VVVVVV - Análise
VVVVVViciante.
O mercado dos jogos "indie" revela-se como um dos mais consistentes e a ter em conta por qualquer jogador que pretende fugir à rotina dos "blockbusters" de mercado. Nele quase sempre descobrimos experiências novas e refrescantes. Muitas delas estranhas, é verdade, mas que acabam sempre por nos convencer. Há muito material original e apesar de a qualidade nem sempre ser transversal a todos os jogos denominados indie, encontramos alguns que vão subindo de destaque. Do PC e do que muitas vezes começa como jogos flash, o sucesso, através de nichos, destes jogos menos publicitados, leva a que certas editoras os retirem da penumbra para um espaço de maior visibilidade. Infelizmente e mesmo contando com o apoio de plataformas como XBLA, e PSN, nem sempre conseguem repercutir em vendas a qualidade que lhes está associada.
A eShop da 3DS é uma outra dessas plataformas on-line que garante espaço a jogos que não entram no processo de venda através de formato físico. E aquilo que começou por ser uma pequena tenda eletrónica da portátil da Nintendo composta por muitos clássicos da gigante de Quioto, é agora uma referência para os jogadores que pretendem novidades, demonstrações e jogos diferentes. Títulos imediatos, acessíveis e baratos que possam proporcionar uma experiência sem grandes complexidades estão lá. A eShop é também um espaço de promoção de jogos originais ou provindos da cena indie. Mutant Muds é um desses jogos, ainda que não tenha chegado à loja europeia.
No final do ano passado VVVVVV chegou à eShop americana, no seguimento de um sucesso moderado no PC e Mac durante quase dois anos. Este é um jogo que abraça uma mecânica muito simples e ostenta uma imagem visual e sonoridade assumidamente retro, apontada especialmente aos amantes do Commodore 64/ Spectrum. Basta que atentem no ícone do jogo, uma cassete, daquelas que marcaram os anos oitenta. Até o ecrã inicial é todo nostálgico e vemos o carregamento da informação através do sistema de percentagem.
Neste jogo iremos assumir o controlo do capitão Viridian, que mais parece um Sackboy saído de uma centrifugadora 8-bit. Enquanto dirigia a sua nave pelo universo, uma interferência dimensional ditou que a tripulação tivesse de ser evacuada através de uma espécie de portal. Acontece que na evacuação o capitão foi parar a uma dimensão alternativa, assim como os restantes elementos. Viridian parte então na busca dos outros membros, também eles presos nessa estranha realidade onde podemos jogar com a gravidade, ou melhor, invertê-la. Todos os membros da tripulação têm um nome que começa por V (Vermilion, Violet, Verdigris, Vitellary e Victori). Viridian é então o sexto V e o título do jogo. Talvez agora compreendam o porquê deste nome tão incomum para batizar uma experiência simples mas viciante.
Os comandos são fáceis. Repousam na vossa perícia para movimentar a personagem por labirintos e zonas povoadas de perigos, embora possa ser por vezes frustrante devido ao pesado esquema de tentativa e erro. Através do d-pad poderão movimentar a personagem para a esquerda e direita ou diagonais (quando estiver a atravessar espaço), usando um botão (que pode ser A, B, X ou Y) para colocar a personagem num plano oposto de gravidade. Transitando de plano, a personagem pode esquivar-se ligeiramente para a direita ou esquerda, conseguindo aceder a zonas secretas ou então pontos de acesso a áreas onde se encontram os membros da tripulação.
"Perder a vida em VVVVVV é uma constante e se jogarem dentro do modo história, será algo que irá acontecer por centenas de vezes antes de descobrirem os restantes membros da tripulação."
