Tennis World Tour 2 - Review - Precisão a mais
Este ténis não é para todos.
Vi no cinema, depois na televisão e voltei a ver há dias num canal da estação pública (RTP2), um dos melhores filmes-documentário baseado no ténis e cuja referência é o popular e temível jogador norte-americano, John McEnroe. Em John McEnroe: O Domínio da Perfeição há um especial cruzamento entre cinema, movimento e actuação no court, que o antigo cineasta Gil De Kermadec filmou intensamente, arquivando um espólio de bobines avassalador, ao qual Julien de Faraut deitou mão, antes do cineasta falecer em 2011, para criar uma magnífica produção. Um dos principais motivos do filme passa por mostrar através da objectiva de uma câmara os movimentos de um tenista, boa parte deles em câmara lenta e sobre como estes são fundamentais para que um atleta se torne num campeão.
John McEnroe foi um tenista de excelência, durante anos nº 1 do ranking mundial. Um desportista temível para qualquer rival, embora polémico e muito controverso por irritar constantemente os árbitros e os adversários. Em 1984 esteve perto de atingir a perfeição, perdendo, num revés impressionante, a final de Roland Garros, nesse mesmo ano, de forma dramática. Mas mais do que os resultados e essa assombrosa final, o que ressalta deste filme-documentário é a postura e todos os movimentos de um atleta. São treinados dias a fio; um serviço, uma batida, um sprint à rede, a forma como se agarra uma raqueta. Tudo é treinado ao mais pequeno detalhe.
Não admira, por isso, que também nos jogos dedicados ao ténis haja uma preocupação constante por parte das produtoras em recrear com realismo e fidelidade os movimentos do tenista, em materializar uma física da bola susceptível de se articular com a realidade e dessa forma proporcionar um desafio genuíno. É possível por "portas travessas", por via das experiências arcade, como bem fez a Sega ao longo de anos com o seu Virtua Tennis, entregar um desafio consistente, ainda que não seja uma reprodução do tipo simulação e se projecte no tipo "pingue-pongue" e nas corridas ao fundo da linha para chegar a uma bola, através de um quadro de detecção de física da bola mais alargado.
Jogar para o fundo do court equivale a correr riscos
A dificuldade maior por que volta a passar a Big Ant Studios, mais uma vez, está na profundidade com que pretende autenticar o jogo de ténis, em encontrar a dose certa de equilíbrio entre precisão e momento certo para desferir uma forte pancada. Podemos dizer que apesar do esforço no sentido de tornar a actual proposta mais enquadrada na simulação, ainda colapsa em momentos determinantes da jogabilidade, projectando mais o erro que o estímulo à aprendizagem. Os caminhos do realismo e da simulação são sinuosos numa modalidade como o ténis, onde a física, postura e contacto com a bola são determinantes. Neste quadro, WTT2 ainda não é bem o jogo de ténis com que podemos contar se queremos ser surpreendidos pela positiva, pois as transformações levadas a cabo nesta edição, surtem efeito nalgumas áreas, deixando outras não menos importantes a descoberto.
Para começar, existe um imenso sector de aprendizagem, onde aprendemos a efectuar todo o tipo de movimentos, em número mais até do que razoável, dependendo do posicionamento que o nosso jogador venha a ocupar no "court". Mas a todos esses momentos capitais, como serviço, vólei, top spin, etc., corresponde um conjunto de botões a premir. É realmente impressionante a lista de movimentos disponíveis, numa assumida direcção pela produtora em torno da simulação.
Pode dizer-se que a jogabilidade assenta no domínio da precisão e da força. Com golpes mais precisos, pressionados os botões, quase levemente, numa janela de tempo reduzida quase a um instante, correspondente à aproximação da bola à raqueta, podemos enviar a bola para o campo do adversário em pontos que tornam mais difícil a sua recuperação. Resultando perfeito, é ponto pela certa, digno da repetição. Já as bolas atiradas com força dependem de um tempo de carregamento dos botões.
