Quão bom é Super Mario RPG? Análise completa!
Quando Super Mario entrou nos combates por turnos.
Editado em Março de 1996 para a Super Famicom, Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars permaneceu durante anos como um jogo desconhecido para os ocidentais. Quando os jogos de plataformas do protagonista Super Mario enchiam as estantes das lojas, um curioso e peculiar jogo de role play com os protagonistas do Mushroom Kingdom era lançado no Japão. Precisamente no mesmo ano de Super Mario 64, a estreia da série na terceira dimensão e que centrou todas as atenções. Legend of the Seven Stars, embora desconhecido do ocidente, não podia ser mais diferente, apresentando uma estrutura típica de um jrpg por turnos, combinada com uma perspectiva isométrica em 2D e demarcada pelos seus combates táticos e estratégicos. O jogo resultou de uma parceria entre a Square Enix e a Nintendo, sendo a primeira a renomeada produtora de Final Fantasy, o que ajuda a explicar o recurso pela Nintendo a uma das produtoras referência no género jrpg.
Conjugando tão bem os elementos típicos de um combate por turnos com ataques directos e poderes especiais, a narrativa é outro elemento desenvolvido a partir do rapto da princesa Peach, embora com uma elaboração diferente, ao ponto de colocar um antagonista de primeira linha (Bowser) a combater ao lado de Super Mario. Com novas personagens como Geno e Mallow em apoio ao canalizador, a diferença para os jogos de plataformas tornou-se ainda maior. Esta peculiar e quase “sui generis” aventura só em 2008 foi lançada no ocidente, através da Virtual Console para a Nintendo Wii.
Nessa altura, bem depois da viragem do milénio, tanto Paper Mario como Mario & Luigi: Superstar Saga perfilavam-se como sucessores espirituais de Super Mario RPG, dando origem à ramificação Paper Mario, desenvolvida pela Intelligent Systems, enquanto que Mario & Luigi ficou a cargo da Alpha Dream. Editado nas plataformas Virtual Console da Wii e posteriormente da Wii U, a localização ocidental de Super Mario RPG foi uma espécie de conquista por aqueles jogadores que tanto tempo aguardaram. Agora, quase 15 anos depois, o remake da obra inaugural de Super Mario em formato role play, imprime ainda mais brilho a um jogo saudoso e peculiar. Quem tenha jogado entretanto os jogos das séries Paper Mario e Mario & Luigi sentir-se-á em casa quando começar a jogar Super Mario RPG. O ambiente do jogo é deveras familiar, embora com particularidades, especialmente narrativas e conjugadas com um bom desempenho das mecânicas que o tempo não apagou.
Um RPG “old school” com um sistema de combate proveitoso
É nas mecânicas e sistema de jogo que Super Mario RPG se distingue. O sistema de combates por turnos, os ataques directos e os poderes especiais e mágicos são específicos de um tempo. É um modelo de jogabilidade que depende de alguma repetição das áreas e das lutas até que as personagens subam de nível e consigam mais defesas e golpes especiais graças ao “level up”, podendo dessa forma defrontar criaturas especialmente poderosas de igual para igual. Tudo muito na linha dos jogos de role play 8 e 16 bit.
O mais interessante é como a produtora Square (com apoio da Nintendo) integrou os saltos e golpes de Super Mario oriundos das plataformas, neste sistema de combate por turnos. É como se este estivesse num jogo de plataformas a saltar sobre os adversários usando um poderoso par de botas e acabando com eles servindo-se da força de uma valiosa marreta. Os golpes mágicos e ataques especiais são centrais, desde descargas eléctricas de Mallow até aos disparos potentes de Geno, numa profusão divertida de poderes a usar consoante o tipo de adversário.