Os níveis que terão de atravessar são longos e estão todos ligados dentro de um mesmo mapa. Mapa esse que vai ficando visível no ecrã inferior, à medida que progridem por inúmeros labirintos. Isto pode parecer simples. A dificuldade não tarda e resume-se a pequenas ligações que implicam uma coordenação rápida de movimentos No começo a adaptação à inversão da gravidade opera-se de forma bastante simples. Pelo percurso há que evitar perigos como picos que aniquilam as chances de progressão. Vale, porém, a existência de checkpoints colocados estrategicamente em locais que normalmente precedem níveis com maior complexidade para ultrapassar. Sendo impossível saltar, somos muitas vezes forçados a inverter a gravidade para prosseguirmos.
À medida que avançamos, descobrimos que fazer a inversão de gravidade como meio genérico deixa de ser suficiente. Devemos aproveitar plataformas amovíveis para chegar a outro ponto da área. Algumas dessas plataformas desaparecem em frações de segundos assim que tocamos nelas. Obstáculos estranhos surgem ao longo de uma zona a atravessar, exigindo uma coordenação e tempo de inversão muito rápidos. Outras vezes caímos numa espécie de abismo e não somos capazes de antecipar a zona de chegada, pelo que se nela encontrarem espetos, é morte certa. Perder a vida em VVVVVV é uma constante e se jogarem dentro do modo história, será algo que irá acontecer por centenas de vezes antes de descobrirem os restantes membros da tripulação.
Pelo meio existem os "trinkects", muitos deles colocados em lugares difíceis de alcançar. Ao todo devem alcançar vinte se quiserem ganhar acesso ao quadro especial de conquistas. Pelo meio podem gravar o jogo nos portais e enquanto não descobrirem os oito principais níveis, deverão usar o ecrã inferior para se aproximarem das zonas com ponto de interrogação, dado que estas escondem algo de útil. Se vos apetecer saltar da história, podem passar pelo menu para ativar alguns modos especiais como o Time Trial, o modo No Death para jogadores hardcore e mais 18 níveis desenhados por jogadores que irão pôr à prova as vossas capacidades.
Considerando a sua mecânica, VVVVVV põe muito peso no velho modelo arcade da tentativa e erro. A manipulação de objetos e confrontos é inexistente. O foco deste jogo reside numa fuga para o sucesso, daí que o processo interativo seja mais escasso, assente numa questão de "timming" das inversões de gravidade, para o típico "trial and error". Contudo, a dimensão marcadamente retro, baseada nas experiências de Terry Cavanaugh, o homem que idealizou e desenvolveu o jogo (inicialmente a pensar no PC) é talvez um dos pontos de maior apelo. Representativo de um estado gráfico próximo da era Commodore 64, os nostálgicos pela onda revivalista retro, encontram aqui um grande ponto de contacto com uma geração que há muito desapareceu do atual horizonte.
Há também as dicas, normalmente colocadas na parte inferior do ecrã 3D, que mais não são do que nomes das salas e áreas. Muitas vezes superamos a dificuldade que nos impede de prosseguir através de uma interpretação do nome que está associado. "Salto de fé", "sempre em frente", são indicações para aquilo que vos é pedido.
Se o grafismo marcadamente retro e bem implementado favorece o jogo, a música não podia estar melhor. O que aqui vão encontrar são aquelas melodias clássicas, puro chip tune 8 bit ao abrigo de uma moda que anda por aí. Não só convencem como as trilhas aqui disponíveis mudam constantemente. Ficam na cabeça e raramente incomodam. Os efeitos sonoros são bons e marcantes, mas neste campo é a banda sonora que leva claramente a melhor.
Este é um grande jogo imediato, acessível e desafiante. Se não puderam jogar nenhuma das versões anteriores, descarreguem com confiança isto da eShop. O estilo marcadamente retro será bem acolhido pelos fãs da geração 8 bit, ainda que este título não se resuma a uma tese revivalista. Sendo um bom exemplo de design e criatividade, a mecânica de jogo prova que é possível endereçar bons desafios a partir de regras simples. O efeito 3D não é tão vinculado como vimos noutras produções. De qualquer modo Terry Cavanaugh deve estar bastante satisfeito com esta adaptação à portátil da 3DS.