Fast Racing Neo - Análise
Hipersónico.
As corridas futuristas há muito que andam arredadas das consolas, principalmente das plataformas domésticas. Wipeout 2048 contou com uma passagem pela PS Vita, em 2012. No caso da Nintendo, o último grande destaque sonante no género foi F-Zero GX (GameCube), um dos melhores jogos da plataforma e que ficou marcado pela estreita colaboração entre Sega e Nintendo (para as arcadas saiu uma versão AX baseada na placa triforce - Nintendo, Sega e Namco). Conjugando a jogabilidade típica dos jogos de corridas arcade com velocidades hipersónicas e pistas que muito se assemelham a montanhas russas, a produtora germânica Shin'en não só quebra um hiato como, aparentemente com pouco, consegue fazer uma enorme proeza. E quando se diz pouco tem-se em conta a dimensão do estúdio e dos participantes nesta surpresa de final de ano para a Nintendo Wii U: Fast Racing Neo.
Quase 20 pessoas trabalharam no jogo. Basta acompanhar os créditos após a conclusão do primeiro troféu para jogador individual. Igualmente impressionante, como os diferentes modos, dos troféus, ao online, passando pelas 16 enormes pistas e veículos, cabem num ficheiro de aproximadamente meio gigabyte, que é o espaço necessário para instalar o jogo no disco da consola, depois da compra (é exclusivo eShop). O resultado é uma produção apaixonante e surpreendente, que nos remete para aqueles jogos insanos e fluidos, que muitos de nós nos lembrámos de jogar nos salões de jogos. Como o espírito das corridas arcade presente em Fast Racing Neo não é suficiente, não é menos óbvia a ligação a F-Zero GX, claramente a maior fonte de inspiração dos produtores alemães.
Talvez um tributo e até, porque não, uma chamada de atenção para a Nintendo, de que o estúdio está disponível para fazer um novo F-Zero, caso as chefias assim o entendam. Com mais recursos, uma equipa maior e mais produção, quem sabe até onde iria a Shin'en se pudesse cuidar de um novo jogo de corridas futuristas da franquia criada por Miyamoto para a Super Nintendo. Pese embora a grande proximidade com F-Zero, Fast Racing Neo apresenta os seus argumentos, bem como uma jogabilidade algo divergente e desafiante à custa das constantes mudanças operadas no turbo. Para manter o aparelho a grande velocidade, não só é necessária uma boa gestão do turbo como são necessários reflexos rápidos.
"O resultado é uma produção apaixonante e surpreendente, que nos remete para aqueles jogos insanos e fluidos, que muitos de nós nos lembrámos de jogar nos salões de jogos"
Em Fast Neo Racing competimos em diferentes troféus a partir de três níveis de dificuldade (principiante, intermédio e perito). Todos os níveis oferecem quatro troféus e cada troféu é composto por quatro corridas. Ao todo existem 16 pistas, o que significa que vão percorrer todas dentro de um nível de dificuldade. O sistema de competição utilizado é o das corridas em circuito, compostas por três voltas. Existem dez competidores e é dada uma pontuação do primeiro ao último. A progressão para o troféu seguinte só acontece quando finalizarem os troféus anteriores, pelo menos na terceira posição.
A passagem para a corrida faz lembrar F-Zero. Os diferentes ângulos de visão para a pista, os primeiros acordes musicais e a voz a assinalar a contagem decrescente. Depois, ao apertarmos o botão de aceleração ao fim do número 2 (da contagem decrescente) a máquina arranca com mais velocidade (numa alusão a Mario Kart). Se premirem o botão de arranque no primeiro ou terceiro segundo a aeronave engasga e falham a partida.
Depois da partida, lançamo-nos numa corrida a velocidades estonteantes e hipersónicas. Sem turbo, tudo normal. A sensação de velocidade é boa e o comando da máquina é muito simples, mas a verdadeira aceleração começa quando recolhemos umas esferas colocadas em pontos estratégicos da pista. Essas esferas carregam o turbo e assim que lhe damos utilidade a máquina entra em velocidade hypersonica, sendo não só mais complicado o comando desta, principalmente nas curvas lentas, como o espaço envolvente ao aparelho passa a grande velocidade, ao mesmo tempo que ondas de calor se libertam da máquina, pelo esforço extra. Estes picos de velocidade tornam as corridas mais entusiasmantes e há uma constante necessidade em obter a velocidade extra para se atingir as posições da frente.
Através dos gatilhos do gamepad é possível inclinar a nave, com movimentos mais adequados para as curvas intermédias, feitas a velocidade normal. O travão está lá e a sua utilização esporádica, em pontos precisos, pode revelar-se decisiva, embora provoque um abrandamento excessivo do aparelho, ao ponto de o deixar à mercê dos rivais, que lançados em velocidades estonteantes nos atiram para fora da pista. Obter todas as esferas de turbo disponíveis em diferentes zonas da pista requer alguma precisão. Por vezes a velocidade é tão grande que se torna difícil ir ao encontro delas.
