Retro Machina - Review - Triunfo das máquinas
Sobre as ruínas da humanidade.
Chega-nos do Brasil, mais especificamente de São Paulo, esta jornada de acção e aventura em formato role play, produzida pela Orbit Studio, uma produtora que desde 2016 produz para o mobile, consolas e PC. Retro Machina é uma aventura apenas para um jogador, focada na exploração e realização de puzzles e combate. É por isso um jogo bastante multifacetado, de alguma simplicidade até na forma como introduz e expõe as mecânicas, funcionando quase sempre entre o satisfatório e o agradável, especialmente pela construção dos puzzles. Porém, não é um jogo gigantesco, avassalador ou sequer revolucionário na determinação de algum género. Nem requer uma dezena de horas até dar por encontrado o termo do jogo. Antes das dez horas já terão chegado ao desafio derradeiro, depois de uma demanda aprazível.
O que aqui se evoca, em termos narrativos, é o chamado futuro distópico, de inspiração orwelliana, com o seu romance 1984. Desta vez, contudo, a humanidade desapareceu, deixando rasto nas produções robóticas que suscitam a curiosidade de um aparelho revoltoso. Após uma evasão bem sucedida de uma espécie de "dome", onde labutava afincadamente, numa extenuante linha de produção, vê-se de repente numa demanda solitária, de busca pela vida inteligente e da sua própria reparação. Esta criatura de tamanho diminuto, capaz de percorrer longos períodos sem carregar baterias, dispõe apenas de uma grande chave de parafusos, que pode usar como bastão para interagir com os elementos do cenário.
O imprescindível controlo remoto
Relegado literalmente para uma sucata, este intrépido robô é um exímio "hacker", capaz de tomar controlo de outros semelhantes seus. Boa parte destas criaturas formam um exército, que avança no seu encalço. Mas ele parece usar mais os cabos no seu interior a fim de encontrar a melhor solução, ligando os circuitos e estabelecendo redes de ligação, abrindo portas a fim de passar por zonas muito bem patrulhadas. Grande parte da nossa actividade redunda em confrontos direitos e em actividades do tipo espionagem. O único reparo que tenho que apontar, logo de início, é o tamanho muito limitado da nossa personagem. Jogar num ecrã como o da Switch pode ser um bocadinho problemático quando entramos numa zona de maior aglomeração de objectos a renderizar, ao ponto de quase perdermos o nosso herói.
O mesmo acontece com as caixas de diálogo, por onde são mostradas informações relevantes sobre a nossa progressão. O tamanho das letras é bastante reduzido e não raras vezes me vi perante a necessidade de quase encostar a consola aos olhos. Na versão PS4, que também experimentamos, ainda que possamos recorrer a um televisor de maiores dimensões, o problema não deixa de se fazer sentir. Se nos situarmos a uns bons metros do televisor, teremos dificuldades em ler facilmente as caixas de diálogo.
Isto é um ponto importante, porque à medida que avançamos, descobrimos novos dados sobre o passado. Percebemos que num momento algures no passado, as máquinas comandaram uma revolta contra os humanos e acabaram por sair bem sucedidas. Há despojos, casas abandonadas e um feixe de destruição que se estende pelos múltiplos mapas do jogo. O grafismo é interessante, especialmente com relevo para a arte déco, com laivos do que vimos em Bioshock, outro universo distópico, nas profundezas do mar (na versão original e a minha favorita). Há aproximações a Fallout, especialmente pela perspectiva isométrica, tão típica nos jogos de role play ocidentais dos anos noventa. No entanto, a principal inspiração deste mundo retro futurista é mesmo Jacque Fresco, criador do Venus Project, entre muitas outras criações futuristas.
Combate, puzzles e exploração
Isto traduz-se numa grande variedade de terrenos e áreas, as "biomes", com a sua fauna e flora. Sem que, por vezes, no entanto, haja alguma dificuldade em reconhecer as áreas, especialmente quando somos forçados a voltar atrás, a um ponto já identificado a fim de resolver um puzzle mais adiante. Nem sempre mas acontece perdermo-nos, ainda que possamos recorrer a um pequeno mapa para uma melhor percepção do posicionamento. Ainda que haja um grau de detalhe significativo e a arte funcione na maior definição do ambiente, não deixamos de constatar que algumas zonas partilham muitos pontos semelhantes, como reproduções umas das outras. Há secções com diferentes temas e vistas, com fundos bem trabalhados.
O combate, a exploração e os puzzles constituem as principais mecânicas. Há diferentes habilidades a resgatar, consoante a evolução da personagem, em termos de confronto directo. O pequeno robô é capaz de se esquivar num lançamento rápido e cirúrgico, escapando a raios laser e outros ataques de andróides que vagueiam à nossa procura. As criaturas abundam, proporcionam diferentes esquemas de ataque e quase sempre nos forçam a encontrar o ponto fraco. De resto, a resistência não é muito forte. O único problema é mesmo o "timming" das evasões, que pode ser problemático e nalguns momentos entre as batalhas revelar-se demasiado frustrante. Claro que o reforço das habilidades ajuda e por isso a exploração das áreas, carregando os núcleos da nossa personagem, é importante.
Puzzles que se repetem são aqueles que nos levam a mudar de plataforma ou desbloquear algum acesso, usando para tal os robôs como personagens secundárias susceptíveis de controlo remoto. A ideia é simples mas é extremamente repetida ao ponto da fórmula nos causar mais dificuldade quando há múltiplos pontos a tocar em simultâneo, e os andróides das redondezas actuam contra nós. É em tais momentos de aperto que sentimos maior dificuldade mas também um sentido de repetição. Há gradações e camadas sucessivas de dificuldade nessa exploração. Explorando a fundo os cenários, encontramos computadores e bancas onde podemos levar a cabo certos upgrades, usando os metais adquiridos como moeda de troca.
Não podemos dizer que sejam únicos os caminhos que nos levam a Retro Machina. A conjugação de exploração com acção e puzzles é interessante e bastante efectiva, só que parece faltar aqui aquele toque distintivo marcado por uma melhor coesão em termos de narrativa e definição do mundo. Nem todos os puzzles contribuem para tornar o progresso misterioso e também se verifica que muito do potencial proporcionado pela narrativa fica por concretizar. A dada altura jogamos para avançar e passar à fase seguinte, sentimo-nos quase como a personagem principal na linha de montagem, a completar puzzle atrás de puzzle. Há momentos interessantes e não é de todo uma experiência com graves problemas. Fica um bom sinal da Orbit Studio para um futuro seguramente mais risonho.
Prós: | Contras: |
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