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Pikmin 4 - A primavera está no ar

Há Pikmins em flor.

Crédito da imagem: Nintendo
Um jogo muito equilibrado, desafiante e gratificante na gestão e estratégia das pequenas e adoráveis criaturas. Sentido único em partir à exploração e encontrar surpresas em todos os recantos das áreas de intervenção e salvamento.

As missões de resgate implicam uma componente de risco. Podem acabar mal sucedidas, agravando os efeitos da tragédia inicial, ou em apoteose e estado de felicidade colectiva. Mas quantas vezes uma missão de resgate, perante a dificuldade do objectivo e do inesperado, não envia também ela um sinal de socorro? Olhar para a mais recente entrada na série Pikmin é tomar nota do quão divertidas - e felizes - as missões de salvamento podem ser, embora o carácter cómico dos envolvidos e a predisposição das pequenas criaturas para um salvamento eficaz não afastem os vários perigos e uma percepção clara da tarefa cimeira, resgatar o capitão Olimar de um planeta hostil, habitado por criaturas predadoras.

Podendo ser catalogado como RTS (um jogo de estratégia em tempo real), no comando e gestão das pequenas e fiéis criaturas, Pikmin envolve também uma grande componente de exploração e aventura num planeta distante, o PNF-404. O destino de Olimar, perdido naquele planeta mas capaz de estabelecer uma ligação salvadora e quase umbilical com Pikmins, bem como com Moss, é o mesmo da missão capitaneada por Erma Shepherd (da S.S. Shepherd), enviada em salvamento do intrépido herói, padecendo do mesmo desfecho, ao ser puxada de tal modo por uma força misteriosa do planeta que a tripulação é separada quando se dá o contacto com o solo.

A construção da narrativa é interessante pela forma como cruza o destino de Olimar com o da tripulação enviada em seu encalço. A sequência inicial do jogo corresponde a uma derradeira tentativa de fuga do planeta por parte de Olimar, que não corre tão bem. É como um “tutorial”, uma porção de jogo num ambiente acolhedor e humano, no interior de uma habitação, divisão partilhada entre cozinha e sala, repleta de objectos de uso quotidano, entre os quais um televisor e fotografias, mas de grande proporção face ao tamanho diminuto das personagens controláveis, à qual não faltam as criaturas predadoras, à espera de uma hesitação para abocanhar e comer uns quantos Pikmin, o pitéu do dia.

O resgate do capitão Olimar

Nesse segmento é introduzida uma peculiar criatura chamada Moss, algo similar a um cão e que depois se vem a saber integra os chamados salvacães. É deveras útil ao permitir que o herói Olimar suba ao dorso enquanto os Pikmin se alojam no pêlo. Há toda uma vertente de estratégia em enfrentar e lutar contra as criaturas que por ali deambulam a partir daquele “sistema”, umas mais ferozes que outras, por vezes protegidas com escudos e cujos pontos vulneráveis só em certos momentos ficam expostos.

Otchin a princípio não consegue entrar na água mas basta um treino para poder começar a nadar.

Também existe uma grande fase dedicada à exploração e descoberta destas grandes áreas, que não sendo incomensuráveis, oferecem diversas camadas, com pontos de interligação que facilitam a deslocação e outras zonas que ficam acessíveis por intermédio de ventoinhas ou rampas. É no cruzamento da estratégia dos combates e puzzles com os avanços em forma de exploração e aventura, que Pikmin 4 sustenta um ritmo bastante aprazível. Funciona bem em missões de curtos períodos, no exterior, mas também as há mais prolongadas e por vários níveis dentro das cavernas, onde se alojam mais perigos e puzzles por intermédio da sua estrutura labiríntica, a lembrar as masmorras de um Zelda.

Termos como “salvacão” ou mesmo Otchin, o salvacão de duas patas que é descoberto pelo astronauta, personalizado à medida num editor, são alguns exemplos de uma muito eficaz e cómica tradução para português. Como estes astronautas são provenientes de outro planeta a sua linguagem vocal é imperceptível. Em texto não só é uma mais valia para um público juvenil como os adultos ficam expostos a termos cómicos e algumas expressões curiosas. Não que a conversa seja grande. Felizmente, a Nintendo segue aqui os pergaminhos de muitos dos seus jogos vocacionados para a jogabilidade e só no fim de um dia de exploração é que os astronautas da aeronave conversam entre si, ou então quando são resgatados sobreviventes, os denominados “folhanos”. Quase todo o tempo de uma missão é passado a efectuar operações.

E o resgate dos sobreviventes

Pikmin 4 está longe de ser o jogo que visa só o resgate do capitão Olimar. Em primeiro lugar, o herói de serviço começa por descobrir os restantes elementos da tripulação Shepherd, com a ajuda de Otchin, o seu fiel salvacão, e dos Pikmin. A demonstração de Pikmin 4 é o prelúdio perfeito desse desiderato. Ao resgate de Olimar e da tripulação acresce a reparação do radar e motores da aeronave, capaz de levar os tripulantes até novas áreas de exploração onde numa delas provém o último sinal dado pela aeronave de Olimar. Há muita matéria prima a recolher, pequenos cristais, assim como imensos sobreviventes. Estas são algumas das missões principais.

