Life is Strange Ep1: Chrysalis - Análise
Mistério e dramas em tom Teen 'tude!
Depois de Remember Me, que desenvolveu para a Capcom, o estúdio Dontnod volta agora com um novo jogo novamente focado numa personagem feminina com mecânicas de jogo que acrescentam imenso a fórmulas já existentes. A ideia de criar um produto com imenso estilo e substância que pede muito emprestado mas sem medo de acrescentar o seu toque parece estar presente no ADN do estúdio. Esta nova aventura gráfica episódica chamada Life is Strange parece conter tudo isso e mais. O estúdio Francês decidiu optar por uma experiência que os jogadores vão conhecer aos poucos e tal como numa série de TV, é preciso saber estruturar o episódio para que o jogador fique agarrado à espera de mais mas também é altamente importante apresentar conteúdo que nos mantenham atentos e interessados.
A vida é mesmo estranha e para Maxine Caulfield voltar de Seattle para Arcadia após cinco anos não está a ser bem o que esperava. Jovem pacata, que se considera uma croma devido ao seu elevado gosto pela fotografia e pelo cinema, pelas sua vida anti-social ou pela incapacidade em ser como os outros, ou de se enquadrar na perspectiva que a social estabeleceu como uma jovem normal, Max continua a viver os dias perdida num mundo seu. Isto até um dia perder-se mesmo num mundo que poderá confundir os jogadores a acreditar que é mesmo só seu. Desde os instantes iniciais que somos confrontados com uma situação repleta de mistério que nos deixa desde logo com imensa curiosidade.
Uma aventura gráfica mergulhada em mistério e drama, finalizada com um laço de Teen 'tude é o que temos aqui e será surpreendente para alguns a forma como o jogo nos poderá agarrar. Se pensarem nos jogos do estúdio TellTale Games facilmente conseguem traçar o esquema deste Life is Strange na vossa mente. Uma grande parte deste produto será passado como espectador enquanto a outra será passada a investigar diferentes locais. Tudo alternado com sequências nas quais teremos que dialogar com pessoas escolhendo com cautela as opções pois tal como o estúdio reforça, uma frase poderá ditar acontecimentos no futuro que no imediato não são aparentes. Ora se temos então uma jovem com as suas aventuras e desventuras em pleno liceu, como é que alto tão banal se pode destacar?
"Life is Strange foca-se numa personagem que crescerá aos poucos em nós cujo drama banal se mistura com um mistério surreal."
O primeiro episódio começa com o que parece ser um pesadelo de Max mas rapidamente esta descobre que adormecer a meio de uma aula não é o mais dramático que lhe acontecerá neste dia. Com uma grande sensação de estilo, o Dontnod apresenta-nos uma aventura gráfica que parece ter copiado imenso dos produtos do Telltale mas consegue algo que estes jamais conseguiram: uma mecânica de jogo que lhe permitirá ostentar uma personalidade distinta. Após um evento que mudará toda a sua vida, Max descobre que pode recuar no tempo e dar um caminho diferente a alguns eventos mais importante. Claro que já todos esperamos que a sua vida social se transforme imenso com este novo poder mas algo mais importante está em causa, existe uma aventura maior aqui. Por muito que o jogo pareça focado no banal quotidiano, existe uma grande carga sobrenatural que será revelada aos poucos.
A partir daqui, a nossa aventura será uma série de conversas com personagens importantes para a vida de Max com consequências no seu futuro. Pelo meio poderemos optar por recuar no tempo e medir melhor o peso das nossas escolhas. O mais interessante é que podemos mesmo ver o desfeche que uma escolha nos dá para depois voltar atrás e ver outro desfecho. Isto poderia tornar tirar importância ao argumento e até banalizar a mecânica mas tal não acontece pois rapidamente iremos perceber que num futuro não tão imediato as nossas acções têm uma consequência.
