Já construímos os primeiros brinquedos de Nintendo Labo - Antevisão
Novas formas e surpreendentes mecânicas de interacção com os Joy'Con's.
A capacidade da Nintendo para nos surpreender quando menos esperamos parece não conhecer limites. O ano passado, por esta altura, poucos apostariam as suas fichas num sistema portátil híbrido capaz de suceder e triunfar no seguimento de uma Wii U pouco convincente e penetrante. Decorrido mais de um ano, a Switch é um sucesso em todos os continentes, colhe sorrisos e gera receitas, tendo já ultrapassado a fasquia dos 10 milhões de unidades vendidas em todo o mundo, um número que parece projectar a consola para um futuro auspicioso.
Mas, a Nintendo é também uma companhia com mais de um século de existência, criada em 1889 como fábrica de cartas (Hanafuda). Durante décadas permaneceu ligada ao papel, explorando segmentos de mercado algo próximos, antes de lançar uma série de brinquedos, nas décadas 60 e 70. É nesse período que causa impacto a comercialização do Ultra Hand, um produto que vendeu milhões, criado por Gunpei Yokoi, engenheiro fulcral na área electrónica. Nessa década e na posterior foram lançadas as bases do que seria o trampolim para os videojogos, em franco crescimento após a entrada de Shigeru Miyamoto, que juntamente com Yokoi se tornaram providenciais na criação de sistemas de jogos arcade e depois nas consolas.
Entre as produções mais surpreendentes encontram-se os comandos por movimentos, jogos como Wii Sports e, mais recentemente, o 1 2 Switch, um dos jogos que põe à prova as funcionalidades e os sistemas incorporados nos Joy-Con. Não foi por acaso que na apresentação da Switch, os Joy-Con foram mostrados em primeiro lugar, precisamente pela sua versatilidade e utilização em diferentes formas e contextos, o que deixou muitos utilizadores renitentes e preocupados, mas percebe-se agora melhor o seu alcance.
Em 2018, a Nintendo volta a surpreender com esta nova propriedade intelectual, o Nintendo Labo, que é sobretudo uma experiência na forma como interagimos com os comandos e com o ecrã da consola, em articulação com uma série de objectos de cartão. Esta experiência prima pela simplicidade, uma característica habitual em muitas experiências Nintendo e um retorno às origens e a um passado algo distante, criando uma espécie de "full circle". Um ADN que é o seu, ao mesmo tempo que retoma o conceito da experiência em família, num divertimento partilhado sobre a mesa e prescindível do televisor, sendo suficiente como mecanismo de interacção o ecrã táctil da consola.
A ideia pode assumir um tanto de chocante, é verdade, pelo desvio que opera no formato mais tradicional e do que muitos esperam de uma indústria que evolui no sentido da tecnologia. Mas há um tanto de impressionante e algo cómico até neste quadro de explorações, derivações e experiências que a Nintendo não se coíbe de forma alguma de apresentar. A Nintendo quer convencer a indústria de que videojogos também podem combinar com processos de construção de coisas mais ou menos complexas, feitas a partir de cartão, fora do habitual circuito entre o jogador e o televisor. Pegando em coisas simples como uma cana de pesca, um carro controlado remotamente e um piano, e processos básicos como a pesca, uma corrida ou uma música, é possível dar seguimento a um contexto de brincadeira e divertimento, a partir dos tais comandos por movimentos.
O desafio patente nesse quadro de interacção é maior ou menor consoante o objecto criado, como sucede na pesca, quando criamos uma cana de cartão com sistema de extensão e rotação, o mecanismo de interacção que permite lançar fundo o anzol de modo a capturar primeiro os peixes mais pequenos com os quais alcançam peixes maiores, como raias e tubarões. O carro controlado remotamente a partir do ecrã da Switch configura o exemplo mais básico e simplificado, e talvez por isso sirva como porta de entrada para melhor se compreender esta produto.
Nintendo Labo chegará às lojas no próximo dia 27 de Abril, na forma de duas opções: o Variety Kit e o Robot Kit. A primeira caixa permite criar diferentes Toy-Con's, incluindo o carro telecomandado, a cana de pesca, a casa Toy-Con, a mota e o piano. O Robot Kit é bem mais complexo e por isso é apenas um Toy-Con, de grandes proporções, uma criação de grande complexidade. Com ele poderão experimentar várias experiências, nomeadamente o modo Robot, que vos deixa destruir prédios e UFO's.
Nada como experimentar para se perceber o alcance deste novo IP
Impressionante foi a palavra que encontrei para descrever o que estava a acontecer ao fim de uma hora de descoberta. Não há nada existente que seja parecido ou próximo e o interessante é verificar o cruzamento entre a sua componente de fabrico e brinquedo com os videojogos. Não sendo verdadeiramente um videojogo, oferece mecanismos de interacção peculiares, quase hilariantes. Da fase de construção dos objectos passamos para a experimentação, através de uma série de mini jogos possíveis, pondo em funcionamento os joy-con e o ecrã da Switch.
A caixa de Nintendo Labo lembra imenso os modelos de construção como kits de automóveis ou aviões da Tamiya. Mas enquanto que esses modelos envolvem mais complexidade na sua criação e um processo de pintura minucioso, aqui somos brindados com tiras de cartão que contém as partes de um objecto a criar. Destacando-as pelo picotado e por fases, começamos por construir o primeiro objecto, o carro telecomandado que não é bem um carro mas que anda lá perto.
