Raiden V Director's Cut - Análise
Regresso do "scorer".
Os "shmups" foram durante décadas predominantes na cena arcade japonesa. O estatuto de culto que encontraram no Japão, ao longo de décadas, não teve paralelo no resto do mundo, apesar das múltiplas conversões para consolas, enviadas para o ocidente, uma tentativa de dar a conhecer ao mundo um género muito específico, que a dada altura ganhou ramificações e encontrou nos "bullet hell" um segmento marcado por um incremento de dificuldade. Se hoje as arcadas não são tão dominantes e até se encontram em declínio, a verdade é que estes sistemas não desapareceram e apesar de chegarem novidades em menor número, os tradicionais salões de jogos não deverão acabar tão cedo.
O mesmo sucede com os "shmups", cuja produção é hoje reduzida mas nem por isso relegada para o esquecimento. Das poucas séries com mais peso no género que ainda se mantêm no activo, é impossível ignorar o recente trabalho da Moss, em Raiden V. Publicado em 2016 no Japão e depois para todo o mundo para a Xbox One, este ano é a vez da PlayStation 4 e do PC/Steam receberem esta preciosidade. Depois do lançamento no Japão, em Setembro, cabe à PQube lançar Raiden V nesta versão que agora analisamos pelo nome Director's Cut, na Europa.
Sendo particularmente sentidas as ausências dos míticos R-Type, Gradius, Blazing Star, entre muitas outros, aplaude-se o regresso de Raiden, uma das séries históricas com percurso nas arcadas e que vale para os fãs do género algumas das melhores memórias. Apesar das diferenças que separam esta quinta iteração dos primeiros títulos, é justo dizer que o legado permanece, assim como o corpo da série e boa parte do gameplay. A diferença é que agora é um jogo pensado para as consolas e não para ser jogado nos salões, o que se percebe pela substituição das tradicionais vidas (obtidas pela inserção de moedas que garantiam créditos adicionais) por um escudo que resiste aos danos. Quando a energia do escudo acaba a máquina desintegra-se e acontece o "game over". Podem continuar mas o contador da pontuação entra em modo "reset".
Para começar terão de escolher um nível de dificuldade, de entre 6, sendo que os mais experimentados deverão começar pelo menos no normal e subirem à medida que se sentirem confortáveis nas manobras ofensivas. Existem três naves para seleccionar, todas com diferentes valências em termos de poder de fogo, velocidade e transporte de armas. Por norma opto pela mais equilibrada ou modelo base, mas há depois uma série de vantagens a retirar das outras se tirarmos proveito de uma jogabilidade mais rápida ou baseada num número suplementar de munições.
Por fim, a escolha das armas não é menos importante e aqui é-nos dada uma margem muito significativa de escolha, o que equivale a um peso estratégico. Existem três armas: a vulcan, laser e plasma. Não é possível mudar de arma enquanto combatem, só mudam de arma se agarrarem um cristal que regularmente é libertado pelos inimigos atingidos. É opcional apanhar esse cristal e se não dispararem durante algum tempo, ele muda de cor temporariamente, o que vos deixa seleccionar determinado equipamento (vermelho para o vulcan, azul para o laser e rosa para o plasma).
Este equipamento corresponde a três modelos distintos de poder de fogo, o que na prática equivale a nove versões. Por exemplo, na opção laser podem optar por concentrar danos somente num inimigo, com um raio mais poderoso, optar por outra versão que liberta (depois de um tempo de carregamento) um bloco largo, e uma derradeira versão que atira um cristal para a frente que propaga os raios como um cristal sob um foco luminoso. Esta selecção é feita inicialmente, podendo até escolher a arma com a qual pretendem começar o combate, mas os seus efeitos são importantes a longo prazo.
Há neste sistema suficiente variedade para criar um poder de fogo mais rápido e neutralizador das ameaças. A melhor parte disto é que estas armas evoluem à medida que rebentamos com as naves inimigas de forma consecutiva. Mais gemas operam uma mudança necessária para alterar o equipamento e subir de nível, através de um ranking capaz de comprimir 10 níveis. Se abaterem inimigos de forma constante, sem sofrer danos ou conceder grandes intervalos, um medidor regista esse incremento. Num dado momento sobe de nível e a arma melhora. Todas as armas são passíveis de evolução até ao nível 10, sendo conveniente mudar de equipamento de forma regular.
De resto permanece a jogabilidade tipo Raiden. Cada inimigo abatido liberta uma medalha, o que aumenta o "score", mas esse score pode ser ampliado se recolherem as medalhas. Nalguns casos podem rebentar mais de 10 naves adversárias ao mesmo tempo, libertando assim 10 medalhas, sendo conveniente fazer uma pausa cirúrgica no disparo para que as medalhas sejam atraídas para a vossa nave de forma automática. E depois voltam a premir o gatilho. Através deste modelo a jogabilidade é muito rápida e frenética, com imensos objectos no ecrã ao mesmo tempo, sem o mínimo abrandamento.
