Wonderbook: Diggs Nightcrawler - Análise
“Yo mano, podes tirar o cavalinho da chuva.”
Digg´s Nightcrawler é a segunda história que chega para o Wonderbook, o periférico tipo livro que surgiu em Novembro do ano passado para a PlayStation 3. Se bem se lembram, o Livro de Feitiços foi o título que acompanhou o livro no lançamento, e já na altura referi que se a Sony quisesse que o periférico fosse levado a sério, teria rapidamente que disponibilizar mais contos, de preferência explorando mais a interatividade com o livro, e menos a jogabilidade com o Move.
Continuamos a precisar do Move e do PlayStation Eye para jogar Digg's, mas quase toda a interatividade no jogo é livre do comando de movimento, requerendo coisas como acenar, abanar, rodar ou até bater no livro. Acredito que esse é o caminho certo para o Wonderbook, é o que o distingue verdadeiramente em termos de interação, tornando a experiência verdadeiramente diferente e muito mais focada na realidade aumentada.
Como em todos os jogos com que utilizam o Move com o Playstation Eye, tive que passar pelo penoso processo de calibração e posicionamento da câmara, sem referir que tive que abrir a janela para entrar luz natural, colocando-me à mercê dos olhares vizinhos. Isto é algo que se espera ver resolvido quando chegar a PlayStation 4, cujas capacidades do novo Eye prometem uma interligação mais completa com o Wonderbook. Depois de tudo pronto o jogo apresenta-se de forma muito interessante, num estilo que faz lembrar os primórdios do cinema nos anos 30, com aquelas frases tipo cartaz, de caligrafia sumptuosa, mas aliada a uma estética animada que se assemelha aos desenhos dos livros de contos tradicionais. Uma mistura peculiar, capaz de apelar tanto à nostalgia dos pais, como à imaginação dos filhos.
A história começa com Humpty Dumpty (esse mesmo) a anunciar o seu próprio assassinato. Isto poderá indiciar um tema mais maduro e impróprio para crianças, mas a verdade é que nestes mundos não existe morte, e tudo o que precisamos fazer é procurar os pedaços da casca de Humpty separados pelos três capítulos da história, para o voltar a “montar” e descobrir o culpado.
Para isso recorremos à ajuda do detetive privado conhecido por Digg's, ou Diggster, ou Silvinho, ou Mistério da Silva, ou simplesmente Zé, varia conforme o nível de intimidade que partilhamos com a minhoca. Esta estrutura é inteligente, não existe um, mas sim dois protagonistas, Digg's e nós, o detetive minhoca e o “miúdo”. Aproxima mais o jogo de um conto, não controlamos Digg's, o nosso trabalho está em facilitar a sua tarefa interagindo com o livro. Não somos os únicos a procurar pela casca de Humpty, como em qualquer história que envolva um detetive privado, existem grupos de polícias com um intelecto inferior em busca do mesmo objetivo, neste caso, os três porquinhos. Library City é populada por variadas personagens conhecidas da literatura, os três polícias são apenas um exemplo que se junta a outros como a Vó Gansa, o Frankenstein, entre outros.
Os problemas colocados ao jogador são permanentemente narrados por Digg's, tornando o jogo num navegar pela história, sem nunca interromper a progressão. As mecânicas como rodar, inverter ou inclinar o livro funcionam bem se tivermos o posicionamento e iluminação adequadas, já abanar o livro da esquerda para a direita consegue ser penoso, e ainda me conseguiu encravar o jogo duas vezes no processo. Para lá desta simples interação, existem segmentos estilo labirinto, e outros em que temos que controlar a posição e velocidade de rotação do livro.
Enquanto procuramos pelos pedaços da casca de Humpty, rapidamente percebemos que algo de errado se passa com as histórias que nos habituamos a adorar, por exemplo, o Robin dos Bosques rouba aos pobres para dar aos ricos. Tenta inclusivamente nos assaltar a certa altura: “Dá cá a massa ou faço-te a folha” diz ele. Isto abriu espaço para alguma liberdade no desenrolar dos acontecimentos, e para uma ligeira mudança de personalidade em algumas das personagens, tornando os eventos um pouco mais imprevisíveis.
"…não existe um, mas sim dois protagonistas, Digg's e nós, o detetive minhoca e o miúdo."
No geral está bem escrito, mas é algo curto. É certo que estes contos dependem muito mais da qualidade da experiência e do seu valor de repetição, do que do tamanho da história, mas mesmo assim, pareceu-me pequeno demais. Uma sessão de três ou quatro horas chega para terminar a história, e depois existem pequenos incentivos para repetir os níveis, como os achievements ou o desafio de identificar fotografias nos cenários, tendo que colocar o livro na posição certa, de forma a conseguir a mesma imagem das várias fotos.
Está bem interpretado no nosso Português, e se por exemplo a voz de Digg's é competente, a do Robin dos bosques é hilariante, não sei quem foi o ator que interpretou Robin, mas “mano”, bem trabalhado. A acompanhar estão sempre referências a histórias e personagens que muitos irão reconhecer, não vou estragar estes pequenos momentos, apenas vou partilhar um, provavelmente de paranóia minha, em que um dos macacos fez uma referência a lembrar o líder da oposição António José Seguro, perguntando, “qual é a pressa?”.
Foi uma experiência curta mas interessante, acheio-o mais adequado ao livro, mais interativo, com uma história de princípio, meio e fim, e não apenas um show off tecnológico do periférico. Ainda não é a tal reinvenção dos contos de histórias que a Sony falava, mas acredito que ainda exista muito espaço para surpreender, é possível ir muito mais longe para conquistar o mercado de jogos familiares para onde o Wonderbook claramene aponta.
Está classificado para maiores de 7, não é designado para adultos, mas tem um alcançe muito superior ao Livro de Feitiços. O seu tom cómico, aliado a personagens reconhecíveis e carregadas de personalidade fazem dele uma excelente opção também para adultos que queiram jogar com os miúdos lá em casa. O preço é adequado à quantidade de conteúdo que vem com o jogo, e vale bem considerando a personalidade da minhoca. Estou convencido que voltaremos a ver Digg's.