Homefront: The Revolution - Análise
Ambição não lhe faltava.
Homefront: The Revolution é um daqueles casos que espelha a Lei de Murphy. Tudo aquilo que poderia correr mal durante o desenvolvimento, aconteceu. Anunciado originalmente em 2011, a sequela de Homefront ficou a cuidado da Crytek do Reino Unido, que comprou os direitos da série à THQ quando a companhia entrou em falência em 2012. Todavia, a falência da THQ resultou num atraso na produção e em 2014 voltaram a surgir problemas financeiros, desta vez associados à Crytek. Em meados de Junho / Julho de 2014 a Crytek estava a passar por dificuldades, e no final de Julho, foi anunciado que a Deep Silver adquiriu os direitos de Homefront 2, o que resultou numa troca da equipa de produção. Com tantas reviravoltas durante a produção, não admira que Homefront: The Revolution tenha sido um desastre no lançamento.
No lançamento estava quase injogável. Os constantes soluços da framerate aliados ao agitar da câmera no acto de correr causavam-me náuseas terríveis. Esta é razão para o atraso nesta análise. Era difícil jogar Homefront: The Revolution sem ficar fisicamente indisposto. Mais de um mês após o lançamento e com cinco actualizações disponíveis, o desempenho está mais aceitável, pelo menos, já consigo jogar sem ficar mal disposto. É incompreensível como é possível que o jogo tenha chegado às lojas neste estado, mas as náuseas são apenas um dos muitos problemas que Homefront: The Revolution apresenta.
Antes de mais, um pouco de contexto. Homefront: The Revolution está inserido num futuro próximo e alternativo na qual as duas coreias se uniram, criando uma nova super-potência mundial, e invadiram os Estados Unidos da América. The Revolution não tem laços com o primeiro jogo, pelo menos em termos narrativos, o que é uma vantagem para aqueles que não o jogaram. Os eventos da sequela decorrem no estado de Philadelphia e colocam-nos no meio de uma revolução para devolver o poder aos cidadãos que vivem agora oprimidos pelo estado coreano. Enquanto o primeiro jogo nos mostrava a invasão, The Revolution retrata os eventos após a invasão. Existem zonas completamente destruídas e outras muito degradas, enquanto aqueles que cooperam com os coreanos vivem mais confortavelmente numa zona com melhor aspecto mas com muita supervisão.
O cenário tem potencial e é diferente do que encontramos noutros jogos de tiros, mas a Dambuster Studios (a produtora da Deep Silver que terminou a o desenvolvimento) não o soube aproveitar. A história e as suas personagens simplesmente não cativam. Poucas horas depois do início do jogo, já não queria saber da revolução nem de libertar o povo. Num jogo destes, é crucial criar uma forte narrativa para que o jogador se sinta envolvido e motivado. Homefront: The Revolution falha nisto. É tudo tão artificial e forçado que jogar torna-se numa tarefa e não em entretenimento. O jogo também sofre do síndrome de mundo aberto, uma condição recente na indústria dos videojogos.
O que é o síndrome de mundo aberto? Esta condição ocorre quando um jogo tem, desnecessariamente, um mapa em mundo aberto, ou então não aproveita devidamente esta mais valia. Os jogos em mundo aberto são à partida apelativos, prometendo liberdade para explorar um novo mundo e diversas actividades secundárias, mas Homefront: The Revolution limita-se a fazer o que já muitos outros jogos fizeram antes. O jogo tem várias zonas abertas, mas para transitarem entre elas, precisam de passar por um ecrã de carregamento, daí ter dito antes que está mais próximo do semi-mundo aberto. Em cada zona o objectivo é conquistá-la a 100 porcento, expulsando por completo as forças coreanas. Para isto terão que fazer coisas como cortar a energia de geradores, salvar pessoas dos soldados coreanos na rua, e estabelecer novas bases de operação da Resistência.
