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The Division - Análise

Bem-vindos a Manhattan.

The Division estabelece uma base sólida para o que poderá ser um bom jogo, mas para já, precisa de amadurecer e de ser refinado.

O momento finalmente chegou. The Division, uma das maiores apostas da Ubisoft dos últimos anos e um dos jogos mais aguardados já desde a E3 2013, está disponível. Desde o seu lançamento na semana passada que o escrutinamos diariamente, procurando conhecer tudo o que tem para oferecer. Enquanto alguns já deram um salto cego para o jogo, outros ainda estão indecisos quanto à sua compra. A resposta à pergunta “vale a pena comprar?” é complicada, especialmente em casos como The Division.

The Division é um jogo de tiros na terceira pessoa que vai buscar alguns elementos aos MMORPGs. Outra forma de o descrever é dizer que se trata do Destiny da Ubisoft. A cidade é diferente e a perspectiva também, mas a estrutura que suporta o jogo é a mesma que encontramos na estreia do jogo da Bungie em 2014. O derradeiro objectivo é repetir as mesmas missões vezes sem conta e no final esperar ganhar melhores armas e armaduras do que aquelas que já temos, o que nem sempre acontece apesar do nosso esforço (isto já depois do final).

Tal como outros jogos semelhantes, The Division começa por nos pedir para criar uma personagem. O editor deixa-nos escolher o sexo da nossa personagem, mas no resto é extremamente limitado. Não podemos moldar a face da personagem e somos forçados a escolher uma cara de várias pré-definidas. Nos cortes de cabelo e nas restantes opções as escolhas são igualmente limitadas. Mas como a maior parte do tempo será gasto a disparar contra adversários, raramente terão a oportunidade para olhar para a cara da vossa personagem, pelo que este não é um detalhe crucial.

Depois de uma breve passagem por Brooklyn, a área que serve de tutorial, o jogo encaminha-vos para a grande Manhattan, o local onde durante a Black Friday se espalhou um mortífero vírus que roubou a vida a milhares e espalhou o caos pela cidade de Nova Iorque. A vossa personagem é um de vários agentes enviados para recuperar a zona, que se tornou numa anarquia dominada por grupos de criminosos. A vossa base está miserável e o vosso objectivo será colocá-la 100 porcento funcional, o que acontecerá completando missões da história e os muitos objectivos secundários que iluminam o mapa.

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A vossa base está dividida em três partes: Medical, Tech e Security. Cada missão da história dá-vos pontos para investirem numa destas divisões. Ao evoluírem estas divisões da base ganham novas habilidades para a vossa personagem e perks. Outra forma de ganhar pontos para investir nas divisões é completar os objectivos secundários. No final do jogo terão todas as habilidades e perks desbloqueados, pelo que não existe propriamente uma ordem correcta para evoluir as divisões. Sigam o vosso instinto e optem pelas evoluções que desbloqueiem primeiro as habilidades que correspondem ao vosso estilo de jogar.

Embora no final tenham todas as habilidades desbloqueadas, em simultâneo só podem ter três equipadas: duas habilidades normais e uma super-habilidade. É aqui que entra o modo cooperativo. The Division foi criado para ser jogado com mais três pessoas. A ideia é que cada jogador numa equipa tenha um papel específico: médico, tanque, suporte e alguém capaz de causar muito dano. Não vão precisar obrigatoriamente de cumprir esta estrutura para chegar ao final das missões (pelo menos no início), mas parece que o conceito idealizado pela Massive Entertainment foi este.

Uma das vantagens de The Division é que todas as missões têm matchmaking, até mesmo quando desbloqueiam os modos mais difíceis depois de atingirem o nível máximo. Ou seja, não precisam propriamente de um grupo de amigos para desfrutar de The Division, embora seja mais divertido dessa forma. O sistema de matchmaking funciona bastante bem e até agora não obtivemos quaisquer problemas em encontrar estranhos para jogar connosco. E desde que tenham um headset, podem comunicar com os estranhos que o jogo encontrar, desde que falem a mesma língua.