Com efeito, ao avançar pelas diversas áreas que compõem o mundo do jogo, há npc’s amigáveis e inimigos nas imediações. Se os npc’s podem fornecer importantes informações sobre que rumo seguir na aventura, entre itens oferecidos e venda de power ups e objectos de equipamento (trocados por moedas), os inimigos forçam o combate. Atacam primeiro se interagirem com Super Mario, ao passo que este pode atacar primeiro se os surpreender ou saltar sobre eles, desviando a acção para uma arena. Os golpes podem ser directos, através de ataques que envolvem um golpe do tipo “melee” ou especiais. Estes só podem ser aplicados quando existem pontos de flor, mas golpes mais fortes e especiais consomem mais pontos, como o super salto.
Aos ataques acresce uma particularidade, o “timming” antecipado de um golpe no adversário produz um duplo golpe ou maior dano no adversário e nos restantes. O mesmo procedimento vale a defender. Uma pressão no botão de ataque como que anula a investida do inimigo, através da criação de um escudo. É um processo que requer alguma habituação e treino até surtir os melhores efeitos. Quando bem utilizado pode produzir golpes em cadeia que aumentam o poder de ataque e a eliminação de rivais mais poderosos.
Batalhas árduas
Os companheiros de batalha de Super Mario vão aparecendo à medida que a aventura progride. O início é o típico na série, com mais uma vez o mauzão Bowser a raptar a princesa. Quando o herói está prestes a resgatá-la, no seu forte, surge um vilão sob a forma de uma espada: Exor the Giant Sword, que separa o forte de Bowser do resto do mundo, rebentando com a passagem terrestre e separando as personagens. Cabe a Super Mario mais uma vez resgatar a princesa. Só que desta vez o seu derradeiro boss não é Bowser. Nesta trama o Exor chefia o Smithy Gang, composto por vários inimigos que impõem respeito.
Nesta jornada, Mallow e Geno juntam-se a Super Mario, assim como Bowser (sim, ele também acaba a perseguir esse gang) e Peach. A narrativa começa com uma situação que muitos podem considerar já vista, mas há muitos pormenores cómicos. Curiosidades que começam pelas caixas de diálogo. Como a conversa sobre a origem de Mallow que julga ser uma rã (e afinal é um príncipe) e a aliança com Bowser. O argumento ganha em muitos destes detalhes, curiosidades sobre as personagens e as suas origens.
O caminho de Super Mario e seus amigos até à batalha final está longe de ser favas contadas. Há imensas áreas que se apresentam como labirintos e cuja saída nem sempre é óbvia. Os combates sucedem-se a bom ritmo pelo que convém equipar a “party” com o maior número de itens, escolhendo as personagens mais adequadas para os golpes directos, especiais e magias, num misto de destreza. Desde capacidades mágicas e regeneração, até golpes directos e eficazes, segurando equipamento defensivo, a estratégia é permanente. Do ponto de vista das mecânicas, é acessível e simples, ainda que muitas batalhas obriguem a uma preparação adequada. Alguns adversários são potentes nos ataques, lançam magias que travam os ataques da “party”, com efeitos que vão desde o bloqueio à transformação das personagens em cogumelos, neutralizando o seu estado e tornando problemática a resposta, servindo-se de lacaios que causam mossa quando se tenta recuperar. Além disso, os inimigos lançam alguns ataques devastadores.
Quando as combinações de ataque são bem sucedidas uma barra vai enchendo (action gauge). Na sua plenitude é possível convocar um poder especial das três personagens, produzindo danos extra e profundos no adversário. Este combo extra, que difere consoante as personagens a combater, é útil nas batalhas com os guardiões dos níveis, devendo ser guardado para esses embates. Com uma party tão diversificada em atributos e capacidade para diferentes ataques especiais, só mesmo a falta de “level up” pode levar a dificuldades. Impõe-se travar um bom conjunto de batalhas regulares antes de defrontar o tal inimigo. Com os poderes físicos de Bowser, as habilidades defensivas de Peach e os fortes ataques de Geno, Super Mario conta com uma equipa que é um gosto de usar em batalha. Correr com os inimigos significa também ganhar pontos de experiência e moedas, especialmente as verdes, que os adversários mais fortes deixam. A cada “level” up é possível optar por uma melhoria de HP, de ataques directos ou poderes mágicos. O jogador decide como quer fazer evoluir uma personagem
A qualidade do remake
O périplo pelo mundo do jogo é extenso e abarca florestas, esgotos, desertos, pântanos, montanhas, entre rios e descidas vertiginosas, com muitos mini-jogos pelo meio, onde o objectivo é recolher o maior número de moedas. Desde descidas em barris até pequenos trajectos efectuados num vagão sobre carris, são vários os desafios para lá da habitual exploração das áreas. Existem muitos itens que podem ser obtidos pelo caminho. Mushrooms, poções e caixas de tesouro, algumas bem escondidas (podem usar um identificador de tesouros), entre os saves manuais. Na exploração das áreas é interessante verificar como os produtores cuidaram bem dos pormenores. Entrar num alojamento para uma soneca e regeneração de saúde.
