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GoldenEye 007 revisitado 25 anos depois

A luta com os comandos e abertura para futuros shooters.

A colecção de jogos disponíveis na Astro City mini, a célebre arcada da Sega reconfigurada no formato “tabletop”, abarca Virtua Fighter, um dos primeiros jogos 3D. Desenvolvido pela Sega AM2 em 1993, marca o começo de uma viragem na produção dos jogos. Se até então o 2D se encontrava aperfeiçoado e desenvolvido até ao limite das capacidades das consolas e arcadas, é sobretudo nestas que os jogos em 3D ganham notoriedade e crescem, ao proporcionarem ambientes com maior profundidade e um grau de realismo acentuado. Nas consolas, o 3D também sedimenta a base, potenciado pela Saturn, PlayStation e Nintendo 64. Curiosamente, é na consola da Nintendo que surge um jogo chamado Turok, da Activision. Com 4MB de memória os resultados não são tão vincados como numa recreativa dos salões. Turok consegue impressionar pela forma como produz ambientes tridimensionais, mas o efeito nevoeiro torna-se numa limitação mais evidente dos jogos 3D nas consolas.

Os primeiros jogos 3D apresentam uma configuração mais poligonal. O que se ganha com fluidez perde-se em texturas. As memórias RAM fazem maravilhas neste campo e o que sucede na viragem do milénio é uma maior capacidade das plataformas e placas gráficas para gerar ambientes 3D, traduzindo universos mais credíveis e realistas. O 2D continua a ter o seu espaço e ainda hoje é recorrente em vários géneros, mas quando pegamos num jogo 3D de meados da década de noventa, daqueles jogos 3D da primeira vaga, torna-se mais evidente que o salto em qualidade das produções não tem comparação.

GoldenEye 007, recentemente lançado para o Nintendo Switch Online e GamePass, os serviços de subscrição da Nintendo e Xbox, respectivamente, funciona como um regresso às origens desse 3D cru mas ao mesmo tempo revelador de milagres efectuados pelos produtores quando trabalhavam com plataformas ainda limitadas para o tipo de efeitos. Mas se hoje olhamos para as limitações desses sistemas, à época introduziram novidades e abriram a porta a géneros e universos que se consolidariam em poucos anos.

Produzido pela Rare e lançado em 1997, GoldenEye 007 teve uma produção conturbada: passou por várias fases de desenvolvimento, começando por ser um jogo 2D para a SNES. Não obstante o acordo com a Nintendo para criar um jogo com base na licença do filme, a equipa de produção falhou a janela de estreia do filme, o que levou a Nintendo, a dada altura, a solicitar o cancelamento do jogo. Os produtores evitaram publicar a carta à equipa e conduziram o projecto do jogo até à fase derradeira, entregando-o dois anos depois da estreia do filme.

25 anos depois do lançamento, que sensações nos dá este “shooter” baseado numa licença cinematográfica? A adaptação aos comandos requer algum tempo, até porque o sistema de pontaria através da mira está caducado. Não há como evitar olhar para GoldenEye como um jogo do seu tempo, no qual as memórias associadas à experiência diante da consola e de um monitor CRT podem superiorizar-se às actuais tentativas de adaptação. Mas também se vislumbram qualidades, com segmentos de espionagem e acção furtiva, através de labirintos e áreas interiores, nas quais é imperativo uma acção silenciosa e eficaz. Um olhar atento também repousa em certos segmentos.

Se os jogos 2D de meados dos noventa eram produzidos como estado da arte, o que os torna óptimos mesmo quando jogados hoje, os ambientes 3D são mais fechados e opacos, oferecendo uma espécie de frugalidade ou opressão nos visuais. Mas as ferramentas, leia-se armas, com que 007 recorre, entre os “gadgets”, a fim de eliminar as baterias de adversários, são surpreendentes. A estrutura multiplayer, tanto local como agora incentivada pelo online exclusivo da Switch, haveria de anteceder outros jogos que se tornariam superlativos anos depois, nomeadamente Halo: Combat Evolved e Perfect Dark (este da mesma Rare). Se há momentos em GoldenEye 007 em que parece que estamos num combate em Quake ou Doom, deve-se à inspiração necessária dos produtores, a fim de dar credibilidade aos ambientes e uma afinidade com o filme.

Um sucesso comercial à época e um jogo incontornável da Nintendo 64, levou muita gente a desgastar o analógico do comando “tridente” e superou a expectativa dos produtores e da própria Rare, que na viragem do milénio é adquirida pela Microsoft, passando a desenvolver para a Xbox, a primeira consola da marca de Redmond. É um jogo longo e bastante exigente do ponto de vista da dificuldade. Hoje os seus controlos parecem arcaicos, o que pode tornar-se num sério desafio sem uma prévia fase de adaptação e treino. É pena que a actual versão disponível para a Switch e Xbox Series S/X não tenha passado pelo crivo dos produtores que trabalharam no código original. Por certo fariam hoje qualquer coisa de interessante, com tantos recursos disponíveis, que no seu tempo nem por sonhos imaginavam ter em mãos.

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