Deste modo, Homefront: The Revolution está cheio de actividades secundárias, mas nenhuma delas acrescenta algo de valor para a história e, eventualmente, tornam-se repetitivas. As próprias missões principais não são nada de especial, tanto é que não me recordo de nenhum momento que me tenha deixado impressionado. O grande problema é que a forma como o mundo do jogo está retratado não tem credibilidade. As bases de operações da Resistência estão mesmo ao lado das forças coreanas e não sentimos perigo se formos apanhados a fazer alguma coisa ilegal. Quando são apanhados, basta esconderem-se por alguns segundos num contentor do lixo ou numa casa de banho portátil e tudo volta ao normal. Já agora, o comportamento da IA também é horrível. As forças coreanas podem estar armadas até aos doentes e cheias de tecnologia avançada, mas inteligência têm pouca.
Na jogabilidade encontramos uma mixórdia de elementos de outros jogos. A movimentação e a escalada de estrutura fazem-nos lembrar de Dying Light, o hacking pisca o olho a Watch Dogs, e também temos um telemóvel onde recebemos mensagens e que serve para tirar fotografias nalgumas missões. Um dos poucos aspectos positivos é a possibilidade de personalizar todas as armas com várias modificações, como supressores, suportes para dar mais estabilidade, carregadores maiores, e outras coisas. Apesar disto, disparar uma arma em Homefront: The Revolution dá pouco gozo. A gunplay (o controlo das armas) é um dos aspectos mais importantes num FPS. Existem jogos que nos agarram logo nos primeiros minutos graças a este factor, mas este não é um deles. A juntar a isto tudo, temos um mundo banal em que torna-se difícil distinguir zonas diferentes dentro da mesma área.
"Está cheio de actividades secundárias, mas nenhuma delas acrescenta algo de valor para a história"
No que toca à parte visual, Homefront: The Revolution é um jogo com bons gráficos mas com uma estética desinspirada. Apesar dos bons efeitos visuais, a estética (como referi antes, as áreas parecem todas iguais) faz com o jogo pareça banal visualmente. Todavia, vale a pena recordar que o motor usado é o CryEngine. É do conhecimento geral que a Crytek é um supra-sumo em criar jogos graficamente potentes (foi assim que surgiu o meme "But Can It Run Crysis?"), e antes de Homefront passar para as mãos da Deep Silver, era uma das grandes apostas da Crytek para exibir a sua tecnologia. Ainda assim, é difícil ignorar a falta de optimização e as oscilações na framerate, que prejudicam a experiência.
Além do modo história, existe um modo cooperativo online chamado Resistance. Neste modo podem formar grupos compostos por quatro jogadores (amigos ou desconhecidos) e completar missões de diferentes dificuldades. Faria mais sentido que o modo cooperativo estivesse integrado no modo história, em vez de ser um modo à parte com progressão separada, mas nem todas as missões da história estão preparadas para quatro jogadores, e talvez este seja o motivo que levou o estúdio a separar o modo cooperativo. Este modo permite-vos criar a vossa personagem e escolher uma de muitas classes com vantagens diferentes. Até poderia ser um bom modo extra, não fossem os problemas já referidos aqui.
Apesar de todos os seus defeitos, Homefront: The Revolution é um jogo ambicioso e que tentou superar em tudo o original. O mundo aberto, as personalizações para as armas e as outras engenhocas que podemos usar (como carros telecomandados explosivos), o hacking, e a grande quantidade de objectivos secundários são a prova que a Dambuster Studios aproveitou as influências de outros jogos e tentou criar um jogo para agradar a um vasto público. No entanto, no meio de tantas influências The Revolution falha em ter uma identidade própria. A sua ambição também o impediu de brilhar, visto que apesar das suas muitas ideias, nenhuma consegue satisfazer em pleno. Claro que, o desenvolvimento conturbado não ajudou e provavelmente condenou o jogo ao falhanço. Os muitos problemas no lançamento, que agora existem em menor quantidade, provam que Homefront: The Revolution não estava pronto para ser lançado.