Wasteland 3 Review - RPG táctico brilhante, mas com problemas nas consolas
Estados Unidos da Loucura.
É preciso ter coragem para jogar um título pós-apocalíptico em 2020. Estamos a viver uma pandemia com capacidade para colapsar a sociedade e a economia global, com potenciais resultados desastrosos. Se há lição que a humanidade tem de aprender do que se viveu nos últimos meses e que ainda se está a viver, é que a normalidade pode mudar muito rapidamente. Ainda que Wasteland 3 mostre uma visão pós-apocalíptica resultante de uma guerra nuclear, neste momento é impossível não pensar se algum dia a ficção se tornará realidade. Apesar do jogo nos mostrar um mundo assustador em que "cão come cão", é igualmente fascinante percorrer as cidades pós-apocalípticas que os restos da humanidade ergueram e interagir com as muitas personagens peculiares. Este não é um mundo são, os loucos, os perversos e os tiranos imperam e, no papel de Desert Rangers, os jogadores terão que escolher que tipo de pessoa aspiram ser. Acima de tudo, este é um jogo de escolhas e possibilidades, em que podes tentar ser justo, bondoso e prestável, ou embarcar por um caminho completamente oposto.
Um RPG táctico desafiante, mas também frustrante
Desprovidos de recursos e numa situação extremamente delicada, os Desert Rangers abandonam o deserto do Arizona para viajar para as montanhas geladas do Colorado a convite do Patriarca do Estado. É nesta zona que o novo RPG da inXile Entertainment decorre ao longo de dezenas de horas. Wasteland 3 é como aqueles livros em que as páginas se desdobram, revelando mais profundidade e possibilidades regularmente. No início passas por controlar um grupo de duas personagens, mas muito rapidamente o grupo aumenta para seis. As duas personagens iniciais são criadas por ti, tanto no aspecto visual como na distribuição de pontos nos atributos e habilidades. Este é um jogo com personalização complexa, em que cada parâmetro influencia como se vai comportar a personagem em combate ou em momentos narrativos chave. Não há nenhum parâmetro que seja irrelevante, até mesmo a reparação de tostadeiras prova ser útil.
"Wasteland 3 é como aqueles livros em que as páginas se desdobram, revelando mais profundidade e possibilidades regularmente"
Para além da gestão do grupo, terás que ajudar a construir a nova base dos Rangers. A base precisa de todo o tipo de pessoas, desde um médico a um cozinheiro para alimentar o pessoal. O médico parece-me de todos o mais essencial visto que Wasteland 3 consegue ser desafiante mesmo na dificuldade normal, se bem que algumas das regras me pareçam contraditórias. Por exemplo, podes reviver companheiros de equipa durante os combates desde que chegues à sua beira dentro dos turnos indicados, mas se o combate terminar sem reviveres o teu companheiro, só vais conseguir curá-lo de duas formas: usando uma injecção específica (Nitro Spike) ou regressando a um médico e pedir que cure o teu grupo. É estranho que possas reviver companheiros durante os combates a custo zero, mas que o mesmo não aconteça fora destes.
Os combates envolvem bastante estratégia e gestão, afinal, este é um RPG táctico por turnos. Não sou um perito no género nem um novato, mas a curva de aprendizagem é um pouco íngreme. Recursos como itens de cura e até mesmo a munição podem tornar-se escassos caso não tenhas cuidado. É necessário ter uma equipa equilibrada, em que cada personagem desempenha um papel específico. Foram várias vezes em que encalhei e precisei de recarregar um ficheiro de gravação para conseguir sair vitorioso de um combate. Estes momentos puxam por ti e pela tua capacidade de adaptação e, se gostas de desafios, vais sentir-te realizado.
"É necessário ter uma equipa equilibrada, em que cada personagem desempenha um papel específico."