As missões de The Division seguem sempre a mesma estrutura do princípio ao fim. Preparem-se para enfrentar ondas sucessivas de inimigos cada vez mais fortes, até que no final encontram um boss. Derrotado o boss, ganham recompensas, experiência e, se a experiência for suficiente, a vossa personagem passa para o nível seguinte. Mesmo depois de chegarem ao nível 30, este padrão mantém-se, a única diferença é que a experiência já não serve para nada. Restam então as recompensas, que são problemáticas no end-game, mas só falarei disto mais adiante.

"Uma das vantagens de The Division é que todas as missões têm matchmaking"

Ao complementar as missões da história existem imensas missões secundárias. Neste aspecto The Division segue o mau exemplo de outros jogos da Ubisoft. Embora o mapa esteja recheado de objectivos adicionais, passado algumas horas percebe-se que a maioria são iguais, a diferença é que decorrem em locais diferentes do mapa. Podem sempre subir de nível com as missões da história, mas a dura realidade é que a experiência ganha ao terminar todas estas missões não chegam para chegar a nível 30, pelo que eventualmente terão que completar pelo menos algumas das aborrecidas missões secundárias.

Portanto, chegar a nível 30 dá algum trabalho. No nosso caso demoramos cerca de 36 horas, mas no Reddit descobrimos um individuo que conseguiu fazê-lo em apenas 15 horas, pelo que dependerá da dedicação de cada um . Independentemente do tempo que demorarem a chegar ao nível máximo, uma coisa é certa: só quando chegam ao nível máximo é que o jogo realmente começa, o que está para trás é apenas um aperitivo, tal como acontece em jogos deste género como Destiny e Diablo. Só quando chegam ao nível máximo é que desbloqueiam as Missões Diárias e os Challenges, que são missões em que só aparecem inimigos a nível 32 com vida amarela (são os inimigos que têm mais vida). É também nestas missões que está o melhor loot e que o trabalho de equipa realmente importa. Curiosamente, é nestas missões que as falhas do jogo se tornam mais evidentes.

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Em The Division vão enfrentar vários tipos de soldados: aqueles que lançam granadas, uns que ficam a disparar mais protegidos, snipers que ficam escondidos mais lá atrás, e depois temos inimigos que correm para nós de caçadeira na mão e os "tanques" que usam uma metralhadora ou lança-chamas. São estes dois últimos tipos de inimigos que são particularmente problemáticos, especialmente nas dificuldades mais elevadas. Os inimigos de vida amarela têm escudos muito resistentes. São precisos vários carregadores e uma equipa de quatro pessoas a disparar para eles para retirar-lhes o escudo. Piorando a situação, estes inimigos avançam em frente sem sequer reagirem ao impacto das balas. A solução é simplesmente fugir o máximo possível para trás, retirando o elemento estratégico do jogo e dando lugar a confrontos caóticos e extremamente frustrantes.

As Missões Challenge são neste momento o maior desafio que o jogo tem para oferecer, mas o loot não compensa o esforço. Na maioria das vezes recebemos peças de equipamento piores que aquelas que temos equipadas. A única vantagem de completar estas missões, bem como as missões diárias, são os Phoenix Credits, a moeda de troca no Advanced Gear Vendor. Neste vendedor é possível comprar armas, armaduras e blueprints de equipamentos High End, que se distinguem pela sua cor amarela. Ao longo do jogo vão encontrar várias qualidades de equipamento: verdes, azuis, roxos e amarelos. Os equipamentos amarelos são o melhor tipo, contudo, podem ganhar equipamentos roxos melhor do que amarelos. Como as estatísticas de cada equipamento são aleatórias, situações destas acontecem. Mesmo armas e armaduras com nomes idênticos podem ter estatísticas diferentes, devido a esta aleatoriedade do sistema de loot.