Ao longo de lindos cenários dotados de uma espantosa iluminação, o Dontnod conseguiu um motor gráfico que vai mesmo espantar alguns jogadores com a sua mistura de real com cartoon. É uma das principais características da sua identidade, os visuais combinados com a música criam uma boa harmonia que ajudam a dar personalidade ao produto. Pena que o motor frequentemente mostre alguns problemas. Na versão PlayStation 4 que joguei, frequentemente o jogo sofria com slowdowns que quebram a nossa imersão daquele mundo. No todo, é um produto cuja componente visual se assemelha a uma aguarela em movimento, belo e fluído, com ocasionais excepções mas que tecnicamente poderia desfrutar de melhorias e optimizações. A sensação que a música foi feita para encaixar na perfeição nos locais e nas acções ajuda imenso a gostarmos do jogo e dá um toque mais especial.
Max é uma adepta da fotografia e como tal, a única alternativa a seguir a história é tentar encontrar todas as fotografias opcionais, coisa que irei fazer assim que acabar de escrever o texto. Pouco mais há a fazer depois de passarmos duas horas a terminar o episódio, apenas isto e esperar pelo segundo que deverá ser lançado em Março. No entretanto, seremos convidados a aprofundar os mistérios de Academia Blackwell em Arcadia jogando novamente e optando por caminhos diferentes nos diálogos ou a tentar ir mais além. Confesso que quando terminei e vi as poucas, mas ainda assim existentes, diferentes acções que poderia ter feito num cenário específico deixou-me com vontade de descobrir como as encontrar, onde me levariam, e qual o seu desfecho.
É irritante que muitas acções não consigam ter um maior impacto no jogador, que não consigam sentir-se com o verdadeiro drama tal como pretendido pelo estúdio e tal deve-se em parte ao estúdio e ao formato do jogo em si. Apesar da agradável mecânica de recuar no tempo e dos diálogos com consequências, a liberdade que poderemos almejar encontrar não existe tanto quanto gostaria. Sentimos que o fio condutor é universal e apenas percorremos ligeiras ramificações cuja importância poderá não ser assim tão grande. Fiquei com a sensação que escolhesse o que escolhesse iria sempre dar ao mesmo local, mesmo que existam pequenas diferenças. Ainda assim, fica a vontade de explorar mais e o gosto de conhecer o mundo de Max. É pequeno mas se conseguirem encaixar nesse cada vez maior quadro de adeptos de aventuras gráficas, em parte graças ao TellTale, vão então deliciar-se com um drama teen com um toque sobrenatural.
O facto que passamos duas horas a viver uma banalidade de situações enquanto nos divertimos é prova que uma boa história contada com a dose necessária de interactividade pode separar o conceito de espectador do de jogador. Não me diverti tanto quanto gostaria a jogar, até porque senti que a grande maioria das situações eram demasiado simples, mas não me importei de ir conhecendo mecânicas de jogo interessantes que poderiam estar mais aprofundadas desde que isso me permitisse continuar a desfrutar da história e daqueles personagens. Os controlos nem sempre foram tão intuitivos quanto gostaria, os personagens ainda se estão a apresentar e as mecânicas não são suficientemente profundas para afastar a sensação de simplicidade mas todo o visual e o mundo em si têm os seus méritos.
No que diz respeito a aventuras gráficas, Life is Strange pode ser simples mas a sua mecânica de recuar no tempo e os seus visuais criam uma personalidade altamente única. É pequeno e apenas é uma parte de cinco, que iremos conhecer aos poucos e cujos mistérios se intensificam. Se conseguirem jogar sem que a momento algum sintam incómodo em situações banais, se conseguirem jogar sempre com sede de mais e vontade de descobrir onde o jogo vos vai conduzir não tenham qualquer problema, é um jogo diferente que vos poderá conquistar. Se não gostam de arriscar naquela linha que separa o espectador do jogador (diferente de pessoa para pessoa) então talvez seja melhor ficar longe. O que interessa é que dentro do que pretende, o Dontnod voltou a criar um produto com o seu cunho apesar de assentar em mecânicas de outros.