Xenoblade Chronicles
O regresso de Takahashi aos épicos.
Este jogo tem todos os motivos para se tornar no jrpg da geração. Xenoblade faz quase tudo o que nenhum outro jrpg desta geração foi capaz de entregar de uma forma tão interligada e densa; apresenta uma história coesa e forte arrancada a partir de personagens diferentes que se ligam entre si num mundo gigantesco, tão fascinante como belo. E se a isso associarmos uma demanda enorme, envolta em "plot twists" que derreterão até o maior coração de ferro e uma jogabilidade refrescante e inovadora, temos uma caldeirada de sucesso.
Os primeiros momentos do jogo explicam a origem do universo de Xenoblade. Começamos por acompanhar um conflito intemporal. O mundo é constituído por mar, vento e dois deuses gigantescos que se digladiam ferozmente. Bionis e Mechonis, assim se chamam as duas colossais criaturas. Uma delas cede a dado momento, perdendo um braço enquanto que a outra é imediatamente atingida por um golpe lateral fundo na cintura. Acabam por se entregar ao cansaço, abdicam de lutar, petrificando o instante em que se atingiram mutuamente. Dos seus corpos unidos por uma espada e através do tempo formam-se condições de vida, como se cada criatura fosse um planeta, composta por uma vastidão impressionante de regiões. O homem é quase um ser microscópico que nela vagueia.
Takahashi desenvolveu para este jogo a ideia de um mundo vasto, onde a descoberta é levada a sério. A execução dessa ideia representa uma novidade nos seus jogos. E esta componente de profundidade e vastidão constitui um dos maiores atrativos do jogo, por força da riqueza que nos é mostrada com zonas tão diversas e fascinantes até com cursos de água que podem ser percorridos a nado. Por cada área que irá percorrer o jogador descobre que está num mundo expansivo, rico em recursos, abundante em fauna e flora, podendo ir até onde lhe apetecer. O mapa de cada secção revela os nomes das principais localizações à medida que embarcam na aventura da descoberta, entre zonas superiores que propiciam momentos de uma beleza tocante. Irão descobrir isso quando chegarem a Bioni's Leg, a primeira grande abertura do jogo cuja dimensão é simplesmente avassaladora; uma pradaria ladeada por montanhas que podem ser escaladas através de percursos que vos levam até impressionantes miradouros, numa profusão de cores notável. Por entre as nuvens e sob um azul puro e refrescante conseguem avistar Mechonis do outro lado, com os seus pontos vermelhos no rosto, como luzes de sinalização à noite, distantes e algo apagadas, num sinal que revela de forma sublime a magnitude do mundo.
Mas isso é só uma pequena porção da área total de jogo, já que cada segmento corresponde a um ponto específico de Bionis. Percorrendo a criatura irão descobrir que há mais povos e civilizações com os seus hábitos e rotinas de vida. Tudo seria perfeito se os povos que habitam Bionis não estivessem em guerra contra umas criaturas robóticas oriundas de Mechonis, o outro deus petrificado. Este inimigo misterioso detém uma capacidade bélica avassaladora, lançando o caos sobre os habitantes de Bionis que vão resistindo às investidas como podem.
Num desses combates, Dunban, uma das personagens que irá interagir com os elementos da equipa, dará uso aos poderes de uma espada dotada de poderes especiais. A Monado é o único instrumento que equilibra os combates, causando danos severos nas armaduras dos Mechonis, ao contrário das outras armas que enfrentam a oposição das proteções metálicas destas criaturas misteriosas.
O ataque a Bionis, mais precisamente à Colony 9 deixou marcas. Um grupo de resistentes une-se para o propósito de investigar o estranho poder da Monado, numa tentativa de desenvolver mais armas que permitiriam atacar com outra desenvoltura o inimigo. Shulk é o protagonista e sobre ele recai o pesado fardo da missão. Acompanhado inicialmente por Reyn, um antigo amigo e Fiora, a irmã mais nova de Dunban, desde cedo que se fará uma ligação constante às personagens e seus motivos na grande "quest". Como já é hábito nas obras de Takahashi a afeição às personagens é imediata e chegarão bem cedo os momentos que levam a perdas e alterações na equipa.
Esse relacionamento será maior à medida que percorrerem Bionis. Não será útil revelar mais do que isto para não estragar o prazer de descobrir tudo neste jogo, apenas sublinho que o argumento tem como ponto de partida uma demanda movida por um sentimento de vingança. Algo que será igual a muitos outros jrpg's, mas aqui há certas especificidades que contribuem para gerar uma permanente atenção. O trabalho de Takahashi é indiscutível para quem já acompanhou as suas obras, logo nas primeiras horas de jogo, quando ocorre um "plot twist". Depois há toda uma curiosidade despertada pelas criaturas oriundas de Mechonis, demasiado frias, despidas de qualquer sentimento e isso prende o jogador, leva-o a deixar-se seguir pela narrativa à espera de mais surpresas e revelações.
Alguns momentos e fases do guião não escapam a típicos "clichés" do género, mas de um modo geral as diferentes fases que estruturam o argumento prestam-se mais depressa a lançar questões e curiosidades sobre as personagens principais e sobre o inimigo, sendo notório um cuidado por manter um tratamento mais adulto, dando corpo a algum sentimento sem cair no exagero. De resto não estamos perante um jogo que faça das "cut-scenes" uma das suas principais bandeiras. Claro que dentro da "main quest" e uma vez percorridos certos pontos há segmentos tipicamente cinematográficos, como seja antes e depois das "boss fights". Apesar de estarmos perante um jogo que acusa a passagem do tempo, ainda assim a caracterização das personagens e ambientes está bem conseguida com situações que prendem literalmente o jogador, a começar por um dos "bosses" que é apresentado no decurso das cinco primeiras horas.
Algo especialmente notável neste jogo é a ausência de linearidade. A demanda principal e as side quests estão de tal modo integradas nos mundos abertos à exploração, às preocupações das pessoas e aos povos que neles habitam que o jogador tem uma margem de liberdade e escolha. Apesar de existir uma seta que indica a distancia que separa Shulk do próximo objetivo, isso é um mero indicador pois a palavra de ordem é exploração. Takahashi foi engenhoso ao construir este mundo, privilegiando o jogador dando-lhe pontos de experiência de cada vez que descobre novas áreas, colecionando objetos raros e típicos de cada secção e ganhando afinidade com as populações ao cumprir os objetivos que lhe são pedidos. É uma perdição e uma recompensa para quem se entrega à exploração.