Além das Missões Diárias e dos Challenges, The Division conta com uma Dark Zone, um conceito inovador e interessante, mas terrivelmente mal aproveitado. A Dark Zone é o local de Manhattan onde o vírus teve mais impacto, e como tal, esta área teve que ser isolada. Ao entrarem na Dark Zone, entram num jogo do vale tudo. Aqui os agentes podem matar-se uns aos outros virando rogue e roubar o loot dos outro jogadores. No papel parece fantástico, mas na prática, devido a algumas decisões questionáveis, não é assim tão fantástico. Para começar, virar rogue não compensa. Se morrerem enquanto Rogue no nível máximo, vão perder imenso dinheiro e vários Ranks da Dark Zone (sim, quando morrem perdem Rank, mesmo quando os responsáveis são NPCs inimigos). Por outro lado, se conseguirem sobreviver e deixarem de ser rogues, a recompensa é insignificante. Depois, com um grupo de quatro pessoas é tão fácil matar os bosses da Dark Zone e ganhar loot que tentar roubar outros jogadores é um desperdício de tempo. Tem alguma piada ser rogue das primeiras vezes para experimentar, mas o risco não vale a pena.

Basicamente, a Dark Zone resume-se a matar bosses e a recolher loot que deixa a desejar, um efeito da última manutenção da Massive Entertainment. Tal como o resto do jogo, a Dark Zone torna-se rapidamente repetitiva devido à falta de variedade. Existe o risco de serem roubados, mesmo por companheiros de equipa, já que quando morrem o vosso loot fica espalhado pelo chão. É isto que distingue a Dark Zone do resto do jogo, o problema é que roubar não compensa. De salientar que a Dark Zone tem um nível separado do resto do jogo. Para subir de nível da Dark Zone precisam de matar NPCs ou caçar rogues. Aqui surge outro problema. Só a Rank 30 é que podemos abrir os cofres espalhados por esta zona e comprar equipamentos aos vendedores da Dark Zone. Quando chegamos a a Rank 30, o loot dos cofres e os itens que os vendedores têm já são inferiores aos que temos equipados. Portanto, a Dark Zone é quase inútil de momento. É engraçado visitar a área inicialmente, mas perde a piada num ápice.

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Portanto, de momento o end-game de The Division é problemático. O loot deixa a desejar e há falta de conteúdos e de variedade. Todos os jogos deste género caem sempre na repetitividade, mas ainda só passou uma semana desde o lançamento e The Division já mostra cansaço. Gostamos das Missões Diárias e dos Challenges (com a excepção daqueles inimigos com escudos ultra-resistentes), mas o jogo não tem assim tantas missões para rodá-las diariamente. Devido a isto, dentro de pouco tempo saberemos todas as missões de cor e salteado. A Ubisoft já prometeu mais conteúdos. Em Abril e Maio serão lançadas actualizações gratuitas com mais conteúdos. Na próxima actualizações teremos a Incursion, que supostamente será a versão do jogo das Raids, mas para já é incerto se estes conteúdos vão melhorar substancialmente o que o jogo tem para oferecer.

"De momento o end-game de The Division é problemático"

Não esquecer que The Division é um jogo dependente do Season Pass, que custa 39.99 euros adicionais ao jogo. As primeiras duas actualizações de conteúdos serão gratuitas, mas depois disso, a Ubisoft começará a lançar conteúdos pagos. Quase todos os jogos têm um Season Pass hoje em dia, pelo que não estamos perante um escândalo nem estamos contra. O que nos incomoda são os eventos mensais exclusivos para aqueles que comprarem o Season Pass. The Division é um jogo extremamente dependente de conteúdos, pelo que reservar eventos para aqueles que estão dispostos a pagar mais não é uma atitude louvável, principalmente num jogo desta natureza.

Até agora ainda não falei da história de The Division, isto porque facilmente nos esquecemos dela. A história existe, só que é contada de uma forma terrível. A narrativa é desenvolvida sobretudo com conversas de rádio no início, a meio, e no final das missões, pelo que facilmente deixamos passar informações relevantes. Existem algumas cinemáticas, mas a maioria não passam de conversas com personagens da nossa base. Acima de tudo, The Division precisava de mais cinemáticas de acontecimentos relevantes e também de personagens carismáticas. A história é assim uma oportunidade desperdiçada para criar algo com um genuíno impacto.