Se optarem por dormir a personagem lança-se num sono profundo, emitindo uma bola aquosa pelo nariz que aumenta e decresce consoante a respiração. Para a acordar basta premir o botão de salto e uma rápida saída da cama ocorre. Interagir com todos os npc’s, especialmente os toads significa ser surpreendido com qualquer coisa, desde ofertas até pedidos e detalhes sobre as suas vidas. É um mundo vivo. Em alguns alojamentos serão surpreendidos com a presença de duas personagens: Link e Samus. O primeiro pelo barulho de abertura de tesouro quando tentam acordá-lo e Samus a pedir descanso até à próxima missão quando se aproximam dela.
A passagem do jogo da Super Famicom para a Switch, com todo o seu tratamento visual reforçado e melhorado é muito fiel à arte original, preservando a perspectiva, o mapa de jogo e todas as áreas. Visualmente há um reforço da qualidade gráfica, com mais cor, brilho e uma remodelação das construções existentes, detalhadas e muito bonitas, de uma definição superior. Até as personagens foram alvo de um tratamento especial, salientando os movimentos e as suas acções, embora sempre respeitando o trabalho original que é já de si muito bom tendo em conta que o jogo é desenvolvido para uma consola 16 bit.
Foram acrescentadas novas sequências de cariz cinematográfico, em momentos cruciais da aventura (Super Mario e a equipa a recolher uma estrela), salientando a arte das personagens e o mundo que as envolve. A banda sonora composta por Yoko Shimomura (também compôs para Street Fighter II e Kingdom Hearts), foi refeita, numa nova versão orquestrada, autoria de Shimomura e capaz de conferir ainda mais profundidade e empolgamento aos diferentes momentos da narrativa. Há faixas memoráveis que convidam a uma escuta a solo. Já os saudosistas poderão a qualquer momento reverter para as trilhas sonoras originais e balizar melhor a dimensão do trabalho efectuado pela artista para este remake. A opção “Boss Rush” é a opção adicional extra depois de finalizado o jogo, que permite lidar com os diferentes rivais numa batalha em crescendo.
Dir-se-á que o original Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars é um curioso e muito divertido jogo de role play, um jogo que na forma 16 bit ainda é muito convincente à luz do presente e das mais recentes produções do tipo jrpg. Mas não podemos ignorar o bom trabalho desenvolvido com este remake, cujo novo fôlego no tratamento visual e com novas sequências cinematográficas, para lá de outros desenvolvimentos, mostra quão bom é. Por entre os Paper Mario e Mario & Luigi entretanto editados, alguns deles com sistemas de combate melhorados, mecânicas apetrechadas de opções e trabalhos artísticos impressionantes (Paper Mario: A Thousand Year Door), Super Mario RPG não será hoje tão surpreendente como foi na altura, é até um jogo de role play “old school”, de bases bastante definidas. Nisso também é interessante, por ser constante no desafio e divertimento, sem se perder em sistemas e opções que por vezes desequilibram o jogo. No final é uma proposta muito equilibrada e bem sucedida, uma reunião de forças entre a Square e a Nintendo que resultou bem. Talvez o maior mérito deste remake seja cumprir a missão que faltou ao original, em sair do Japão e América do Norte e chegar a todo o mundo, com uma apresentação que revela esmero e ao mesmo tempo fidelidade ao design primitivo.
Prós: | Contras: |
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