Mighty No. 9 - Análise
O jogo de sonho para os fãs de Mega Man?
Até hoje Mighty No. 9 é um dos projectos de videojogos com mais sucesso no Kickstarter. Aproveitando a moda de recorrer ao crowdfunding para financiar jogos, Keiji Inafune apresentou à comunidade o conceito de criar uma sequela espiritual de Mega Man, um dos clássicos da Capcom. Apesar dos pedidos dos fãs, a Capcom não os consolou até hoje com um novo jogo da série (tudo o que houve foi uma compilação dos primeiros seis jogos). Inafune, que participou no desenvolvimento de Mega Man e deixou a Capcom para fundar o seu próprio estúdio, o Comcept, apercebeu-se deste descontentamento e viu potencial em criar um jogo que seguisse as mesmas linhas de Mega Man. Foi assim que surgiu Mighty No. 9.
Quando foi apresentando no Kickstarter, choveu apoio dos fãs, tanto é que no final da campanha o Comcept amealhou mais de $4 milhões, quatro vezes mais do que o valor inicialmente pedido. Os $4 milhões também foram suficientes para alcançar todos os objectivos secundários da equipa, nomeadamente versões para todas as plataformas actuais e vários modos extra. A campanha terminou em Outubro de 2015 e a data de lançamento prevista era Abril de 2015, mas entretanto, várias complicações forçaram o adiamento para Junho de 2016.
Será que a espera valeu a pena e que os fãs de Mega Man finalmente terão algum consolo? A resposta não é assim tão simples. Mighty No.9 aproveita algumas mecânicas de Mega Man e por vezes consegue transmitir a mesma sensação, mas a falta de cuidado na apresentação e uma falta de polimento no geral arrastam-no para baixo. Também não ajuda que o desenho dos níveis seja na maioria das vezes básico. Existem alguns momentos difíceis, mas nunca sentimos que estamos a desfrutar de um jogo de plataformas brilhante, mas antes algo que foi feito para desenrascar.
As mecânicas centrais da jogabilidade são três: saltar, disparar e uma espécie de dash que serve para absorver os inimigos e para fugir aos seus ataques. Os inimigos ficam a piscar depois de lhes acertarem com alguns tiros, e é nesse momento que a absorção se torna possível. Absorverem a energia dos inimigos, chamada Xel, é uma forma de aumentar temporariamente o ataque, defesa e velocidade de Beck, a personagem que controlamos. O jogo está feito para se movimentarem rapidamente e para absorverem mais do que um inimigo de cada vez, deste modo, receberão pontos bónus.
À medida que forem derrotando os bosses, que são nove no total (embora existam doze níveis), Beck pode transformar-se em novas formas que replicam os poderes dos bosses que enfrentaram. Quando chegamos ao último boss, temos poderes eléctricos, poderes de gelo, uma espada e várias outras habilidades. O problema é que a forma como selecionamos estas formas não é amigável. Em vez destas formas aparecerem num círculo, que seria uma forma de selecção mais fácil, aparecem numa lista vertical e cada forma está simbolizada por um ícone. Pior ainda, o jogo não pára enquanto estamos a seleccionar a forma, por isso, trocar a meio de um confronto não é aconselhável.
Estas novas formas de Beck não podem ser usadas de forma ilimitada. Quanto mais ataques fizerem, mais energia vão gastar. Quando a energia acaba, ou trocam para outra forma. ou voltam à forma normal. O conceito de poder trocar de forma já vem dos primeiros Mega Man, mas em Mighty No. 9 podia estar melhor aplicado. Trocar de forma não é uma necessidade para chegarem ao fim do jogo. No nosso caso, apenas trocamos de formar para experimentar os poderes de cada uma, pois concluímos todos os níveis e bosses com a forma normal de Beck. Por outras palavras, a troca de forma acaba por ser inútil. Para que fossem úteis, era preciso que os níveis estivessem construídos de forma diferente. Também era preciso que o jogo tivesse uma estrutura.
Como já referi, Mighty No. 9 tem doze níveis, mas nenhum deles é propriamente uma continuação do anterior. Logo no início vocês podem escolher o nível que quiserem. Se desejarem, podem saltar imediatamente para o boss final. Esta falta de estrutura é acompanhada por uma história pouco desenvolvida com personagens horríveis e terrivelmente animadas. Devido à falta de uma ordem nos níveis, a dificuldade oscila. O boss em que tive mais dificuldade foi no segundo nível, onde no fim nos espera o Mighty No. 1. Este é um boss de fogo que na sua segunda fase adora dar-nos abraços, o que resulta numa morte instantânea. Tirando este, os outros bosses foram acessíveis, e os dois últimos até derrotamos à primeira.
"É um jogo demasiado genérico - basta olhar para os níveis e para as personagens"
Apesar das falhas, Mighty No. 9 faz-nos recordar por vezes o que nos fez gostar de Mega Man. Tanto nos estamos a divertir como de repente só queremos mandar o comando contra a parede. Os níveis têm momentos frustrantes, principalmente devido às mortes instantâneas em algumas secções e à necessidade de começar o nível de novo caso percam todas as vidas. Mas este desafio que surge em certas ocasiões é também o que nos faz gostar de Mighty No. 9. Houve momentos em que estávamos a divertir-nos genuinamente. É uma pena que o desleixo geral da Comcept não permita ao jogo voar mais alto
Além dos doze níveis da história, Mighty No. 9 tem vários modos extra, como corridas online e um modo de desafio, em que têm de completar várias tarefas dentro de um tempo limite. Infelizmente, não podemos jogar com Ray, o boss final, sem comprarmos a Ray Expansion, que é um DLC pago de 4.99 euros. Este DLC adiciona novos níveis e explica melhor a história desta personagem. Não somos contra o conceito de DLCs, mas neste caso, visto que a história de Mighty No. 9 termina abruptamente, fazia sentido que a história de Ray estivesse incluída no jogo base.
Mighty No. 9 prometia ser a resposta às preces dos fãs de Mega Man. Por vezes até consegue replicar a essência do clássico da Capcom, mas em grande parte o sentimento que predomina é desilusão. É um jogo demasiado genérico - basta olhar para os níveis e para as personagens para perceber isto - e com algumas ideias implementadas de uma forma que não funciona em pleno. Não percebemos ao certo o que correu mal na produção. A Comcept tinha mais fundos do que aqueles que tinha pedido e um apoio enorme dos fãs. O jogo até foi adiado várias vezes, e ainda assim, o tempo extra não foi suficiente para corresponder às expectativas.