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Scott Pilgrim vs The World: The Game Complete Edition - Luta contra o diabo

Inspirado na banda desenhada e desenvolvido ao bom estilo arcade.

Eurogamer.pt - Recomendado crachá
Nada de muito complexo ou profundo neste "beat em up", mas todos os elementos funcionam bem e destacam-se. Um regresso de aplaudir

Em 2010, o nosso antigo comparsa e colaborador Ricardo Madeira, escreveu na sua análise a Scott Pilgrim vs The World, o seguinte: "chegou e venceu". De facto, enquanto culminar de uma adaptação a videojogo de um "comic" e filme de culto, e ao contrário de muitas adaptações a videojogos que se estatelam ao comprido, este "brawler" de visuais retro e inspirado no gameplay das arcadas, a puxar à memória célebres jogos como Double Dragon, River City Ransom e até Streets of Rage, é quase tudo aquilo que um fã das arcadas pode esperar. Da minha parte confesso que desconheço a película cinematográfica e até mesmo os comics, embora ao experimentar mais de dez anos depois esta versão completa, tenha suscitado a curiosidade em descobrir o universo Scott Pilgrim.

Mas se há algo que dou por adquirido neste tempo que tenho passado a descobrir os meandros desta versão definitiva é que o jogo para além de uma magnífica identidade e imagem que transparece num grafismo capaz de dar cabal seguimento aos desenhos e projectar belíssimas animações, é a de uma grande solidez em termos de jogabilidade e desafio, ainda que não estejamos diante de um jogo muito comprido ou trabalhado com aquele grau de minúcia como descobrimos recentemente em Streets of Rage 4. Porém, é seguramente uma das experiências do tipo retro mais revigorantes que tive a oportunidade de jogar nos últimos tempos.

Qual a razão, no entanto, para voltarmos a jogar o mesmo jogo de 2010, com os DLC's, que no fundo servem de suporte ao subtítulo "versão completa"? Desde logo porque em 2014, sem que tenham sido avançadas justificações claras para tal, o jogo foi removido das plataformas digitais (Store e Xbox Live). Talvez por uma questão de licenciamento, a verdade é que foi um tempo de espera até os criadores do filme e das tiras desenhadas insistirem com a Ubisoft, por ocasião dos dez anos do lançamento, numa versão completa para as novas consolas. Quem como eu não teve oportunidade de jogar Scott Pilgrim pode fazê-lo agora numa PS4, Xbox One e Nintendo Switch. A versão que aqui testamos corresponde à consola da Microsoft e está carregada de extras.

Cada personagem pode subir até 16 níveis, o que confere a plenitude de poderes ofensivos e defensivos

Uma demanda arriscada

Com uma narrativa centrada num protagonista na casa dos vinte e poucos anos que dá nome ao jogo, e ao mesmo tempo é baixista, membro de uma banda rock e que serve-se dos próprios punhos para abrir caminho entre rufias e bandidos ligados a sete (sim, sete!) ex-namorados de Ramona Flowers. No fundo eles são os "bosses" que Pilgrim terá que derrotar de forma a poder conquistar o coração da sua amada. É uma aventura e pêras, deveras peculiar e que parte da cidade fria de Toronto para formar um epicentro a partir de um mapa que devolve à memória o mapa mundo de Super Mario Bros. 3, só para citar um dos jogos que serve de inspiração. Na realidade há outros jogos que os criadores levaram em conta, desde Guitar Hero a River City Ransom.

Apresentados como "bosses", a cada ex-namorado corresponde um nível, perfazendo sete, sendo que estes são suficientemente longos para nos manterem ocupados por algumas horas, especialmente se jogarem em dificuldades mais elevadas. Não há nada de muito complexo quer na construção dos níveis e personagens em 2D, nem nas mecânicas. Estamos diante de um jogo que se apresenta como produto de uma inspiração retro, ainda que beba muita influência da banda desenhada e até do filme tipo "indie".

Com uma estética que facilmente nos lembra jogos da cena 8 e 16 bit, podemos até trazer um Comix Zone à baila, porque esse também é um jogo de acção, mas cuja particularidade é decorrer dentro de um livro, dentro das vinhetas como se fosse um desenho animado vivo. No caso de Pilgrim o afastamento é significativo, há um maior desprendimento dos desenhos e maior profusão do ponto de vista artístico e conceptual em 2D, com cenários bastante modelados, cores muito contrastantes, excelentes animações e um enfoque muito grande na acção, sobretudo nos combos que vão sendo desbloqueados à medida que a personagem seleccionada sobe de nível.