É notável o trabalho da Moss em termos de performance, logrando uma experiência muito fluida e sem o mínimo abrandamento ou quebra de frame rate. O que acontece é que os cenários 3D não são tão elaborados ou vistosos como nos primeiros jogos da série, cujo 2D é muito bonito e uma delícia para os olhos. Neste caso, são as máquinas, os tanques e as aeronaves militares inimigas, especialmente os "bosses" que se apresentam com melhor aspecto e num conjunto muito diversificado. A jogabilidade permanece assim como um dos pontos altos desta quinta edição e é por ela que continuamos.
Como dissemos atrás, não existem créditos ou vidas, apenas um escudo que vai perdendo energia à medida que a nave é atingida. Finda essa energia acontece o "gameover". Nos momentos de maior aflição, especialmente nas "boss fights", podem lançar bombas, um bom método para limpar temporariamente o vosso raio de acção de qualquer ameaça, mas a pontuação não é tão grande no final do nível (são dados pontos se chegarem ao final com bombas em stock). Claro que há pequenos bónus que aumentam a pontuação, desde logo pequenos ícones a gravitar em certas zonas, mas tenham atenção às balas inimigas.
A outra alternativa às bombas é o sistema "cheer", uma novidade em Raiden V, que se mantém naturalmente em Director's Cut. O sistema processa-se através de uma leitura levada a cabo pelos servidores que seguem a progressão dos jogadores. Ao começarem o jogo há uma conexão online. Assim, os jogadores que cumprirem determinados objectivos, alcançando pontos num número predeterminado, enviam um "cheer" para outro, que por seu turno vê a respectiva barra de apoio ganhar mais energia. Quando estiver próxima do pleno (a partir de 1/3) podem activar o seu poder e colocar no mapa uma nave adicional capaz de desferir uma rajada de balas e fogo de artifício sobre os rivais. No fundo estes ataques especiais são motivados pelos utilizadores que contribuíram com o seu melhor gameplay. No final da partida podem observar quais os jogadores que vos enviaram "cheers" e também para quem tiveram a oportunidade de enviar. Este mecanismo opera de forma automática. Na prática é uma boa adição e confere um ataque especial para os momentos de maior dificuldade, potenciado o "score".
Outra nota para as áreas de jogo, num total de oito, com algumas opcionais e muitas boss fights. Existem várias configurações para um mesmo nível (de A a D), em conformidade com alguns critérios como os inimigos neutralizados, o tempo gasto, etc. No fundo são caminhos alternativos para se atingir o final, com destaque para alguns níveis adicionais desta Director's Cut. O jogo pode ser desfrutado através de dois modos: modo história e "boss mission". Enquanto que o primeiro se inscreve na passagem pelos vários níveis, na segunda opção enfrentam apenas os rivais de maior peso, a contar para uma tabela de liderança. Estas existem tanto para o online como a nível local.
A pior parte da história vai para as poucas cut-scenes. Ao início esta é apresentada sob a forma e um diálogo sobre uma imagem de arte, o que é uma apresentação pouco digna e nos afasta até de seguir os acontecimentos. Durante as batalhas há uma caixa que mostra em texto as conversas que ouvimos em directo, sendo que o acrescento das vozes é um exclusivo deste Director's Cut. Por último, é impossível não mencionar a trilha sonora, absolutamente fenomenal e outro dos pontos altos deste "shmup". Neste capítulo levou uma grande mudança, depois da troca de Go Sato por Yoshimi Kudo (Deathsmiles II, Caladrius e Muramasa: The Demon Blade), somos introduzidos a um ritmo hard rock com riffs de guitarra e teclas de piano, uma combinação sempre presente e ao mesmo tempo capaz de sublinhar perfeitamente os momentos de maior intensidade.
Resumindo, Raiden V Director's Cut é uma experiência completamente recomendada para fãs de "shmups". Os seus lançamentos são cada vez mais esparsos, mas quando nos chegam e provêm de companhias nipónicas como é o caso da Moss (mais imbuída no espírito da série Raiden), raramente desapontam. O saber ainda lá está e a verdade é que apesar de faltar uma melhor condução no tocante à organização da história, no essencial que é a jogabilidade, não defrauda. Sim, é um jogo um tanto diferente dos originais e pode haver quem sinta nisso um desvio, mas há lógica nesta evolução, neste caminhar para diante e nesta devolução de um género que permanece neste Director's Cut tão atractivo como dantes. Quando nos embrenhamos num "score attack" pela melhor pontuação, depressa percebemos como a actual produção revela um cuidado no desenvolvimento. A apresentação é muito eficaz, com informações detalhadas sobre a evolução, ainda que não contemple tantas opções como é habitual acontecer nos trabalhos da M2. No entanto, Raiden V está à altura dos melhores da série. Venham mais.