"Não há nada existente que seja parecido ou próximo"
A fase de construção é acompanhada por um manual interactivo mostrado no ecrã da Switch. Pousado sobre a mesa, com a patilha de apoio, transmite todas as indicações e passos a dar, desde as dobras nos vincos até aos encaixes finais. E assim vai ganhando forma o objecto pretendido. No carro controlado remotamente, o processo de construção é bastante simples. É na verdade o mais acessível de todos. Passos fáceis e simples que permitem chegar ao resultado definitivo num tempo a rondar os 15 minutos. Depois podem colorir a gosto e aplicar uma série de decalques.
No meio deste processo, há sempre a dúvida sobre a resistência e durabilidade dos materiais. É importante ter cuidado no processo de construção, evitando folgas e espaços que fiquem por apertar, sob pena de algo ceder. O cartão é suficientemente robusto para manter a solidez durante algum tempo, mas é natural que a passagem do tempo e factores como luz solar, humidade e um tratamento porventura mais impiedoso e persistente conduzam ao desgaste fatal dos objectos. Poderão sempre criar novas peças usando as sobras e a grelha, mas nada disto previne o que nos parece ser o ponto mais sensível da experiência: a fragilidade. E quando objectos destes entram em mãos de crianças, o grande público alvo deste produto, o risco de danos espreita a todo o instante.
O carro desloca-se por intermédio dos dois joy-con, que montados numa espécie de asa servem de motor. O movimento do carro é muito reduzido, mas se colocarem mais carros sobre a mesa, numa perspectiva multiplayer da experiência, podem criar alguns desafios, como uma batalha de sumo ou simplesmente uma corrida para ver qual o primeiro a fazer um metro. Outro dado interessante é a utilização do sensor de infra vermelhos, o que permite controlar o carro em espaços sem luminosidade, enquanto o ecrã da consola exibe uma janela com a perspectiva na primeira pessoa do carro. Este é o quadro de operações. Existem algumas opções em termos de interacção e até um quadro que permite calibrar os comandos para uma melhor execução.
De seguida fabricamos a cana de pesca, um objecto mais elaborado, amplo e extensível, dotado de um mecanismo de rotação. O grau de complexidade é mais significativo e os passos são dados com mais atenção. Consumimos mais tempo na produção do objecto e toda a construção se processou com o empenho de outra pessoa. Neste caso e para os mais pequenos, é fundamental o acompanhamento de uma pessoa adulta, com alguma experiência. Ainda assim criamos a cana de pesca num período entre 30 a 40 minutos. O equipamento só ganha utilização se fizerem o mar, outra estrutura que basicamente acomoda o ecrã da Switch e serve para mostrar o fundo, com os peixes. O caricato deste esquema é que envolve a ligação através de um fio, de modo a tornar prática a rotação, embora seja o joy-con que ao girar sobre si transmite o sinal à consola.
Igualmente espantoso é o piano, um tanto semelhante a uma máquina de escrever , mas cujas teclas de cartão são surpreendentemente sensíveis ao toque, produzindo efeitos imediatos, sem lag. Claro que o truque de magia é o sensor de infra-vermelhos, que detecta a movimentação das teclas e produz os sons. O ecrã da consola instala-se sobre o piano, como uma partitura. Infelizmente as teclas são limitadas pelo que ficam um pouco condicionados no que toca à extensão máxima do teclado. Mesmo assim podem subir uma oitava e até alterar o tipo de som introduzindo cartões específicos. E não faltam melodias predefinidas.
"A Nintendo volta aos mini jogos dos comandos por movimentos, partindo de uma proposta diferente"
Mais complexo, o piano é um objecto cujo processo de construção pode ultrapassar as quatro horas, sendo fundamental a intervenção de um adulto. Todavia, é um sistema que não deixa de nos causar impressão pela magnitude e funcionamento. A partir de algo simples criamos uma estrutura aparentemente complexa, bastante funcional, divertida e acessível.
Com este sistema de produção de objectos de cartão, nos quais inserem os joy-con, a Nintendo volta aos mini jogos dos comandos por movimentos, partindo de uma proposta diferente. Apesar de se questionar a durabilidade dos materiais, a construção é a fórmula encontrada pela Nintendo para tornar isto apetecível e tentador para os mais pequenos, que com o apoio de um adulto e de familiares, participam e interagem facilmente. Com outro tipo de materiais, mais resistentes, a acessibilidade e projecção para uma vasta audiência não seria possível. A estrutura do Nintendo Labo vai de encontro aos mais pequenos, através de processos de interacção que tocam nos brinquedos e nas brincadeiras da nossa infância. A caixa inclui ainda uma mota, que não pudemos ver no seu tamanho real, mas que nos deixou a imaginar sobre as possibilidades de interacção.
Há uma certa ingenuidade na exploração deste arrojado conceito, a partir de coisas simples, sempre presentes nas nossas vidas e que sempre existiram. E nisto visualizamos também uma finalidade, a do divertimento e entretenimento entre familiares, roçando a comédia e o tom hilariante pelo insólito. Qual seja a resposta e o voto dos utilizadores, é evidente que esta é uma experiência feita sobretudo a pensar nos mais pequenos, e que de algum modo levará os adultos a recordarem as suas infâncias, quando em tantas ocasiões, se faziam brinquedos a partir das caixas de cartão e com o apoio de um almanaque coisas um pouco mais elaboradas. A Nintendo quer mostrar que é possível conjugar esse reduto de memórias com a tecnologia da sua nova consola.