Os bosses são desafiantes e quase sempre estão alojados nas cavernas.

Os sobreviventes são na maioria astronautas intrépidos que por motivações várias arriscaram a sua sorte naquele planeta. Há um que procura tesouros, outra é uma influencer e até uma turma de estudantes de ciências foi lá parar à custa de uma imensa curiosidade. À medida que são resgatados integram o centro de comando. Os folhanos esperam por uma cura que só o médico da tripulação lhes pode ministrar, ficando a saber a verdadeira identidade. Estes sobreviventes tendem a oferecer imensas missões secundárias mas ainda mais importante para o progresso na narrativa é a recuperação da tripulação.

Entre os seus membros está o médico e com ele a cura dos “folhanos”. O antídito é uma espécie de seiva obtida em expedições nocturnas, nuns casulos. É produzida por Pikmins que emitem um verde flurescente, como pirilampos. Estas missões nocturnas funcionam como uma defesa da torre. Já se sabe que as criaturas inimigas, em Pikmin, ficam ainda mais agressivas com a escuridão. A melhor forma de obter o antídoto é conservar os casulos intactos até ao amanhecer, vencendo os predadores que avançam na sua direcção enquanto o breu cobre toda área. A quantidade de Pikmins na tarefa defensiva aumenta assim que são recolhidas estrelas pouco antes do pôr-do-sol. Unidos lançam um feroz ataque, como uma bola verde luminosa que verte sobre a criatura as dezenas de Pikmins, até a desfazer. Estas missões nocturas oferecem dificuldade variável, mas as mais difíceis quando concluídas com sucesso oferecem mais unidades do antídoto, o que é essencial para recuperar a saúde e identidade dos muitos folhanos encontrados nas missões diurnas e em cavernas.

Otchin para salvamento e engenhocas para mais defesa e habilidades

O cenário onde está instalado o posto de comando funciona como “hub” de acesso às grandes àreas do jogo. Também ali os membros da tripulação realizam funções específicas. Para lá do médico, há a treinadora Shepherd, Collin e o cientista que oferece todo um manancial de engenhocas a usar em combate e exploração de tesouros. O treino de Otchin é essencial e assenta em várias versões já que esta criatura funciona como auxiliar da personagem principal, e pode ser controlado de forma separada, tendo mesmo o seu apito com que reúne os Pikmin. As animações obtidas ao longo dos dias de exploração podem ser trocadas por vários melhoramentos, desde capacidade de transporte para objectos pesados, mordeduras, resistência a danos e escavação. O seu faro até pode ser usado para descobrir sobreviventes.

Nas expedições nocturnas as criaturas ficam mais agressivas. A missão obedece ao estilo defesa da torre. Otchin pode ser destacado para proteger um dos casulos.

As peças do laboratório são trocadas pela matéria prima, os tais cristais valiosos, dispersos pelas áreas exteriores e pelas cavernas. Há toda uma variedade de importantes utensílios que reforçam a defesa das personagens e melhoram as habilidades, como o radar capaz de chamar Pikmins distantes e que se encontrem inactivos, o aparelho que serve de guia de tesouros, equipmamento resistente às altas temperaturas, botas de que fixam a personagem ao solo, etc. A aquisição deste equipamento é vital. Não é bem um role play, é uma via que garante algum equilíbrio face aos adversários e inimigos mais poderosos que vagueiam pelas áreas.

Central no esforço de exploração e combate é toda a dimensão estratégica, com a variedade de Pikmins já conhecidos, havendo-os fortes em fogo (vermelhos), água (azuis), gelo (translúcidos), electricidade (amarelos), resistência ao veneno (brancos), força (roxos), pedra (pretos). Todos distinguidos por cores e até nos seus traços, como o aspecto laminado dos Pikmin negros e gelados. A presença de Otchin reformula a jogabilidade e torna-a mais rápida, pois o reforço dos seus poderes permite usá-lo como elemento ofensivo e ao mesmo tempo capaz de transportar coisas mais pesadas, um aspecto primordial na divisão de tarefas. No limite das suas capacidades pode abraçar a força de 100 Pikmin, o que liberta os Pikmin para outras tarefas, algo essencial na luta contra o relógio. Dá todo um gozo gerir os ataques Pikmin e Otchin, e a apanha de coisas dispersas pelas áreas que podem ser transportadas para a aeronave a fim de proporcionar um produto necessário ao funcionamento desta.