A alternativa para obter mais velocidade extra, e aqui entramos num dos esquemas de jogabilidade mais deliciosos e desafiantes de Fast Racing Neo, consiste em seleccionar a cor do turbo em conformidade com a cor de uma rampa de lançamento, projectando o aparelho a velocidade extra durante um bocado de tempo. Recordam-se de jogos como Ikaruga, que vos deixavam seleccionar a cor dos disparos para atingir mais facilmente os inimigos? O processo é algo similar, mas em vez de inimigos temos zonas no asfalto ou nas estruturas metálicas da pista pintadas com duas cores.
Podemos utilizar o laranja ou azul. A mudança de cor é simples. Basta uma pressão no botão que está mesmo ao lado do acelerador. Podem fazer tudo ao mesmo tempo. Acelerar e mudar a cor. Estas mudanças são cirúrgicas. Se passarmos por uma superfície com a mesma cor seleccionada no turbo, ganhamos mais velocidade, mas se falharmos ocorre um curto-circuito e a nave abranda drasticamente.
O nível de dificuldade é significativo. A escolha das naves não deve ser feita por acaso ou só porque preferimos um design ao outro. Existem diferentes critérios, como relação entre peso, velocidade máxima e aceleração. Nas pistas mais rápidas uma nave com grande velocidade de ponta é obrigatória, enquanto que nos circuitos lentos é necessária uma máquina menos rápida mas com pouco peso e mais aceleração.
"O design dos circuitos está muito bem conseguido"
A categoria 200 cc em Mario Kart destacou-se pela velocidade, mas muitas pistas não estavam preparadas para o andamento adicional. Em Fast Racing Neo, pese embora as inúmeras armadilhas e algumas secções menos rápidas, não há uma única pista que esteja em divergência diante do ritmo avassalador das naves. O design dos circuitos está muito bem conseguido. Existe diversidade de cenários (montanha, neve, deserto, selva planície, zona industrial, etc), perfazendo 16 circuitos muito bem realizados, cheios de secções memoráveis, com muitas luzes, cores contrastantes e uma dimensão assinalável, típica dos grandes jogos arcade. E os obstáculos não são apenas os adversários. Existem obstáculos naturais como imensos pedregulhos que rolam montanha abaixo, ventoinhas gigantes, inúmeras falhas no asfalto que forçam saltos épicos e até uma aranha gigante que à volta do circuito vai picando o asfalto, podendo atingir as naves. Há uma constante necessidade de atenção, e a precisão e rapidez com que nos desviamos destes obstáculos pode ditar sucesso em toda a linha ou uma derrota clara.
A saída de pista prolongada pode levar à desintegração da nave, assim como o embate contra uma rocha, um contentor ou uma estrutura após um salto mal realizado. Nesse caso recuámos para o ponto anterior e a perda de tempo é ainda maior. Como se não bastasse o abrandamento e a perda de tempo, voltar atrás parece-nos uma punição não muito justa. Nos troféus de dificuldade elevada, um acidente pode deitar tudo a perder. A dada altura é imperativo gerir o turbo, escolher o tempo certo para acelerar a fundo e memorizar bem a pista, explorando atalhos e escapando às inúmeras armadilhas. Pena que não haja um mapa da pista, sempre útil para nos ajudar a perceber melhor a curva seguinte ou se nos encontramos numa secção rápida.
A fluidez do jogo é impressionante, não descolando dos 60 fps. Talvez no intuito de preservar esse número, só encontramos nove adversários em pista. De resto, o pelotão tende a circular muito próximo e rapidamente podemos cair da primeira para a última posição. Em F-Zero GX, existem 29 adversários. Em termos de opções multiplayer, o jogo contempla a possibilidade de ecrã dividido até quatro jogadores ou corridas online, com os amigos ou jogadores do território, até 8 participantes. Quanto ao modo Hero, é só para profissionais e perfeccionistas de Fast Racing Neo. Terão que desbloquear todas as ligas do modo carreira, e a competição que terão pela frente é muito mais exigente, nem se dá por concluída com um lugar no pódio. Só a primeira posição interessa.
Destaque para a boa banda sonora, com imensas músicas electrónicas e sonoridades que encaixam bem no "ecosistema". Um conjunto muito bem conseguido e coeso, e uma abordagem marcante em termos de design, parecendo um jogo simples mas elegante e equipado a rigor. Por 15 euros terão a correr no GamePad da Wii U uma das surpresas deste final de ano e um saudável rival de Mario Kart 8. A Shin'en é um pequeno estúdio que desta vez se agigantou e conseguiu competir com os grandes, mesmo com os parcos recursos. Às vezes é assim, quando menos se espera algo de bom acontece e Fast Racing Neo é um dos jogos bons deste final de ano, e de 2015.