Manhattan está sob o controlo de várias facções: Rioters, Cleaners, Rikers, e o Last Man Battalion (LMB)

A jogabilidade está sólida, mas não é perfeita. The Division permite que se desloquem fluidamente de cobertura para cobertura e que rebolem pelo chão, o que dá jeito para escapar à zona de explosão das granadas. A única queixa é que por vezes, quando estamos a tentar fugir, a personagen insiste em ficar colada, ou mesmo presa, a certos objectos do cenário, o que se torna frustrante. Quanto às armas, inicialmente têm bastante recoil, mas já perto do final do jogo vão encontrar armas mais estáveis. É no recoil, nas balas disparadas por minuto, e no alcance que estão as maiores diferenças nas armas, pelo menos na sensação que trespassam quando as usamos. Não há muito mais a acrescentar aqui, The Division é um jogo de tiros na terceira pessoa, pelo que a maioria já está consciente do que esperar. Há quem prefira a câmera na terceira pessoa, enquanto outros dão primazia a jogos na primeira pessoa, mas isso são gostos pessoais.

The Division impressiona verdadeiramente na parte técnica e no seu aspecto gráfico. Acredito que a maior parte do tempo de produção tenha sido dedicado a estes aspectos. O jogo foi construído num novo motor de jogo chamado Snowdrop e o seu potencial está bem evidente. O mundo do jogo é gigantesco (ainda que não seja possível explorar toda a ilha de Manhattan) e a quantidade de detalhes é inacreditável. Embutir tantos pormenores num mapa desta dimensão e manter a fluidez não deve ter sido um objectivo fácil de alcançar, mas a Massive conseguiu. A Manhattan expressa em The Division é credível e conta a história dos eventos que antecedem o jogo. As ruas estão cheias de lixo, de sacos com cadáveres, e de carros abandonados. De longe a longe aparecem sobreviventes que nos pedem água e comida. Os efeitos meteorológicos são luxuosos, variando de manhãs solarengas a nevões que reduzem o nosso campo de visão a uns meros metros. Tudo isto existe sem qualquer loading. Podem estar a explorar a cidade e entrar numa missão da história e activar o matchmaking sem qualquer ecrã de carregamento.

"Fora a parte técnica e o seu grafismo de excelência, The Division deixa-nos desiludidos."

Fora a parte técnica e o seu grafismo de excelência, The Division deixa-nos desiludidos. É quase um dejá-vu do lançamento de Destiny. Embora tenha chegado mais tarde, o jogo da Ubisoft comete várias falhas que o jogo da Bungie cometeu. Há poucos conteúdos, é repetitivo e o end-game é limitado. O que a Ubisoft lançou é uma base sólida para construir nos próximos meses. O jogo casa muito bem o estilo dos jogos de tiro na terceira pessoa com os elementos RPG, e a verdade é que rapidamente ficamos com o vício de querer melhorar ao máximo a nossa personagem, apesar das falhas evidentes. The Division também tem a vantagem de ser um jogo cooperativo para quatro pessoas, até porque não existem assim tantos jogos que nos deixam jogar do princípio ao fim na companhia de amigos e/ou de estranhos. Importa sublinhar que jogar com companhia é praticamente obrigatório, já que todas as missões foram desenhadas para quatro pessoas. É possível terminar as missões sozinhos, mas vão demorar muito tempo e não se vão divertir muito.

Devem estar a perguntar, se o jogo tem tantas falhas, como conseguiste jogar quase 50 horas? Um jogo desta natureza consome muitas horas, e nem todas essas horas foram divertidas. Em algumas senti-me extremamente aborrecido por ter que fazer missões secundárias repetitivas para subir de nível. Noutras senti-me frustrado por alguns inimigos que são esponjas de balas. É claro que em algumas dessas horas houve diversão, mas a ideia que fica é que The Division é uma experiência mista. Será que o jogo tem potencial? Sem dúvida, mas precisa de amadurecer, de ser refinado, e sobretudo de mais conteúdos. Se querem algo para jogar com amigos, The Division é uma opção viável, mas há muita margem de manobra para melhorar, e é precisamente isso que esperamos que aconteça nos próximos meses através de actualizações. Mas por enquanto, The Division tem que ficar no forno e cozer mais um bocado para que fique no ponto.

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