O sistema é francamente engenhoso, complexo, e revela até que ponto o ténis praticado com sucesso depende de um conjunto de movimentos a dominar. O que a produtora de WTT2 espera com isto é que os jogadores se dediquem quase em exclusivo a apurar e treinar as técnicas, pois ao princípio os resultados das abordagens à bola mais parecem aleatórios, através de uma série de erros sem que muitas vezes tenhamos uma percepção clara do momento em que falhamos, se foi pressão a mais ou "timming" a menos.
É difícil dominar as técnicas e os movimentos a este ponto, pelo que normalmente acabamos por perder imensos "sets", nem sequer forçados mas por lutarmos contra o sistema de precisão e pressão. A luta que deveria ser com o rival torna-se numa luta com os comandos. Esta sensibilidade extrema dos controlos acaba por ser o nosso maior adversário, pelo menos até nos sentirmos um pouco mais capazes, porque a margem de um erro ou de uma pancada com sucesso é praticamente imperceptível e esta dimensão aleatória do desfecho das jogadas parece ditar uma espécie de desfecho antecipado.
Apreciável, de resto, o esforço da editora em melhorar a postura e o movimento dos tenistas, face ao jogo anterior, que no entanto não é tão visível na modelação dos atletas e na produção gráfica, está visivelmente aquém do esperado. Outros jogos de desporto conseguem uma atenção ao detalhe realmente assombrosa e ímpar, quase em estado de arte, algo que não é de todo aqui atingido, especialmente na modelação dos atletas. Porém e como dissemos, os movimentos e as posturas dos tenistas estão relativamente dentro de parâmetros aceitáveis.
Jogar tudo numa cartada
Quanto à inclusão do sistema de cartas como forma de melhorar a performance em momentos capitais do jogo, não é bem uma corrida às caixas da sorte, porquanto é utilizada moeda do jogo, mas a sua utilização parece-nos por vezes perniciosa, uma espécie de última cartada a ser lançada num momento que pode definir o desfecho de encontro mas que se revela algo delicada atendendo ao tal factor de jogabilidade assente na precisão e na potência, que mesmo neste enquadramento não deixa de se fazer sentir, mesmo que haja alguma facilidade e apoio. A probabilidade de acertar e conseguir o resultado pretendido é maior, mas podemos voltar a falhar e assim perder o efeito útil de algum tipo de carta, para além de tornar os sets numa espécie de equilíbrio de cartas a nosso favor e, como tal, projectar o factor sorte.
Em termos de modos de jogo, contando com várias opções tanto online, como single e multiplayer, é no modo carreira, a partir de um atleta criado a nosso preceito e dentro de certas condições, que vamos partir, mais uma vez, à conquista do mundo. Vários parâmetros como treino, jogos preparatórios, torneios, lesões e equipamentos, fazem parte da equação, mas de um modo geral, assim que entramos nas rotinas, não há grandes incentivos ou recompensas de monta. A dada altura só queremos continuar a jogar para ganhar os mais importantes torneios, numa escalada mais ou menos linear. O roster de atletas é significativo, tanto nos homens como nas mulheres, mas ainda há omissões relevantes. Em matéria de torneios, a versão mais económica do jogo permite divertimento imediato mas não contempla o Roland Garros, disponível num pacote mais caro. Parece-nos bem esta decisão.
Como dissemos, WTT2 é uma aposta da editora Nacon em recriar partidas de ténis com simulação e realismo, adicionando um nível de profundidade significativo mas simultaneamente problemático. Não só díficil de dominar como certos pontos de contacto com a bola tornam muito aleatório o desfecho do lance. Além disso, é uma produção que visualmente ainda não atinge o estatuto de outras produções desportivas quando pretende concorrer no mesmo filão de realismo. Apesar disso, não deixa de ser uma opção francamente melhorada face ao jogo anterior e capaz de proporcionar partidas com algum interesse. Um resultado agridoce que ainda não chega para elevar WTT2 ao estatuto dos melhores, mas deixa uma base para futuras iterações.
Prós: | Contras: |
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