Cada personagem recebe a cada turno pontos para gastar em acções. Com estes pontos podes deslocar-te no cenário, atacar os adversários, recarregar as armas de fogo, e optar por decisões defensivas como ficar em posição de defesa ou guardar os pontos para o próximo turno. No meio disto, há muitas probabilidades envolvidas. Sempre que vais atacar o adversário, não existe 100% probabilidade de acertar. Mesmo que estejas à sua beira com uma arma de contacto físico, ainda existe uma pequena chance do ataque não acertar. Estes momentos são frustrantes, principalmente se o teu adversário está mesmo à beira da derrota e só precisas de lhe acertar uma vez para o eliminares. Como os inimigos são quase sempre numerosos em Wasteland 3, eliminar adversários o mais rápido possível torna-se crucial para sair dos combates sem que as tuas personagens morram ou percam muita vida.
Mas há outro tipo de momentos frustrantes em Wasteland 3. Os loadings são constantes e demorados (surgem sempre que entras ou sais de um edifício, ou trocas de área), pelo que recarregar um ficheiro de gravação para recomeçar um confronto acaba por tornar-se desagradável simplesmente pelo tempo de espera. Nenhuma das áreas do jogo é grande o suficiente para justificar loadings tão demorados. Existem jogos em mundo aberto com loadings menores e menos frequentes.
Versão PS4 com problemas
Wasteland 3 tem tanto de brilhante como confuso. As habilidades das personagens, juntamente com os Quirks (são peculiaridades que dão vantagens e desvantagens a uma personagem) permitem que jogues exactamente como tu queres. As possibilidades estratégicas são mais do que muitas. Os combates envolvem risco, capacidade de previsão e conhecimento amplo das mecânicas. A escrita que sustenta este mundo pós-apocalíptico é perfeita. Os diálogos das muitas personagens que encontramos nunca são aborrecidos, estão cheios de sátira e de pequenas curiosidades que vão completando o nosso conhecimento do lore. Mas depois há coisas questionáveis como ausência de viagens rápidas. Eventualmente chegas a um ponto em que podes percorrer o estado de Colorado no teu veículo armado e explorar novos locais, mas isto envolve tantos loadings e deslocações repetidas que ultimamente a longevidade de Wasteland 3 é inflacionada por isto.
"Há coisas questionáveis como ausência de viagens rápidas"
Fora isto, encontramos vários problemas de natureza técnica da PlayStation 4, a versão testada e fornecida pela editora. Mais do que uma vez encontramos erros que forçaram a aplicação encerrar, interrompendo combates e causando a perda de progresso. Também encontramos outros erros como personagens cujas texturas e modelo não apareciam, e perda total do som do jogo (depois de reiniciarmos a aplicação, o som voltou a funcionar). No geral, o jogo corre de uma forma instável, com animações horríveis e texturas básicas. Tecnicamente, é um jogo que deixa bastante a desejar sem razão aparente (a não ser falta de optimização, é claro). Visualmente também não impressiona, pelo contrário, mesmo tendo jogado na PlayStation 4 Pro. Sabemos que este é um projecto que nasceu via crowdfunding - e por norma os recursos de produção são mais limitados - mas a InXile é um estúdio que já leva muitos anos de experiência e tinha o dever de apresentar um produto mais polido, já para não falar que o preço de Wasteland 3 o coloca a competir directamente com jogos AAA.
Uma verdadeira experiência pós-apocalíptica
Se há coisa em que Wasteland 3 acerta, é na experiência pós-apocalíptica que oferece. Vais sentir de várias formas a hostilidade, crueldade e impressibilidade deste mundo. Não fossem os vários problemas de origem técnica, algumas decisões de design que causam frustração, e uma interface e controlos confusos nas consolas, seria um RPG excelente. Ainda assim, há muito para se gostar em Wasteland 3 se procuras uma experiência desafiante, com profundidade estratégica e com escolhas morais que realmente têm impacto no desenrolar da narrativa.
Prós: | Contras: |
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