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Fez - Análise

Fez o jogo como quis.

Fez é muito mais do que podem imaginar. Envolvido num misto de respeito e sentido de maravilhoso, torna-se assustador quando tocarem o seu âmago. Confrontar os puzzles e reais desafios de Fez significa entrar por um nível de design fabuloso, para uma experiência inesquecível e relaxante, mas isto é só o começo. O que este jogo oferece pode tornar-se num pesadelo difícil de superar. Sair dos trilhos seguros e da zona de conforto, que é Fez reduzido à exploração mais simples, implica um encontro com um incontrolável labirinto de mundos tradicionais e seguros, repleto de sinais, imagens, símbolos e toda uma linguagem críptica que urge decifrar, no qual nos perdemos com facilidade.

Na sua forma mais simples, Fez é um jogo de plataformas em duas dimensões, bastante interativo e que presta tributo a uma imensidão de jogos que encontram espaço num qualquer panteão da indústria, para não falar das referências ligadas ao cinema e animação. Mas para lá de proporcionar momentos que naturalmente iremos reconhecer em determinadas fases da aventura, Fez distingue-se de tudo o que até hoje foi feito e, no seu core, exibe uma personalidade ao nível de um Space Giraffe de Minter. É um daqueles jogos raros e únicos que nos lança um verdadeiro desafio. Um jogo pretensioso, dotado das suas regras e imposições. Se querem acabar Fez têm de aceitar as suas condições. Depois de muitos encontros e desencontros, começará a fazer-se alguma luz e sentido de orientação, após o choque inicial provocado por um caos crescente. Exigirá paciência e respeito para lá chegarem, ainda que o desafio fique maioritariamente por resolver.

Talvez porque Phil Fish não quer que o completem e o que pretende é ver-vos desorientados e acabam barafustando com ele. Phil é o homem forte da Polytron Corporation e foi ele quem assumiu a fatia maior de desenvolvimento do jogo. Do design às mecânicas dominantes, tudo é fruto de um trabalho de mais de 5 anos. Phil despendeu incontáveis horas a aperfeiçoar o seu jogo e antes de chegar a Fez divergiu fatalmente com Shawn McGrath a respeito de um jogo que nunca chegou a contar com uma demonstração protótipo. Fiel às suas ideias, Phil avançou para Fez e criou este universo em forma de cubos pixelizados giratórios, assegurando uma perspetiva 2D de ilhas e porções de terra flutuantes, concebidas em 3D. Poder rodar 90 graus é só um dos twists que o jogo oferece, porque depois de aprenderem o básico, terão mais, muito mais.

O ambiente que irão encontrar em Fez é propício ao relaxe e à exploração descontraída. Há um tom bucólico e melancólico que resulta daqueles mundos coloridos que começam por trazer à memória as plataformas de Super Mario e as montanhas verdejantes de Green hill. A conversa é escassa, resumida a uma linguagem própria e tem lugar no princípio do jogo. Gomez, a pequena personagem saltitante é um sprite que habita pacificamente com outros seres iguais numa pacata vila. Tudo está em paz até que um dia um estranho acontecimento leva a que um cubo dourado se desintegre em múltiplos fragmentos. Uma estranha personagem que se resume ao pequeno chapéu de Gomez e funciona como uma Navi de Link em Legend of Zelda e o vai acompanhar para todo o lado, avivando pistas e novas formas de interação com objetos, vai contar-lhe o seguinte. Que os cubos estão espalhados por inúmeros territórios e que será fora do seu território que terá de os encontrar de modo a, presumivelmente, restabelecer a ordem.

A "explosão" que ocorreu, implicou grandes transformações no mundo de Gomez. Esta personagem é uma gota num oceano de ligações, mas também de buracos negros, portais, salas, códigos e outros mistérios intrigantes. Quando a transformação acontece, Gomez descobre que pode rodar a perspetiva bidimensional em 90 graus, para a esquerda ou direita, já que a composição dos cenários é tridimensional e cada vez que descobrem um novo território ficam com uma ideia do aspeto 3D.

Fez - 6 minutos gameplay.

Cada movimento provoca um diferente alinhamento do cenário e, por via disso, diferentes possibilidades de exploração. Tal como acontece num jogo de plataformas em 2 dimensões, a primeira coisa que vão fazer é subir ou descer por onde puderem. Rodando a perspetiva encontram novos percursos e começam por descobrir os primeiros mini-cubos. Estes mini-cubos quando obtidos num determinado número, geram um cubo maior. Terão de recuperar 32 cubos dourados para chegarem ao fim do jogo. À medida que aumentam o número de cubos, abrem portas que até então estavam fechadas.

"Cada movimento provoca um diferente alinhamento do cenário e, por via disso, diferentes possibilidades de exploração."

Este constante "twist and turn" é uma via bastante eficiente e alternativa de manipular objetos. Por exemplo, numa perspetiva um ponto que pretendemos alcançar está relativamente distante. Podemos rodar a perspetiva duas ou três vezes, para assim concretizarmos um novo alinhamento de plataformas, revelar zonas secretas, identificar portas anteriormente na penumbra, cubos escondidos e artefactos. A perspetiva muda, mas a dimensão é a mesma. Os cubos que rodamos são autênticas caixinhas de surpresas e o convite à rotação é constante e agradável. Não se pense, porém, que ficamos reduzidos a isto. Mais à frente esta mecânica terá de ser articulada com manipulação de puxadores, botões e outros elementos passíveis de interação.

É dentro dessa mais complexa articulação que vamos descobrir que tudo é muito mais vasto do que parece, menos procedimental. Há sinais, dicas e apontamentos que chegam sob as mais variadas formas. Pode ser uma inscrição na parede com desenhos de formas das peças de Tetris. Um código de realidade aumentada. Uma raposa que salta sobre um cão diante de um monólito. O que quer isto dizer? Ter uma caneta e papel por perto nunca foi tão importante como agora para anotar estas descobertas e pensar em puzzles maiores, subliminares.