HarmoKnight - Análise
Tempo marca o ritmo.
Vem sendo cada vez mais frequente que os jogos lançados no Japão para a eShop da 3DS ganhem, com mais ou menos distancia temporal, uma versão digital europeia. Temos o caso mais recente de Code of Princess para ilustrar a situação. Lançado no Japão e nos Estados Unidos em formato físico através da Atlus, pensava-se que o jogo da Agatsuma Entertainment and Bonés não faria a viagem até à Europa sob uma mesma edição. Para prevenir riscos financeiros, a melhor forma de acautelar a edição passou por reservar o lançamento do jogo para uma edição digital apontada à loja on-line da 3DS. E assim, ainda esta semana, o jogo que é uma mistura de beat'em up com role play, ficará disponível, em formato exclusivamente digital, na tenda europeia da 3DS.
HarmoKnight, da nipónica Game Freak, chega-nos pela mesma rampa de lançamento. Editado no Japão, ainda corria o ano de 2012, os europeus terão a partir de quinta-feira a possibilidade de aceder ao mesmo produto, num título que nos traz localização textual e vocal para inglês. Cumpre referir que a Game Freak, a produtora do jogo, não é uma desconhecida destas lides. Se atentarem no respectivo catálogo de jogos fabricados, descobrem que esta é a produtora dos jogos Pokémon para as portáteis da Nintendo.
A diferença é que desta vez temos um produto de feições distintas e afastadas dos moldes tradicionais de um Pokémon. HarmoKnight é um jogo de ritmo e acção, articulando estes dois elementos para criar desafios sustentados, imediatos e de uma grande acessibilidade que não deixará o comum do jogador indiferente. Entregando características que o aproximam dos jogos arcade, HarmoKnight reveste-se de um agradável e satisfatório design, altamente colorido, e eivado de uma musicalidade, que embora não sendo marcante, permite-nos descobrir equivalências nas sonoridades marcadamente nipónicas.
É normal pensarmos que o forte do jogo serão as músicas e ritmo. Afinal é essa sequência de tons graves e agudos que promove desafio e interacção. Nesse aspecto, HarmoKnight não é tão forte como o recente Beat the Beat, ou então como o já distante mas sempre presente e carismático Ouendan (também conhecido por cá como Elite Beat Agents), lançado para a Nintendo DS. O primeiro revelou-se altamente simples em termos de mecânica, mas intransigente no desafio e excelente na incorporação do design e registo melódico. Como todo, é do mais bizarro e viciante que podem encontrar no género, enquanto que o último provocou um aproveitamento pleno do ecrã táctil, gerando múltiplos pontos de toque, à medida que ilustrações do tipo anime ou manga ganhavam relevo no primeiro ecrã. Pelo meio, hits de rock nipónicos ou ocidentais, para lá de uma extrema empatia, espalharam carisma.
Infelizmente, Harmoknight não consegue chegar ao mesmo nível destas experiências, aproximando-se mais de um Final Fantasy Theatrythm e sem nunca ganhar uma marcha triunfante em termos musicais. Apesar de ficar um pouco aquém das expectativas de um produto com a qualidade que podíamos esperar da Game Freak, a verdade é que isso não frustra de todo o modo a experiência. Apesar da menor criatividade, consegue criar um desafio seguro e farto em conteúdos, sem nunca perder de vista um grau de exigência que implicará algumas rotinas e poder de memorização.
Indo ao concreto, HarmoKnight conta-nos a história de um planeta musical chamado Melodia e que num certo dia é atacado por umas terríveis criaturas chamadas Noizoids. Espalhando rochas que obstaculizam as ligações entre as grandes áreas que constituem Melodia, é neste mundo de cor e som que emerge um jovem e triunfante protagonista chamado Tempo. Nesta sua aventura, será acompanhado pelos seus amigos Lyra e Tyko, que também serão chamados à titularidade em certos segmentos, provocando alterações subtis ao nível da jogabilidade, já que Lyra dispõe de um arco bastante útil para alvejar ao longe e Tyko faz da força um argumento decisivo para esmagar os adversários, personagem que leva à cabeça um macaco capaz de produzir efeitos nos inimigos situados em pontos altos. Contudo, a história nunca adquire grande relevância, nem as personagens se dissociam por aí além de um design e produção genéricos, o que acaba por tornar secundário ou menos relevante o desfecho da história e destino de cada uma.