O estilo pixel art é inconfundível e convincente, mas ao mesmo tempo fiel à banda desenhada.

Jogabilidade apurada e amplo conteúdo

As diferentes zonas urbanas correspondentes aos sete níveis resultam de um cuidadoso exame da banda desenhada e por isso podemos contar com uma tentadora Toronto, numa feliz conjugação de elementos de fantasia com o realismo dos desenhos. Mas nem só de luta nas ruas se faz esta incursão. Há espaços fechados e interiores, claramente influenciados por filmes e séries, assim como jogos (Guitar Hero). Rapidamente nos apercebemos destas influências e por isso o jogo torna-se também num mostruário de diversas influências da cultura pop.

Do ponto de vista das mecânicas, nada de muito complexo a considerar. De início podemos escolher uma de quatro personagens, cada uma com os seus golpes. Estes dividem-se em categorias base e socos fortes, protecção, ataque especial e assistência. Há variedade suficiente para começarmos a jogar, mas o processo fica mais interessante à medida que sobem de nível adquirindo mais experiência. Ao subirem de nível adquirem mais combos que podem ser usados para atacar ou defender dos ataques rivais. Considerando as quatro personagens e a personagem adicional muito há para desbloquear, o que confere bastante variedade em termos de golpes e não apenas um determinado tipo de golpes. Além disso, podem usar elementos deixados nas ruas como bastões ou mesmo latas do lixo para arremessar aos rivais.

As moedas são uma importante parte da recolha de objectos pois é com elas que poderão adquirir alguns itens em lojas acessíveis em determinadas partes do jogo e assim melhorar os atributos das personagens. Em suma, um sistema de combate e evolução sem grande complexidade mas bastante sólido em termos de execução, nomeadamente no combate, com uma interacção plena. Claro que os diferentes níveis de dificuldade operam aqui um significado na duração e até no divertimento que extraímos, sendo recomendável começarem por jogar no nível intermédio.

Multiplayer reforça a dimensão cooperativa e competitiva, até quatro jogadores.

Uma vez completa a campanha que não levará mais de uma mão cheia de horas a concluir, é tempo de passar ao conteúdo suplementar. Neste caso, considerando que esta versão agrega todos os DLC's lançados após o original, há muito para desfrutar, a começar pelo modo cooperativo online, ainda que neste âmbito os jogadores (até quatro, também via local) tenham que registar contas online na Ubisoft e um sistema de admissibilidade online na consola em que estejam a jogar. Diferentes modos podem ser desbloqueados depois de terminada a campanha, enfrentando vagas de zombies ou participando numa prova tipo dodgeball, ou simplesmente num Battle Royale onde podemos fazer equipas entre os quatro, via competitiva e cooperativa. Tendo em conta a globalidade do conteúdo, há bem mais para competir para lá da campanha, o que aumenta a jogabilidade e reforça a componente multiplayer. Mas frisamos, esta é uma experiência exclusivamente digital e só haverá uma edição em suporte físico, cortesia da Limited Run, uma habitual neste tipo de entregas.

Ver no Youtube

Em resumo, Scott Pilgrim é um "beat em up" 2D que presta tributo à banda desenhada e a um conjunto de referências da indústria dos jogos, da TV e até do cinema, e que se apresenta com a simplicidade das experiências arcade do tipo retro 8 e 16 bit. Mas dentro deste quadro de aparente simplicidade está um jogo bastante completo, com uma pixel art memorável e adorável, e ainda uma banda sonora que tão depressa não nos foge da mente. Diria mesmo que é uma daquelas combinações cada vez mais raras de encontrar. Pode não ser tão bom em termos de gameplay como um Streets of Rage 4 mas é seguramente uma experiência que cumpre bem em todos os seus elementos. Se não o jogaram anteriormente e o estilo retro, tanto visual como jogável faz parte das vossas preferências, eis aqui uma óptima oportunidade.

Prós: Contras:
  • Arte pixel irrepreensível
  • Sistema de combate intenso e gratificante
  • Reflecte a banda desenhada e muitos elementos da cultura pop televisiva e do cinema
  • Conteúdo reforçado
  • Componente multiplayer cooperativa e competitiva
  • Banda sonora contagiante
  • Não se assinalam melhorias gráficas
  • Deslocação da personagem prende em certos momentos de maior acção.

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