Wonder Boy: Asha in Monster World - Review - Clássico da Mega Drive revitalizado
O remake que os ocidentais merecem.
Há uma opção no remake de Wonder Boy The Dragon's Trap, que permite transitar como num estalar de dedos entre os gráficos e música retro e o grafismo moderno, com banda sonora refeita. Neste remake já com quatro anos, joguei os níveis quase sempre com o grafismo produzido pelos franceses da Lizardcube, mas não raras vezes, transitei, a meio e em fases mais descontraídas e com menos acção, para o formato retro, a fim de descobrir as nuances e perceber até que ponto a direcção artística moderna respeitava a matriz do original. Este remake deixou-me muito boas sensações. Essa foi uma delas, por poder desfrutar de uma máquina do tempo tão eficaz. Exceptuando Halo, não conheço muitos mais jogos, em formato remake, que em tempos recentes tenham apresentado esta funcionalidade.
Ainda pensei que pudesse ser implementada no remake de Wonder Boy: Asha in Monster World, recentemente disponível para a Switch, PlayStation 4 e para o Steam, mas o Artdink, o estúdio japonês responsável pela remasterização do clássico da Mega Drive, criado em 1994 pela Westone e editado pela Sega, não o fez. É pena, tanto Dragon's Trap como Asha in Monster World partilham tempos quase semelhantes e há elementos mecânicos relativamente próximos. No entanto, não deixa de se assinalar a inclusão do original Monster World IV, que permaneceu até hoje como um exclusivo para o Japão, apesar da recente incursão pela Virtual Console da Wii, ainda que na versão japonesa.
Assim também se comprova o magnífico trabalho da Westone, mesmo que o reconhecimento ocidental chegue com um atraso de quase 30 anos. Os fãs desta série, também conhecida por Monster World, no Japão, ficarão por certo agradecidos pela sua inclusão (na PlayStation 4, em formato digital), não obstante terem de sair de um jogo para desfrutarem do outro. Wonder Boy é desde final dos anos oitenta e depois até meados dos noventa, uma série especial, com os seus elementos bem destacados mas que divergia, na forma como o explorávamos horizontalmente, de muitos jogos de plataformas, acção e role play da época. Pode-se dizer que chega tarde, mas este Remake da Artdink trouxe-me à memória muitos desses momentos passados, bem como o mais recente Dragon's Trap.
Os dois lados da mesma moeda
Há moedas e muitas em Wonder Boy. São indispensáveis à aquisição de melhor e mais valioso equipamento, sempre que exploramos uma nova secção do mundo e somos levados a combater criaturas mais poderosas, com melhores defesas e contra-ataques. Mas as moedas são também o fio da meada de um jogo de forte cariz role play, sobre o qual recaem algumas influências do primeiro e segundo Legend of Zelda. Olhar para Asha in Monster World como um jogo puro de plataformas é um logro. Talvez seja uma perspectiva, um lado deste 2D que viu-se reconfigurado num mundo tridimensional, de personagens que parecem sair de um animé e cenários grandiosos. É um resultado multicolorido, de grandes contrastes com o original, retomando uma fórmula e mecânicas semelhantes.
O que se pode falar em primeira linha, para além do controlo da personagem feminina como estatuto de culto, com golpes bem definidos, saltos e a possibilidade de se lançar num passo acelerado, é de uma grande amplitude de exploração vertical. Muitos jogos 2D subiam à perspectiva isométrica e permitiam a exploração de áreas com alguma profundidade. Aqui o território é apresentado em toda a sua extensão como num caminho único e horizontal da vinheta. Nalguns segmentos é possível transitar de plano, como acontece quando chegamos aos castelos e às torres. Essa liberdade é essencial à exploração e descoberta de saídas alternativas, por onde podem existir arcas com tesouros, entre outros bónus. Quase sempre encontramos surpresas neste risco pela aventura.
Pelo meio conversamos com os npc's, melhoramos o equipamento nos ferreiros, onde podemos adquirir um escudo melhorado ou uma espada capaz de ferir ainda mais os inimigos. Às moedas acrescem uma espécie de gotas de água, ou lágrimas, que reunidas numa dezena formam um coração azul adicional, melhorando a resistência da personagem nas masmorras pejadas de poderosos guardiões. Restam poções mágicas e itens de saúde guardados numa espécie de saco que podemos recorrer a qualquer instante. Este Monster World é realmente surpreendente. Combina perfeitamente plataformas com acção e elementos de role play. Há um permanente esquema do tipo Metroidvania, com muitos avanços e recuos, sob o signo da recompensa. Não é um jogo difícil, longe disso, mas a dificuldade é a típica dos anos noventa, com aqueles solavancos pelo meio.
Um "Kirby" azul e com patas como fiel escudeiro
A primeira vez que experimentei a criatura acompanhante Pepelogoo, lembrei-me da bolha rosa da Nintendo. Há algumas similitudes na forma como esta nossa criatura de estimação voga no ar e nos ajuda em momentos sensíveis da aventura. De várias formas. Uma delas é Asha servir-se deste Pepe como uma rampa de lançamento para um salto duplo e outra como um balão com o qual navegamos após o salto até uma plataforma distante. Também pode ser usado como escudo protector, para apagar chamas, ou ser usado como um degrau. É de uma versatilidade incrível, posta à prova dentro das engenhosas secções dos níveis. Mas fora dos espaços onde espreita o perigo também é muito útil para chegar às tão imprescindíveis arcas do tesouro escondidas.
Não podemos descurar, de resto, as habilidades de Asha. Há na dualidade escudo/espada, ou defesa/ataque, uma combinação que nos traz uma memória vaga de Demon's Souls. O escudo rebate os golpes e protege, mas também faz escorregar pela força do choque. A isso acresce uma multiplicidade de ataques e combinações, relativamente simples de executar. A aprendizagem é quase imediata, e assim que penetramos na imensidão dos mundos, somos postos à prova dentro de secções mais duras e puzzles mais exigentes. Com as "boss fights" abre-se um caminho relativamente linear. O único desapontamento que é mais manifesto nesta caminhada é a supressão de uma maior engenharia nas manobras dos adversários. Enquanto que um Zelda é em todo superior na abordagem dos puzzles, exploração e combates, aqui só mesmo a liberdade de movimentos associada a uma grande dimensão do mundo/área nos leva a perder, porque os objectivos são muito directos, quase lineares e a dimensão do combate é relativamente moderada quando comparada com "outros combates".
Uma importante alteração é a possibilidade de gravar o jogo a qualquer momento. Ao começo cuidei de um sistema de gravação automático na passagem de nível. Enganei-me e tive que voltar ao começo assim que perdi a primeira vida. Quanto à evolução gráfica e sonora, é toda ela bastante categórica, ao ponto de vermos fulgurar diante de nós quase um novo jogo, inteiramente diferente. Não temos a opção que nos deixa passar instantaneamente para um clássico, mas as diferenças estão lá. No mais é um remake altamente cuidado, e melhorado em quase tudo. Só não repara algumas limitações da fórmula e do próprio mundo, de algumas partes menos rebuscadas e mais repetitivas. É contudo um magnífico trabalho de revitalização de um clássico da Westone. Num mano a mano com Dragon's Trap, ainda vou pelo remake de Wonder Boy III. É só um bocadinho mais engenhoso, mas em pouco fica a dever a Asha in Monster World.
Prós: | Contras: |
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