Porém, é na jogabilidade que descobrimos mais motivos para aproveitarmos o jogo e retirarmos partido do investimento aplicado. Apresentado através de segmentos em scroll horizontal, mas totalmente em 3D, a perspectiva em 2D torna-se suficiente para ficarmos com uma ideia das notas que se encontram assinaladas ao longo de cada nível. A Game Freak desenvolveu um esquema jogável que passa por uma aproximação às plataformas e por uma execução de certos movimentos dentro dos timmings precisos.
Enquanto que a personagem corre automaticamente, irá cruzar notas musicais que se situam ao longo do seu percurso, sendo que estes contactos promovem uma sensação de batida. Além disso, Tempo pode saltar para outras plataformas, evitando quedas e continuando dentro do ritmo. Este contacto com as notas musicais permite a Tempo aumentar a pontuação, enquanto que se mantém dentro do ritmo. Pelo meio os inimigos lançam ataques e projectam dificuldades ao nosso herói, procurando anular-lhe a vida. Acertando com precisão, os inimigos são repelidos, numa conformidade sonora que nos permite completar o nível num de três degraus de pontuação (so-so, great e good). Para os japoneses so-so quer dizer mau, great é satisfatório e good quer dizer bom. Se completarem o nível com sucesso máximo terão direito a notas musicais monarcas, essenciais para abrir novos percursos dentro das áreas.
Cada mundo possui sete ou oito níveis adaptados a uma temática exclusiva. No final, há sempre lugar para uma "boss battle", também baseada numa série de coordenadas que requerem memorização e acções adequadas aos movimentos. Em breve conjugam-se saltos e pancadas nos inimigos, com movimentações para a esquerda e para a direita, assim que a perspectiva de jogo abrir uma porção lateral, mostrando-nos o caminho em profundidade. Algumas sequencias acontecem em modo "preview", alertando-nos para a sequência dos botões a pressionar, estando assinalado o ponto a partir do qual devem repetir a operação. Falhem o timming e a pancada nos adversários e perderão pontos vitais. A perda de vida tende a ser frequente, muitas vezes porque as notas se sucedem de forma galopante, implicando operações através dos botões que se tornam quase impossíveis de cumprir.
Como teria sido mais eficaz se os toques fossem operados através do ecrá táctil. Sem contar com as vezes em que há uma desordem natural entre salto, golpe e salto e golpe em simultâneo, temos ainda a dificuldade suplementar causada pelos colegas de Tempo, cujas acções distintas só causam mais desconforto do que propriamente um justo desafio.
À custa de um sistema de comandos que não se revela o mais adequado para uma consola com dois ecrãs, sendo o segundo um monitor táctil, acontece demasiadas vezes que acabamos por perder a vida ou ficar sem uma pontuação perto da máxima, não por nossa inoperância, mas porque a natureza apertada de certas sequências não colhe a melhor resposta por intermédio da pressão nos botões. Por vezes chega a ser frustrante.
Os mundos estão organizados por temas, no entanto os níveis não são muito diferentes, e acabam por se revelar assaz similares, exceptuando as “boss battles”. De resto, estes níveis podem ser jogados individualmente, bastando para isso que pressionem Y no mapa mundo. Além disso, a caracterização genérica das personagens pode desmotivar uma audiência mais adulta, que nunca chega a sentir-se conquistada. Por exemplo, as sequências musicais em Rayman Origins são muito mais explosivas e atractivas do ponto de vista musical. HarmoKnight, não consegue replicar o mesmo modelo, pelo que, apesar de não faltar desafio, os cenários e temas envolventes raramente se tornam apaixonantes.
O preço pode ser outro obstáculo. Apesar de estarmos diante de um jogo que possui uma extensa campanha individual; a mecânica não muito eficaz, músicas pouco inspiradas e uma ausência de outros modos de jogo, condicionam o resultado final. Todavia, HarmoKnight é uma opção satisfatória se procuram uma experiência musical dotada de um desafio progressivo, apesar de serem evidentes algumas falhas. Sem a irreverência de um Elite Beat Agents (eu continuo a preferir a versão japonesa - Ouendan), e sem o humor e a simplicidade de um Beat the Beat, HarmoKnight nunca chega a impressionar. É certo que estamos perante um jogo eShop, mas já vimos propostas deste calibre com mais arte e engenho. Assim, fica só a meio de um percurso que podia ser triunfante. Vale sobretudo por acrescentar mais diversidade a uma eShop que tem vindo a receber muitos conteúdos neste primeiro trimestre de 2013.