Teslagrad - Análise
O último Teslamancer.
Criado em Bergen, na Noruega, pela Rain Games, um pequeno estúdio de programadores apaixonados pelo seu ofício e motivados por um interesse transversal em criar jogos dotados de uma grande simplicidade mas simultaneamente criativos, desafiantes e originais, Teslagrad mostra o vinco e desejo da produtora em deixar uma marca nos jogadores, mesmo que pelo caminho se tornem evidentes alguns sinais da juventude do estúdio, com efeitos sobre a experiência.
Publicado no final de 2013 para o PC e Mac, ainda em Maio e Junho desse ano a Rain Games anunciou Teslagrad para a PlayStation 3 e Nintendo Wii U. Estando igualmente previsto para a PS Vita e PlayStation 4, ainda não há uma data concreta quanto a estas versões, pelo que o jogo para a Nintendo Wii U, que aqui analisamos, corresponde à primeira edição disponível numa consola.
Trata-se de um jogo que assenta bem no padrão de produções de estúdios independentes que têm entrado a bom ritmo na eShop. Um jogo com uma atmosfera densa, marcado por uma ausência de textos, diálogos e cenas do género cinematográfico, sem loadings ou transições de capítulo, mais se confundindo com uma curta metragem animada, na qual as imagens e sequências visuais falam por si.
Como jogo de puzzles e plataformas em duas dimensões, a lógica é posta à prova através da manipulação do mundo de Teslagrad por via da electricidade e magnetismo, afastando e aproximando plataformas, entre outras acções. A componente de exploração é elevada, sobretudo pelo transporte do rapaz como personagem principal para uma torre pujante, enigmática, fria e acrescida de labirintos ao bom estilo Castlevania ou Metroid.
A introdução é aliás o único ponto do jogo que transmite linearidade. Começamos por controlar o rapaz, a personagem principal, ao longo de uma faixa de telhados escuros de uma cidade europeia envelhecida, sombria e envolta numa espessa neblina de fumos e vapores. Chegado à abissal torre Testla, a partir daí deixa de existir um único trajecto. Podemos optar por seguir vias alternativas e desta forma ficar na expectativa sobre o que nos está reservado para os momentos seguintes. Com tempo o tão famoso "backtracking" vai pesando e desgastando aquele ímpeto inicial aquando a descoberta, embora os puzzles e a lógica sobre a manipulação das plataformas persistam como pontos relevantes.
O poder da luva
O apoio dado através ecrã do GamePad é significativo, mas podia ser melhor. Nele vemos um mapa com indicação das câmaras, corredores e elevadores que já visitámos dentro da Tesla Tower. A sua apresentação é no entanto dada em termos muito mínimos. Não há um ícone a marcar o exacto ponto onde nos encontramos, nem indicação de pontos de interesse que tenhamos visitado. Percebo que a intenção dos produtores tenha passado por restringir ao máximo a informação transmitida ao jogador, para que este sentisse como é estar num labirinto, com escassas ou nenhumas informações sobre a saída.
Pese embora a inspiração no género "metroidvania" no que respeita à dimensão dos cenários e componente de exploração, ao invés de delegar armas para a mão do protagonista, a Rain Games optou por algo mais complexo e simultaneamente desafiante. A partir da luva magnética, dependendo do efeito aplicado, podendo ser de atracção ou repulsão, os efeitos criam situações de união e afastamento de plataformas ou objectos. A partir da lógica que opera nesta mecânica, abre-se uma multiplicidade de contextos e mais distintas situações passíveis de interacção, até como forma de combate contra poderosos inimigos. Além disso, existem ainda campos electromagnéticos, com capacidade para elevar a personagem até plataformas superiores.
Nem só sobre a manipulação de objectos se compõe esta mecânica. Por efeito da atracção da luva calçada na mão direita, é possível aderir a tectos e assim atravessar uma secção que na sua base seria inultrapassável. A activação das polaridades é muito simples. Basta uma pressão no gatilho esquerdo ou no gatilho direito para activar os diferentes efeitos magnéticos, identificados por cores, designadamente azul e vermelho. Na prática os efeitos são aplicados como socos. A adaptação opera-se com grande simplicidade, através de puzzles simples e básicos que rapidamente nos deixam ficar com uma ideia do conceito.
À medida que aprofundamos a exploração na Torre Tesla, os desafios vão subindo de dificuldade, e o sucesso em certas partes torna-se muito mais complicado de obter, não obstante a ausência de vidas ou barra de saúde. Mesmo perdendo, retomam sempre no ponto prévio. Diferentemente, se perderem uma vida contra um inimigo ou um "boss", terão de recomeçar a batalha, o que nalguns casos cria alguma frustração e torna o processo repetitivo, dado o padrão limitado de movimentos. Precisamente porque a operação de manipulação dos objectos torna-se, a dada altura, tão delicada e urgente, com activações em pequenos frames de segundo, que não é impossível deixar fugir alguma lógica, atrapalhando os processos e forçando o erro.
Teslagrad convida ainda o jogador a recolher items e alcançar plataformas secretas e distantes. Descobrir tudo e ultrapassar os múltiplos inimigos leva bastante longe. De fundações sólidas, este jogo consegue cativar pela urgência em resolver os puzzles, sentido de exploração e dimensão contemplativa. O design é atraente, o grafismo desenhado à mão assemelha-se ao de uma banda desenhada e as melodias envolvem-nos constantemente. Faltou apurar a mecânica e garantir mais alguma eficácia na activação das ferramentas em momentos cruciais. A Rain Games tem aqui um trabalho meritório e digno de relevo como o seu mais destacado até ao momento. Foge um pouco ao comum de outras propostas que se apoiam no género "metroidvania" e esse distanciamento beneficia todos os que aqui chegam.