SteamWorld Quest - Análise - Mecânicas a vapor
Mão mais forte.
Depois de dois jogos a escavar literalmente o solo em Steam World Dig, e por uma vez no formato de estratégia de combates por turnos, recorrendo a personagens capazes de trazer à memória Bender da série Futurama mas no ambiente de máquinas a vapor típico do século XIX, os suecos da Image & Form pegaram no baralho de cartas e voltaram a dar. Talvez tenha sido no tempo livre que pensaram em materializar o seu passatempo, numa adaptação ao universo SteamWorld. A fantasia é minha, mas a verdade é que não anda longe da novidade que é SteamWorld Quest (SWQ), um role play de cartas e talvez uma das melhores experiências dos últimos tempos.
O jogador define o leque de ataques com base em cartas associadas aos heróis. É isso que os torna únicos, a exclusividade das cartas e a possibilidade de criarmos uma equipa com diferentes variantes, tornando o que poderia ser mais um jogo de estratégia e combates por turnos num exercício simples e fácil de apreender, mas ao mesmo tempo com imensa fundura e um sentido de cómico - bem presente nos diálogos - que torna tão especial esta campanha, mesmo que a os moldes de exploração das áreas favoreçam a linearidade. A partir do momento que desenrolamos os trâmites de jogo, a propensão para a surpresa é menor, e sobra apenas a dificuldade e o que podemos fazer com novos ataques e cartas, mas não deixa nunca de ser uma proposta bastante atractiva, repleta de particularidades e marcada por um design impecável.
Desde o "tutorial" é bem vincado o tom cómico dos diálogos, não faltando referências à indústria e cultura popular, numa aventura que nos leva a conhecer as personagens Armilly, Copernica como duas robôs femininas aspirantes a cavaleiras, e Galleo, um ferreiro. A primeira parte do jogo pode parecer um pouco pesada pela extensão com que são reveladas as regras e o procedimentos a seguir, mas é um rolo de operações tão imprescindível como essencial para se ganhar lanço para a aventura, que começa ao fim de sensivelmente três quartos de hora em adaptação.
Os jogadores movimentam as personagens 2D num "formato sidescroll". As áreas possuem uma dimensão significativa, existem imensos tesouros para recolher, zonas secretas, espaços onde podem não só gravar o progresso e restabelecer os indicadores de saúde das personagens, embora tenham sempre inimigos para enfrentar em acesas batalhas. Ao invés de usar a perícia nos botões, através de combinações, pede-se ao jogador que reflicta sobre as cartas que tem em mãos e quais a que melhor operam no sentido de derrubar depressa os adversários e avançar.
"Ao invés de usar a perícia nos botões, através de combinações, pede-se ao jogador que reflicta sobre as cartas que tem em mãos"
Jogam sempre com três personagens. Podem, a dada altura, depois de conhecerem mais cavaleiros, operar uma substituição, tal como num jogo de role play. Mexer na equipa tem as suas vantagens, pois como referido atrás, há personagens que possuem cartas exclusivas, embora nos sejam entregues cartas ao começo de uma batalha. Como se verifica noutros jogos de role play de combates por turnos - os fãs de Paper Mario vão encontrar aqui alguma familiaridade - existem cartas de ataque, as primordiais para se infligir dano no adversário. A estas acrescem as cartas de recuperação/ defesa, cuja utilidade se manifesta na produção de uma barra de "steam pressure" - surge uma barra no topo do ecrã, durante a batalha - podendo desferir uma habilidade especial, que por seu turno irá consumir as unidades de SP disponíveis. Ou seja, muitas vezes a melhor forma de atacar consiste em defender primeiro e depois contra-atacar.
No entanto, estas são apenas as opções básicas e essenciais. A partir daqui o campo de opões alarga-se graças à diversidade de cartas que vão encontrar. Existem mais de 100 cartas para coleccionar. Outra opção curiosa é o ataque em cadeia realizado por uma personagem. Caso sejam utilizadas três cartas de um mesmo herói, segue-se um ataque em cadeia, uma espécie de golpe de assinatura altamente letal para os adversários e ao mesmo tempo potenciador de um escudo de defesa para os restantes membros da equipa.
O interessante nesta produção de cartas lançadas é a escolha de diferentes estratégias. Tanto podemos lançar ataques directos como colocar uma personagem a criar SP para a seguinte desferir um golpe em cadeia, magia e habilidades especiais. Só assim conseguirão suplantar os bosses e passar sem grandes maçadas pelos picos de dificuldade. Isto leva-nos a pensar muito bem nas cartas que escolhemos num dado momento, pois muitas batalhas tendem a ser renhidas, bastando um descuido para se perder uma batalha. Vão receber imensas cartas, conhecer os seus poderes e até forjar novos ataques, mas a sua utilização no momento certo é vital para seguirem em frente.
"Isto leva-nos a pensar muito bem nas cartas que escolhemos num dado momento, pois muitas batalhas tendem a ser renhidas"
Subindo de nível, as personagens podem receber mais e melhor equipamento. Armaduras, armas e escudos complementam um conjunto de parâmetros que urge rever e definir por ocasião do "level up". Não faltam recursos, disponíveis em arcas do tesouro, com os quais podem melhorar os atributos das personagens, nas suas magias, força e saúde. É uma adição bastante conhecida pelos fãs de role play, mas significativamente complexa para nos levar a mexer e explorar as soluções que proporciona. Tornar as cartas melhores é outro procedimento essencial.
À boa fundura de mecânicas acresce uma arte muito inspirada e marcante. Os desenhos não fogem do núcleo SteamWorld, especialmente nos heróis, mas o tratamento dado aos cenários e inimigos é magnífico - esperem pelos dragões e outras figuras -, um trabalho muito bem conseguido, destacando-se as animações durante os ataques. As cartas são pormenorizadas e as mais difíceis de obter e forjar distinguem-se.
Em resumo, SteamWorld Quest posiciona-se como uma boa surpresa, talvez um dos melhores e mais fascinantes jogos dos últimos tempos. A equipa de produção demonstrou habilidade em criar um novo conceito a partir de um mundo estabelecido, ao invés de ampliar conceitos existentes. É uma opção acertada. Hand of Gilgamech proporciona um desafio muito consistente, uma proposta atractiva ao tornar as cartas num seu elemento primordial, embora não descurando outros elementos. Segue a via clássica e o arquétipo de outros jogos de combates por turnos, mas possui suficientes atributos e méritos para encontrar um local especial.
Prós: | Contras: |
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