram e atravessam o mar irão identificar criaturas das mais variadas espécies, numa exploração que rivaliza facilmente com o conhecimento enciclopédico interactivo, ao ponto de, no vosso centro de apoio, arquivarem todos os detalhes sobre os seres e organismos vivos, num fascínio a levar em conta. Dos grandes cetáceos, aos peixes que se movimentam em cardume; dos pinguins, focas e lontras, é crível observar toda a movimentação, especialmente das tartarugas, mas também os sons que emanam. Para todos há uma ficha de identificação envolta num mínimo de detalhes sobre a espécie.
De algum modo a Arika teria de concertar o sentido de exploração e conhecimento da vida nos oceanos (nos seus pontos mais idílicos) com a interacção e sentido de progressão mais ligados aos comandos comuns de interacção num videojogo. Assim começarão por escolher uma perspectiva de acompanhamento, desde a primeira pessoa até à terceira para uma visão mais abrangente. A personagem mexerá as barbatanas premindo o gatilho no Wii remote para se aproximar dos peixes. Identificado determinado peixe poderão alimentá-lo e se for dos graúdos, agarrar uma barbatana e seguir com ele mais uns metros. As opções vão surgindo no ecrã, com tudo o que é essencial para a exploração. A movimentação no fundo do mar revela-se simples, mas devidamente animada. À medida que progridem poderão comprar mais objectos que facilitam a presença no fundo do mar e todo um equipamento que melhora a performance subaquática.
Não pensem, porém, que estão perante um jogo desprovido de personagens, articulação entre elas e até omisso quanto a uma narrativa. O que existe é um cruzamento entre essa exploração e os motivos que vão motivando a personagem (um mergulhador em fase de aprendizagem) a percorrer vários oceanos e locais de mergulho espalhados pelo globo. A capitanear terão um velho dos mares, chamado Jean Eric, juntamente com a sua sobrinha – Océane - que acaba por ser o ponto de partida para narrativa, elencado num segmento inicial, quando o mergulhador de serviço descobre o acesso ao que deverá ser um brutal tesouro perdido no fundo do mar relacionado com um mito chamado “Song of Dragons”. Até lá irão descobrir e interagir com imensas criaturas marinhas, tendo por base um duplo apito. Este trecho acaba por ser decisivo para a formatação de uma série de objectivos que se repartem pelos planetas; desde os pólos até às costas. A variedade de locais dentro e fora de água é consistente.
Teria sido preferível tornar o processo de aproximação e partida para as pequenas aventuras de uma forma mais desenvolta. Falhem a missão porque o ar da botija acabou e terão de voltar ao centro de comando para começar tudo de novo, com algumas animações e diálogos obrigatórios por vezes aborrecidos de percorrer mesmo à segunda vez. Para lá das missões principais poderão completar esta progressão com uma série de “quests” opcionais, propondo outros desafios ligados ao espírito de qualquer mergulhador, guiando turistas até determinados pontos e capturando imagens dos protagonistas principais desta aventura nos atóis.
Uma pequena porção de areia que não terá mais de 30 metros quadrados, adensada de palmeiras a ladear uma casa de madeira onde poderão repousar é o vosso centro de comando. Comandarão o mergulhador à superfície do mesmo modo com que habitualmente o fazem debaixo de água. À sombra, e numa cabana está todo o arquivo de exploração, progressão, gravação, contacto rádio, podendo a qualquer momento interagir com outras personagens ou partir para outros pontos do planeta. Integrado está o ciclo dia/noite claros, subdivididos em despontar do sol e pôr do sol.
Em termos de opções para vários jogadores poderão recorrer à rede para convidar um comparsa que detenha o mesmo interesse para um mergulho e exploração conjuntas, ainda que o grosso do jogo seja por si suficiente para gerar um salutar e considerável convívio com o mar. É verdade que este jogo acaba por ser essencialmente uma paz de espírito e, em boa medida, arrojado na simplicidade, tornando a interacção branda sem com isso excluir alguma complexidade e rigidez na forma como exige o cumprimento de certos objectivos, mais complicados do que podem parecer. Talvez por isso o que mais acabará por distinguir este jogo e torná-lo praticamente único é a vocação para a exploração, profundidade e reprodução da vida marinha, elementos que a Arika soube autenticar. É uma questão de mergulhar e começar a descobrir.