O desafio das provas dandori

Se as superfícies das áreas oferecem uma boa dose de exploração e desafio, com muitas criaturas a surgirem inesperadamente, é nas cavernas que é mais patente e desafiante a gestão, especialmente através dos desafios “dandori”, muitas vezes organizados pelos folhanos. Podem assumir a forma de um desafio directo, no qual os folhanos controlam Moss (o outro salvacão) e os seus Pikmin, em luta na mesma área, para ver quem atinge melhor pontuação. Outras vezes os desafios “dandori” consistem numa luta contra o tempo, até se atingir um mínimo de pontuação elegível para dar por terminado o nível. Outras cavernas funcionam por várias etapas ou camadas até à “boss battle”, que os há bem divertidos. O resultado é uma grande variedade de desafios, sobretudo se o objectivo passar por coleccionar todos os tesouros e fazer todas as séries de objectos descobertos. Há um incentivo ao coleccionismo e a recolher tudo o que for possível para uma melhor pontuação, ao mesmo tempo que se resgatam sobreviventes.

Os objectos encontrados nas áreas exteriores (e interiores) servem de purpurínio, substância útil ao funcionamento da aeronave da tripulação.

É normal que no decurso de muitas batalhas inesperadas e perante alguns imprevistos resultantes da dificuldade em segurar os Pikmin ao redor de criaturas inimigas, muitos deles pereçam em combate. Para corrigir alguns erros de cálculo há a possibilidade de retroceder alguns minutos ou simplesmente recomeçar o nível. A opção está lá. Mas ainda há um grau ulterior de ajuda. Se a complexidade de um desafio dandori for demasiada, um astronauta comandado pelo computador termina o nível embora sem a recperação dos tesouros. Posteriormente esse desafio pode ser completado a partir do contacto com um dos sobreviventes que também organiza as provas dandori.

Do ponto de vista dos visuauis, com um reforço nos ambientes naturais e pequenos recantos deliciosos, como os corais e a deliciosa praia banhada a luz solar, com a sua baixa-mar a partir do meio dia abrindo novos caminhos e acessos até áreas anteriormente cobertas de água, é belíssimo percorrer o terraço, o recreio e uma espécie de churrasqueira. Destacam-se os pormenores das plantas, os efeitos da luz à passagem do tempo, as criaturas e os objectos que adornam e tornam credível cada palmo de terra, por onde se fazem trilhos que os Pikmin atravessam estoicamente, por entre sonoridades e camadas de luz. Ver o esforço dos Pikmin, vocal, quando já floridos e mais fortes depois de absorvido o nectar, ou então as suas entoações musicais, é bem revelador da atenção dada aos detalhes. Nas suas missões acabam a locupletar tudo, capaz de ser transformado em purpuríneo, uma substância imprescindível para a reparação da aeronave.

Com várias missões principais e dezenas de missões secundárias, embora seja possível completar o jogo ao resgatar o capitão Olimar, num “plot twist” interessante de seguir, a aventura não se fica por umas 26 horas de jogo dentro desse objectivo. Ao tempo da análise estão contabilizadas acima de 33 horas de jogo, visando outras missões principais. Os desafios dandori, como integrantes da experiência de jogo e reveladores da capacidade de gerir as pequenas criaturas num curto espaço de tempo, funcionam também como adicional à aventura, numa luta contra o computador, em modo cooperativo contra o computador ou ecrã dividido numa partida para dois jogadores.

Talvez seja este o jogo mais acessível da série, o que não significa mais fácil. Pelo contrário, o jogo apresenta desafios crescentes e bem árduos que apelam à melhor gestão e capacidade de operar com todos os elementos de jogo, o que por vezes é complicado e obriga a repetir ou recomeçar o nível. Mas obter tudo a 100% é um objectivo que é difícil de demover, por ser desafiante sem se tornar frustrante ou mesmo extenuante. O ritmo do jogo é elevado e constante em desafios, com poucos momentos mortos, sem diálogos intrusivos ou secantes. É um jogo directo e intenso nas missões, capaz de lembrar a catadupa de eventos e desafios de um Mario Galaxy, por exemplo. E ao mesmo tempo é delicioso na arte, numa esfera muito planetária e ao mesmo tempo humana e realista, e também detentor de uma física apreciável, embora aqui e acolá com algumas quebras de frame rate, que felizmente pouco ou nada afectam a jogabilidade. Há quase uma comoção quando deixamos para trás estas criaturas, tão imprescindíveis nas múltiplas missões de resgate, mas é possível voltar ao PNF-404, com o salvacão Otchin, para mais umas missões dandori, nas quais a organização e eficiência são essenciais para o sucesso. É bom quando um jogo exala também uma mensagem.

Prós: Contras:
  • Plot narrativo
  • Conjugação de mecânicas com Otchin
  • Incursões nocturnas
  • Desafios dandori apuram a gestão e estratégia
  • Realismo nas áreas
  • Variedade de objectos intrigantes
  • Traduzido para português
  • Desafiante e equilibrado
  • Bom ritmo
  • Tutorial aprazível
  • Pontuais quebras de frame rate

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